Abnor Gondim
DEU NO DCI – DIÁRIO COMERCIO INDÚSTRIA
Freire lembra que queda de juro não será por "canetada"
SÃO PAULO - "O sonho não acabou", costuma dizer o ex-senador e ex-deputado Roberto Freire (PE), presidente nacional do menor partido do bloco de oposição ao governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o Partido Popular Socialista (PPS), o antigo Partido Comunista Brasileiro (PCB). Para ele, uma nova forma de socialismo virá, sem o populismo latino-americano e talvez com a transição de Cuba para a democracia.
Acima do sonho, Freire está com os movimentos presos na realidade do Brasil. Em entrevista exclusiva ao DCI, ele cobrou do governo Lula explicações sobre a intenção de combater o spread e os juros bancários com a troca de comando do Banco do Brasil.
"Isso não se faz com uma canetada", criticou, justificando a decisão do PPS e dos demais partidos de oposição - PSDB e DEM - de pedirem a convocação do ministro da Fazenda, Guido Mantega. Eles querem esclarecer supostas negociatas que estariam atrás do que seria o real motivo da saída de Antonio Francisco Lima Neto do comando do Banco do Brasil.
Freire cobrou ainda investimentos com o uso do superávit primário e contenção de despesas do Executivo para enfrentar os efeitos da crise internacional.
Confira, a seguir, os principais trechos da entrevista.
O senhor também acha chique o Brasil passar a emprestar dinheiro para o Fundo Monetário Internacional (FMI)?
Essa declaração de Lula parece ter sido feita por um banqueiro de olhos azuis. Também foi uma frase de mau gosto a de que a crise financeira foi provocada por "gente branca de olhos azuis", como se ele quisesse dividir o mundo entre ricos e pobres e pretos e brancos. O problema é que o Brasil deverá precisar desse dinheiro que vai emprestar ao FMI. Não que o País esteja numa situação tão difícil quanto a dos países do Leste Europeu, mas poderia estar bem melhor se tivesse aproveitado o momento em que a economia mundial estava crescendo. E, nesse período, ficou entre os países com os piores índices de crescimento.
Como o senhor avalia a reação do governo à crise?
O governo tem agido com incompetência. O governo não fez diagnóstico da crise. Pior, desarmou a sociedade ao dizer que a crise estava muito distante de nós. Só teve uma atitude certa: liberar o empréstimo compulsório dos bancos. Mas não garantiu que esse dinheiro se transformasse em mais crédito. Ao contrário, os bancos usaram os recursos disponíveis para comprar mais títulos públicos.
Mas o senhor não considera que o governo está procurando combater a crise, ao trocar o comando do Banco do Brasil para reduzir o spread bancário e os juros e aumentar a oferta de crédito?
Isso não se faz com uma canetada. Se o Banco do Brasil, sozinho, reduzir o spread e os juros bancários, vai sofrer uma avalanche de pedidos de crédito, até mesmo sem a oferta de garantia. Um banco estatal não vai conseguir. E não se pode comprometer a solvência de um banco que se confunde com a própria nacionalidade brasileira. Por isso fala-se que a troca no comando do Banco do Brasil tem a ver com a Medida Provisória 443, que permitiu a compra de instituições financeiras em dificuldades. Com isso, o governo abriu a porta dos negócios sem transparência e fiscalização. Ninguém está contestando a preocupação com o spread. Ela deveria ter vindo há mais tempo. Mas a suspeita que levantamos é que por trás dessa demissão estão a MP e negociatas. Nós, dos partidos de oposição, convocamos Mantega a explicar por que demitiu o presidente do Banco do Brasil, dando como motivo o spread, problema que não ocorre agora. O governo brasileiro é tão subalterno aos interesses financeiros que a explicação que o ministro deu não faz sentido. Por que não houve obsessão antes para enfrentar esse problema? Se fosse isso, quem teria caído seria o presidente do Banco Central, Henrique Meirelles. O problema é a suspeita em relação à atuação do Banco do Brasil nessas compras. Nós queremos apurar se há negociatas por trás dessa demissão. Por exemplo, o caso da compra do Banco Votorantim.
Por quê?
Porque o governo compra e não estatiza. O controle do Banco Votorantim continua com os seus sócios. Ainda sobre a crise, é importante dizer que o governo faz todo o esforço para atender as montadoras de automóveis, sem levar em conta o impacto da redução do IPI [Imposto sobre Produtos Industrializados] nas contas dos governos estaduais e prefeituras.
Qual a receita da oposição contra a crise?
Em primeiro lugar, é o modo de encarar a crise. O governo está perdido e age pontualmente atendendo quem tem lobby mais forte. Agora atende as montadoras de veículos, depois vai para a linha branca de produção (geladeiras, freezers etc.). É preciso um projeto de governo para enfrentar a crise. A primeira medida é transformar em investimentos o superávit primário [economia para o pagamento da dívida].
