Luiz Carlos Mendonça de Barros
DEU NA FOLHA DE S. PAULO
Obama deve inverter a lógica e criar novos bancos ("good banks") só com capital público; os atuais seriam liquidados
NA SEMANA passada, fiz algumas reflexões sobre o pacote de medidas para estabilizar o sistema bancário americano. Minha crítica principal estava centrada na tentativa de isolar os ativos tóxicos, que estão destruindo lentamente o sistema bancário da maior economia do mundo, em um "bad bank". Esse corpo podre ficaria então como um verdadeiro zumbi até sua liquidação.
Com isso, a incerteza em relação ao valor dos ativos bons dos bancos atuais seria eliminada, restaurando sua rentabilidade e capacidade de intermediação, o que facilitaria a atração de capitais privados. Em pouco tempo, os mercados se normalizariam e a economia voltaria a crescer.
Os que acreditam nesse conto de fadas respaldam seu otimismo na experiência exitosa do governo sueco, há mais de dez anos. Esquecem que as condições atuais são diversas das que prevaleciam no país quando a solução do "bad bank" foi construída com sucesso. Cito as principais. Em primeiro lugar, os ativos tóxicos estão espalhados pelo sistema bancário mundial.
Esse fato não permite que a solução buscada para os bancos americanos seja agressiva em relação aos grandes bancos internacionais não-americanos. Nesse caso, a crise que já existe em outras economias seria agravada.
Em segundo lugar, a fixação de um preço justo para os ativos tóxicos que seriam colocados no "bad bank" é praticamente impossível de ser realizada no ambiente atual. Se o valor pago pelos ativos tóxicos for baixo, a marcação a mercado do restante dos créditos que remanescerão nos balanços dos bancos mostrará um volume de prejuízos muito maior do que os hoje contabilizados. Muitos bancos continuariam podres, arrastando o problema por anos a fio, no estilo japonês.
Por outro lado, se os preços para os ativos tóxicos forem fixados de forma a não inviabilizar os bancos, o contribuinte americano é quem arcará com os prejuízos. Mesmo nessa hipótese, a crise de confiança continuará, porque os "good banks", por contiunuarem a ter esses ativos nos seus livros, já nasceriam com falta de transparência de seus ativos, embora em menor dimensão.
Essa proposta fica ainda mais complexa na medida em que, no modelo revelado pelo secretário do Tesouro americano, o "bad bank" teria investidores privados para diminuir o esforço fiscal do governo. Segundo a apresentação da última terça-feira, os preços dos ativos tóxicos teriam que acomodar o interesse de lucro dos investidores privados, defender o contribuinte de prejuízos ainda maiores e não contaminar os ativos que ainda farão parte dos bancos americanos e europeus. Por isso, nas declarações do secretário americano, não existe nenhuma pista para a fixação desses valores.
Volto a insistir em que o governo Obama deve buscar outro caminho. Deve inverter a lógica e criar novos bancos -os "good banks"- inicialmente com capital público apenas. Eles assumiriam em um segundo momento os depósitos de seus clientes, a estrutura operacional e os ativos bons das instituições a serem liquidadas. Os bancos atuais -na realidade, a maioria deles já verdadeiros zumbis financeiros- seriam liquidados judicialmente, com prejuízos para acionistas e algumas classes de credores (excluindo depositantes, que continuariam garantidos). Nessa condição, não seria difícil atrair capital privado.
Essa é uma solução politicamente muito difícil, pois envolve aceitar que muitos no setor privado perderão, mas só assim um sistema bancário privado, sólido e rentável poderá renascer.
Luiz Carlos Mendonça de Barros , 66, engenheiro e economista, é economista-chefe da Quest Investimentos. Foi presidente do BNDES e ministro das Comunicações (governo Fernando Henrique Cardoso).
DEU NA FOLHA DE S. PAULO
Obama deve inverter a lógica e criar novos bancos ("good banks") só com capital público; os atuais seriam liquidados
NA SEMANA passada, fiz algumas reflexões sobre o pacote de medidas para estabilizar o sistema bancário americano. Minha crítica principal estava centrada na tentativa de isolar os ativos tóxicos, que estão destruindo lentamente o sistema bancário da maior economia do mundo, em um "bad bank". Esse corpo podre ficaria então como um verdadeiro zumbi até sua liquidação.
Com isso, a incerteza em relação ao valor dos ativos bons dos bancos atuais seria eliminada, restaurando sua rentabilidade e capacidade de intermediação, o que facilitaria a atração de capitais privados. Em pouco tempo, os mercados se normalizariam e a economia voltaria a crescer.
Os que acreditam nesse conto de fadas respaldam seu otimismo na experiência exitosa do governo sueco, há mais de dez anos. Esquecem que as condições atuais são diversas das que prevaleciam no país quando a solução do "bad bank" foi construída com sucesso. Cito as principais. Em primeiro lugar, os ativos tóxicos estão espalhados pelo sistema bancário mundial.
Esse fato não permite que a solução buscada para os bancos americanos seja agressiva em relação aos grandes bancos internacionais não-americanos. Nesse caso, a crise que já existe em outras economias seria agravada.
Em segundo lugar, a fixação de um preço justo para os ativos tóxicos que seriam colocados no "bad bank" é praticamente impossível de ser realizada no ambiente atual. Se o valor pago pelos ativos tóxicos for baixo, a marcação a mercado do restante dos créditos que remanescerão nos balanços dos bancos mostrará um volume de prejuízos muito maior do que os hoje contabilizados. Muitos bancos continuariam podres, arrastando o problema por anos a fio, no estilo japonês.
Por outro lado, se os preços para os ativos tóxicos forem fixados de forma a não inviabilizar os bancos, o contribuinte americano é quem arcará com os prejuízos. Mesmo nessa hipótese, a crise de confiança continuará, porque os "good banks", por contiunuarem a ter esses ativos nos seus livros, já nasceriam com falta de transparência de seus ativos, embora em menor dimensão.
Essa proposta fica ainda mais complexa na medida em que, no modelo revelado pelo secretário do Tesouro americano, o "bad bank" teria investidores privados para diminuir o esforço fiscal do governo. Segundo a apresentação da última terça-feira, os preços dos ativos tóxicos teriam que acomodar o interesse de lucro dos investidores privados, defender o contribuinte de prejuízos ainda maiores e não contaminar os ativos que ainda farão parte dos bancos americanos e europeus. Por isso, nas declarações do secretário americano, não existe nenhuma pista para a fixação desses valores.
Volto a insistir em que o governo Obama deve buscar outro caminho. Deve inverter a lógica e criar novos bancos -os "good banks"- inicialmente com capital público apenas. Eles assumiriam em um segundo momento os depósitos de seus clientes, a estrutura operacional e os ativos bons das instituições a serem liquidadas. Os bancos atuais -na realidade, a maioria deles já verdadeiros zumbis financeiros- seriam liquidados judicialmente, com prejuízos para acionistas e algumas classes de credores (excluindo depositantes, que continuariam garantidos). Nessa condição, não seria difícil atrair capital privado.
Essa é uma solução politicamente muito difícil, pois envolve aceitar que muitos no setor privado perderão, mas só assim um sistema bancário privado, sólido e rentável poderá renascer.
Luiz Carlos Mendonça de Barros , 66, engenheiro e economista, é economista-chefe da Quest Investimentos. Foi presidente do BNDES e ministro das Comunicações (governo Fernando Henrique Cardoso).
Um comentário:
This is such a great article . read me article
What Is A De Novo Bank
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