Nas Entrelinhas: Luiz Carlos Azedo
DEU NO CORREIO BRAZILIENSE
Os americanos estão inseguros e querem mudanças. Obama conseguiu encarnar esse sentimento, por mais que McCain, no desespero, adotasse a estratégia negativa do medo para contê-lo
Escrevo no lusco-fusco entre a votação e a apuração das eleições norte-americanas. Depois de uma semana eletrizante, em que o candidato conservador John McCain (Partido Republicano) conseguiu criar um clima de virada numa eleição considerada perdida, tudo indica que o renovador Barak Obama (Partido Democrata) levou a melhor. Se hoje amanhecemos sem saber o resultado, a culpa é do sistema eleitoral norte-americano. O vencedor das eleições para a Presidência dos Estados Unidos pode ter menos votos nas urnas, como aconteceu na eleição de George Bush contra Al Gore, por causa da composição do colégio eleitoral que o escolhe. Os delegados estaduais são eleitos por um sistema no qual cada estado elege delegados em número igual à soma de seus deputados e senadores. O partido que vence as eleições num estado indica a totalidade dos seus delegados, não importa a votação de quem perdeu. Porém, é assim que a democracia americana funciona. E é nela que o mundo inteiro, neste momento, deposita as esperanças de um futuro melhor.
Heróis
A disputa entre Obama e McCain foi um embate entre dois mitos políticos. McCain era o herói americano da guerra do Vietnã, que por oito anos ficou confinado e se recusou a fazer concessões aos comunistas. Voltou para casa com seqüelas que até hoje dificultam seus movimentos e muitas críticas ao governo de seu país. Assim, construiu uma carreira de franco-atirador entre os republicanos. Foi candidato contra a opinião do establishment. Sua imagem de reformador, porém, foi “desconstruída” durante a campanha pela gradativa aproximação ao presidente Bush e pela escolha da vice Sarah Pallin, a governadora “linha-dura” do Alaska.
Obama é o jovem político mulato. Estudou nas melhores universidades e fez uma carreira parlamentar meteórica a partir de Chicago. Filho de mãe norte-americana e pai queniano, não tem antepassados ex-escravos na América e chutou o pau da barraca da segregação com um discurso pós-racial. Tornou-se um mito durante a campanha, superando todos os obstáculos, com o discurso de resgate do “sonho americano”. Como um herói noir, Obama é o homem comum capaz de coisas incomuns.
Ambos, de uma maneira ou outra, são protagonistas da democracia americana. Provaram do isolamento, destruidor das capacidades políticas, e do desenraizamento, destruidor da capacidade de relacionamento social. McCain viveu a experiência do isolamento na guerra; Obama, o desenraizamento durante a infância no Havaí e na Indonésia em companhia da mãe. Isolamento e desenraizamento são formas de opressão. Hannah Arendt, filósofa judia-alemã, aponta-os como a origem do totalitarismo. Ela parte do princípio de que o homem se distingue no reino animal não apenas pela vida biológica e o trabalho, mas pela sua ação com os demais. O agir e o pensar politicamente é que dão aos homens a plena condição humana.
Mudanças
A idéia de que uma vida melhor é possível está no eixo do discurso de Obama. É parte de sua experiência pessoal. Por isso, seu exemplo fascina o mundo. Sua candidatura resgata o melhor do “americanismo”, a convicção de que os Estados Unidos são um nação onde qualquer cidadão, com sacrifício, trabalho e talento pode se tornar o homem mais importante e poderoso do mundo. Essa é a liga mais forte da democracia com o capitalismo.
A força de Obama resultou da mobilização de milhões de pessoas, jovens e idosos, negros, hispânicos, brancos, árabes e judeus. Gente que alargou os horizontes da democracia americana, promoveu uma mobilização eleitoral inédita. Há uma crise econômica com epicentro em Wall Street que se alastra pelo mundo. Os americanos estão inseguros e querem mudanças. Obama conseguiu encarnar esse sentimento, por mais que McCain, no desespero, adotasse a estratégia negativa do medo para contê-lo.
Para nós, aqui no Brasil, as conseqüências da eleição de Obama poderão ser mais pressão pela preservação da Amazônia, por causa do ativismo ambiental dos democratas; e menos abertura para os produtos brasileiros, incluindo o etanol, devido ao protecionismo dos sindicatos norte-americanos. Em contrapartida, haverá mais diálogo dos EUA com seus desafetos pelo mundo. Obama deverá adotar também uma postura mais flexível em relação aos imigrantes, e apostar num novo modelo energético para os EUA, menos dependente do petróleo, o que pode resultar num novo ciclo de inovações tecnológicas e expansão econômica em todo o mundo.