Mas o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) não é uma solução de investimentos?
O PAC é uma irrelevância. No Estado de Pernambuco, apenas 10% das obras programadas foram concluídas. E isso acontece pelo País afora. O governador José Maranhão [PMDB], que é da base do governo, disse no Encontro de Governadores do Nordeste que o governo discrimina a Paraíba porque não há uma obra do PAC no estado. A mesma coisa se dá com o programa habitacional lançado pelo governo, sem ter prazo, sem ter metas, sem ter nada. E o presidente diz: "Não me cobrem data".
E o Fundo Soberano do Brasil?
O Fundo Soberano deveria ter sido feito na época da euforia, quando havia dinheiro para emprestar. Agora vai significar mais endividamento. Felizmente, agora, o DEM e o PSDB reconhecem falhas na política econômica do Governo Lula, o que antes consideravam como uma herança do governo Fernando Henrique Cardoso. Foi contra essa política de juros e spreads bancários altos que nós nos rebelamos e rompemos com o governo em 2004.
Quais outras medidas a oposição recomendaria?
Controle dos gastos públicos. Se é preciso apertar o cinto, como recomendou o presidente Lula aos prefeitos e aos governadores, então é preciso apertar o cinto do governo federal. Por que 37 ministérios? Não há um brasileiro que saiba o nome e o que faz cada um desses ministros. E há ministros que não se reúnem com o presidente Lula. Serve para empregar companheiros e colocar neles o status de ministro? Era melhor criar superintendências, departamentos, que funcionariam muito melhor. O País precisa investir em conhecimento, porque o Programa Bolsa Família não é um programa de futuro para país algum. Também o governo não pode querer continuar a abrir concursos, iludindo pessoas que passam e que não serão chamadas por causa da crise. Esse governo chega ao ponto de desmoralizar um dos institutos mais respeitados do País, o Ipea [Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada], que divulgou uma pesquisa dando conta de que a máquina pública brasileira não está inchada.
No aspecto mundial, o senhor acha que o capitalismo faliu?
De que tipo estamos falando? Antes, havia dois polos, que eram a burguesia e o proletariado. A burguesia eram os donos do capital. E hoje são também a classe média, as instituições financeiras organizadas pelos trabalhadores, os fundos de pensão. Isso permanece e permanecerá. O que acabou foi o capitalismo sem controle do Estado, o livre mercado sem regulamentação.
DEU NO DCI – DIÁRIO COMERCIO INDÚSTRIA
Freire lembra que queda de juro não será por "canetada"
SÃO PAULO - "O sonho não acabou", costuma dizer o ex-senador e ex-deputado Roberto Freire (PE), presidente nacional do menor partido do bloco de oposição ao governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o Partido Popular Socialista (PPS), o antigo Partido Comunista Brasileiro (PCB). Para ele, uma nova forma de socialismo virá, sem o populismo latino-americano e talvez com a transição de Cuba para a democracia.
Acima do sonho, Freire está com os movimentos presos na realidade do Brasil. Em entrevista exclusiva ao DCI, ele cobrou do governo Lula explicações sobre a intenção de combater o spread e os juros bancários com a troca de comando do Banco do Brasil.
"Isso não se faz com uma canetada", criticou, justificando a decisão do PPS e dos demais partidos de oposição - PSDB e DEM - de pedirem a convocação do ministro da Fazenda, Guido Mantega. Eles querem esclarecer supostas negociatas que estariam atrás do que seria o real motivo da saída de Antonio Francisco Lima Neto do comando do Banco do Brasil.
Freire cobrou ainda investimentos com o uso do superávit primário e contenção de despesas do Executivo para enfrentar os efeitos da crise internacional.
Confira, a seguir, os principais trechos da entrevista.
O senhor também acha chique o Brasil passar a emprestar dinheiro para o Fundo Monetário Internacional (FMI)?
Essa declaração de Lula parece ter sido feita por um banqueiro de olhos azuis. Também foi uma frase de mau gosto a de que a crise financeira foi provocada por "gente branca de olhos azuis", como se ele quisesse dividir o mundo entre ricos e pobres e pretos e brancos. O problema é que o Brasil deverá precisar desse dinheiro que vai emprestar ao FMI. Não que o País esteja numa situação tão difícil quanto a dos países do Leste Europeu, mas poderia estar bem melhor se tivesse aproveitado o momento em que a economia mundial estava crescendo. E, nesse período, ficou entre os países com os piores índices de crescimento.
Como o senhor avalia a reação do governo à crise?
O governo tem agido com incompetência. O governo não fez diagnóstico da crise. Pior, desarmou a sociedade ao dizer que a crise estava muito distante de nós. Só teve uma atitude certa: liberar o empréstimo compulsório dos bancos. Mas não garantiu que esse dinheiro se transformasse em mais crédito. Ao contrário, os bancos usaram os recursos disponíveis para comprar mais títulos públicos.
