Luiz Carlos Bresser-Pereira
DEU NA FOLHA DE S. PAULO
Essa é a melhor maneira de promover os interesses comuns que a América Latina tem com os Estados Unidos
TODAS AS semanas, se não todos os dias, leio na imprensa lamentos de que o presidente Barack Obama não está interessado na América Latina ou então apelos para que ele se interesse. São lamentos e apelos de quem espera que os EUA "ajudarão" os países latino- -americanos. Respeito essa opinião ou essa esperança, mas definitivamente não partilho dela.
O Brasil e os demais países da região não têm o menor interesse em que o grande país do Norte volte suas atenções para o Sul, porque esse país jamais os ajudou; pelo contrário, com muita frequência, interveio de forma imperialista a fim de garantir seus interesses ou os interesses de suas empresas instaladas na região. Vejo também críticas à política externa do Brasil porque estaríamos nos aliando a países "não democráticos", como Bolívia e Paraguai.
Críticas na imprensa americana que são reproduzidas e ampliadas na grande imprensa conservadora dos países latino-americanos. De repente, as elites conservadoras, que sempre se caracterizaram pela dependência em relação aos EUA, tornam-se "nacionalistas" em relação a esses países que são muito pobres. Ora, por serem pobres e pela consequente falta de uma sociedade civil organizada, de boas instituições e de um Estado capaz, esses países são muito difíceis de governar. Países nos quais a exclusão foi muito forte e existiu por muito tempo. Países cujos governos nacionalistas e de esquerda buscam agora refundar a respectiva república por meio da integração dos pobres e dos excluídos na democracia possível -na democracia que países e sociedades tão heterogêneas e Estados tão fracos podem construir.
Finalmente, sabemos como foram desastrosas as políticas neoliberais do Consenso de Washington. Não levaram ao desenvolvimento, mas a crises financeiras e ao aumento da desigualdade nos países que se submeteram a elas. Há algumas semanas vimos mais um golpe militar na América Latina, e, não obstante os protestos do governo americano, parece claro que houve ao menos a aquiescência dos EUA. Como houve sua participação ativa na tentativa de derrubar o presidente Hugo Chávez, em 2002. Agora, leio que em 1971 o Brasil conspirou com os EUA para derrubar o presidente do Chile, Salvador Allende. Uma conspiração que foi "vitoriosa" dois anos depois. É isso o que esperam os críticos da política externa brasileira? É esse tipo de aproximação que esperam aqueles que lamentam a falta de atenção de Obama pela América Latina? Que o Brasil se associe ao imperialismo americano agora, como fez no regime militar?
DEU NA FOLHA DE S. PAULO
Essa é a melhor maneira de promover os interesses comuns que a América Latina tem com os Estados Unidos
TODAS AS semanas, se não todos os dias, leio na imprensa lamentos de que o presidente Barack Obama não está interessado na América Latina ou então apelos para que ele se interesse. São lamentos e apelos de quem espera que os EUA "ajudarão" os países latino- -americanos. Respeito essa opinião ou essa esperança, mas definitivamente não partilho dela.
O Brasil e os demais países da região não têm o menor interesse em que o grande país do Norte volte suas atenções para o Sul, porque esse país jamais os ajudou; pelo contrário, com muita frequência, interveio de forma imperialista a fim de garantir seus interesses ou os interesses de suas empresas instaladas na região. Vejo também críticas à política externa do Brasil porque estaríamos nos aliando a países "não democráticos", como Bolívia e Paraguai.
Críticas na imprensa americana que são reproduzidas e ampliadas na grande imprensa conservadora dos países latino-americanos. De repente, as elites conservadoras, que sempre se caracterizaram pela dependência em relação aos EUA, tornam-se "nacionalistas" em relação a esses países que são muito pobres. Ora, por serem pobres e pela consequente falta de uma sociedade civil organizada, de boas instituições e de um Estado capaz, esses países são muito difíceis de governar. Países nos quais a exclusão foi muito forte e existiu por muito tempo. Países cujos governos nacionalistas e de esquerda buscam agora refundar a respectiva república por meio da integração dos pobres e dos excluídos na democracia possível -na democracia que países e sociedades tão heterogêneas e Estados tão fracos podem construir.
Finalmente, sabemos como foram desastrosas as políticas neoliberais do Consenso de Washington. Não levaram ao desenvolvimento, mas a crises financeiras e ao aumento da desigualdade nos países que se submeteram a elas. Há algumas semanas vimos mais um golpe militar na América Latina, e, não obstante os protestos do governo americano, parece claro que houve ao menos a aquiescência dos EUA. Como houve sua participação ativa na tentativa de derrubar o presidente Hugo Chávez, em 2002. Agora, leio que em 1971 o Brasil conspirou com os EUA para derrubar o presidente do Chile, Salvador Allende. Uma conspiração que foi "vitoriosa" dois anos depois. É isso o que esperam os críticos da política externa brasileira? É esse tipo de aproximação que esperam aqueles que lamentam a falta de atenção de Obama pela América Latina? Que o Brasil se associe ao imperialismo americano agora, como fez no regime militar?
Que o Brasil adote as políticas neoliberais que fracassaram na América Latina e nos próprios EUA, mas continuam a ser recomendadas pelas agências internacionais controladas pelos norte- -americanos?
Ou então talvez esses lamentadores estejam querendo que o Brasil se associe aos EUA como o fez o México? Qual foi o resultado dessa associação? Taxas de crescimento muito baixas, grande aumento da criminalidade e das drogas e, agora, nesta crise, uma brutal queda do PIB. Definitivamente, o presidente Obama é sábio em deixar a América Latina de lado. Ele é uma esperança para os EUA e para o mundo. Os governos dos países pobres não ameaçam seu país. Tanto para ele, portanto, como para nós, latino-americanos, é melhor que não se interesse pela América Latina. Deixemos Barack Obama em paz. Essa é a melhor maneira de promover os interesses comuns que a região tem com os EUA.
Luiz Carlos Bresser-Pereira , 75, professor emérito da Fundação Getulio Vargas, ex-ministro da Fazenda (governo Sarney), da Administração e Reforma do Estado (primeiro governo FHC) e da Ciência e Tecnologia (segundo governo FHC), é autor de "Macroeconomia da Estagnação: Crítica da Ortodoxia Convencional no Brasil pós-1994".
Ou então talvez esses lamentadores estejam querendo que o Brasil se associe aos EUA como o fez o México? Qual foi o resultado dessa associação? Taxas de crescimento muito baixas, grande aumento da criminalidade e das drogas e, agora, nesta crise, uma brutal queda do PIB. Definitivamente, o presidente Obama é sábio em deixar a América Latina de lado. Ele é uma esperança para os EUA e para o mundo. Os governos dos países pobres não ameaçam seu país. Tanto para ele, portanto, como para nós, latino-americanos, é melhor que não se interesse pela América Latina. Deixemos Barack Obama em paz. Essa é a melhor maneira de promover os interesses comuns que a região tem com os EUA.
Luiz Carlos Bresser-Pereira , 75, professor emérito da Fundação Getulio Vargas, ex-ministro da Fazenda (governo Sarney), da Administração e Reforma do Estado (primeiro governo FHC) e da Ciência e Tecnologia (segundo governo FHC), é autor de "Macroeconomia da Estagnação: Crítica da Ortodoxia Convencional no Brasil pós-1994".
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