DEU NO CORREIO BRAZILIENSE
Os americanos estão inseguros e querem mudanças. Obama conseguiu encarnar esse sentimento, por mais que McCain, no desespero, adotasse a estratégia negativa do medo para contê-lo
Escrevo no lusco-fusco entre a votação e a apuração das eleições norte-americanas. Depois de uma semana eletrizante, em que o candidato conservador John McCain (Partido Republicano) conseguiu criar um clima de virada numa eleição considerada perdida, tudo indica que o renovador Barak Obama (Partido Democrata) levou a melhor. Se hoje amanhecemos sem saber o resultado, a culpa é do sistema eleitoral norte-americano. O vencedor das eleições para a Presidência dos Estados Unidos pode ter menos votos nas urnas, como aconteceu na eleição de George Bush contra Al Gore, por causa da composição do colégio eleitoral que o escolhe. Os delegados estaduais são eleitos por um sistema no qual cada estado elege delegados em número igual à soma de seus deputados e senadores. O partido que vence as eleições num estado indica a totalidade dos seus delegados, não importa a votação de quem perdeu. Porém, é assim que a democracia americana funciona. E é nela que o mundo inteiro, neste momento, deposita as esperanças de um futuro melhor.
Heróis
A disputa entre Obama e McCain foi um embate entre dois mitos políticos. McCain era o herói americano da guerra do Vietnã, que por oito anos ficou confinado e se recusou a fazer concessões aos comunistas. Voltou para casa com seqüelas que até hoje dificultam seus movimentos e muitas críticas ao governo de seu país. Assim, construiu uma carreira de franco-atirador entre os republicanos. Foi candidato contra a opinião do establishment. Sua imagem de reformador, porém, foi “desconstruída” durante a campanha pela gradativa aproximação ao presidente Bush e pela escolha da vice Sarah Pallin, a governadora “linha-dura” do Alaska.
Obama é o jovem político mulato. Estudou nas melhores universidades e fez uma carreira parlamentar meteórica a partir de Chicago. Filho de mãe norte-americana e pai queniano, não tem antepassados ex-escravos na América e chutou o pau da barraca da segregação com um discurso pós-racial. Tornou-se um mito durante a campanha, superando todos os obstáculos, com o discurso de resgate do “sonho americano”. Como um herói noir, Obama é o homem comum capaz de coisas incomuns.
Ambos, de uma maneira ou outra, são protagonistas da democracia americana. Provaram do isolamento, destruidor das capacidades políticas, e do desenraizamento, destruidor da capacidade de relacionamento social. McCain viveu a experiência do isolamento na guerra; Obama, o desenraizamento durante a infância no Havaí e na Indonésia em companhia da mãe. Isolamento e desenraizamento são formas de opressão. Hannah Arendt, filósofa judia-alemã, aponta-os como a origem do totalitarismo. Ela parte do princípio de que o homem se distingue no reino animal não apenas pela vida biológica e o trabalho, mas pela sua ação com os demais. O agir e o pensar politicamente é que dão aos homens a plena condição humana.
Mudanças
A idéia de que uma vida melhor é possível está no eixo do discurso de Obama. É parte de sua experiência pessoal. Por isso, seu exemplo fascina o mundo. Sua candidatura resgata o melhor do “americanismo”, a convicção de que os Estados Unidos são um nação onde qualquer cidadão, com sacrifício, trabalho e talento pode se tornar o homem mais importante e poderoso do mundo. Essa é a liga mais forte da democracia com o capitalismo.
A força de Obama resultou da mobilização de milhões de pessoas, jovens e idosos, negros, hispânicos, brancos, árabes e judeus. Gente que alargou os horizontes da democracia americana, promoveu uma mobilização eleitoral inédita. Há uma crise econômica com epicentro em Wall Street que se alastra pelo mundo. Os americanos estão inseguros e querem mudanças. Obama conseguiu encarnar esse sentimento, por mais que McCain, no desespero, adotasse a estratégia negativa do medo para contê-lo.
Para nós, aqui no Brasil, as conseqüências da eleição de Obama poderão ser mais pressão pela preservação da Amazônia, por causa do ativismo ambiental dos democratas; e menos abertura para os produtos brasileiros, incluindo o etanol, devido ao protecionismo dos sindicatos norte-americanos. Em contrapartida, haverá mais diálogo dos EUA com seus desafetos pelo mundo. Obama deverá adotar também uma postura mais flexível em relação aos imigrantes, e apostar num novo modelo energético para os EUA, menos dependente do petróleo, o que pode resultar num novo ciclo de inovações tecnológicas e expansão econômica em todo o mundo.
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