Mas o senhor não considera que o governo está procurando combater a crise, ao trocar o comando do Banco do Brasil para reduzir o spread bancário e os juros e aumentar a oferta de crédito?
Isso não se faz com uma canetada. Se o Banco do Brasil, sozinho, reduzir o spread e os juros bancários, vai sofrer uma avalanche de pedidos de crédito, até mesmo sem a oferta de garantia. Um banco estatal não vai conseguir. E não se pode comprometer a solvência de um banco que se confunde com a própria nacionalidade brasileira. Por isso fala-se que a troca no comando do Banco do Brasil tem a ver com a Medida Provisória 443, que permitiu a compra de instituições financeiras em dificuldades. Com isso, o governo abriu a porta dos negócios sem transparência e fiscalização. Ninguém está contestando a preocupação com o spread. Ela deveria ter vindo há mais tempo. Mas a suspeita que levantamos é que por trás dessa demissão estão a MP e negociatas. Nós, dos partidos de oposição, convocamos Mantega a explicar por que demitiu o presidente do Banco do Brasil, dando como motivo o spread, problema que não ocorre agora. O governo brasileiro é tão subalterno aos interesses financeiros que a explicação que o ministro deu não faz sentido. Por que não houve obsessão antes para enfrentar esse problema? Se fosse isso, quem teria caído seria o presidente do Banco Central, Henrique Meirelles. O problema é a suspeita em relação à atuação do Banco do Brasil nessas compras. Nós queremos apurar se há negociatas por trás dessa demissão. Por exemplo, o caso da compra do Banco Votorantim.
Por quê?
Porque o governo compra e não estatiza. O controle do Banco Votorantim continua com os seus sócios. Ainda sobre a crise, é importante dizer que o governo faz todo o esforço para atender as montadoras de automóveis, sem levar em conta o impacto da redução do IPI [Imposto sobre Produtos Industrializados] nas contas dos governos estaduais e prefeituras.
Qual a receita da oposição contra a crise?
Em primeiro lugar, é o modo de encarar a crise. O governo está perdido e age pontualmente atendendo quem tem lobby mais forte. Agora atende as montadoras de veículos, depois vai para a linha branca de produção (geladeiras, freezers etc.). É preciso um projeto de governo para enfrentar a crise. A primeira medida é transformar em investimentos o superávit primário [economia para o pagamento da dívida].
Mas o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) não é uma solução de investimentos?
O PAC é uma irrelevância. No Estado de Pernambuco, apenas 10% das obras programadas foram concluídas. E isso acontece pelo País afora. O governador José Maranhão [PMDB], que é da base do governo, disse no Encontro de Governadores do Nordeste que o governo discrimina a Paraíba porque não há uma obra do PAC no estado. A mesma coisa se dá com o programa habitacional lançado pelo governo, sem ter prazo, sem ter metas, sem ter nada. E o presidente diz: "Não me cobrem data".
E o Fundo Soberano do Brasil?
O Fundo Soberano deveria ter sido feito na época da euforia, quando havia dinheiro para emprestar. Agora vai significar mais endividamento. Felizmente, agora, o DEM e o PSDB reconhecem falhas na política econômica do Governo Lula, o que antes consideravam como uma herança do governo Fernando Henrique Cardoso. Foi contra essa política de juros e spreads bancários altos que nós nos rebelamos e rompemos com o governo em 2004.
Quais outras medidas a oposição recomendaria?
Controle dos gastos públicos. Se é preciso apertar o cinto, como recomendou o presidente Lula aos prefeitos e aos governadores, então é preciso apertar o cinto do governo federal. Por que 37 ministérios? Não há um brasileiro que saiba o nome e o que faz cada um desses ministros. E há ministros que não se reúnem com o presidente Lula. Serve para empregar companheiros e colocar neles o status de ministro? Era melhor criar superintendências, departamentos, que funcionariam muito melhor. O País precisa investir em conhecimento, porque o Programa Bolsa Família não é um programa de futuro para país algum. Também o governo não pode querer continuar a abrir concursos, iludindo pessoas que passam e que não serão chamadas por causa da crise. Esse governo chega ao ponto de desmoralizar um dos institutos mais respeitados do País, o Ipea [Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada], que divulgou uma pesquisa dando conta de que a máquina pública brasileira não está inchada.
No aspecto mundial, o senhor acha que o capitalismo faliu?
De que tipo estamos falando? Antes, havia dois polos, que eram a burguesia e o proletariado. A burguesia eram os donos do capital. E hoje são também a classe média, as instituições financeiras organizadas pelos trabalhadores, os fundos de pensão. Isso permanece e permanecerá. O que acabou foi o capitalismo sem controle do Estado, o livre mercado sem regulamentação.
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