DEU EM O GLOBO
Para os uruguaios, dúvida não é quem vencerá eleição presidencial hoje, mas como ex-guerrilheiro José Mujica governará
Janaína Figueiredo Enviada especial
MONTEVIDÉU. O Movimento de Libertação Nacional Tupamaros não nasceu com o objetivo de governar o Uruguai. Sua meta, disse ao GLOBO o senador eleito Eleuterio Fernández Huidobro, fundador e um dos principais líderes da guerrilha uruguaia nas décadas de 60 e 70, era “ajudar grupos que na época estavam sendo atacados por gangues fascistas protegidas pelo governo (democrático), sobretudo sindicatos e movimentos estudantis”.
Aos 67 anos, Huidobro, autor de vários livros sobre a história tupamara, assegurou que “quando o movimento foi criado era impensável que um de nossos membros chegasse à Presidência”.
Huidobro nunca imaginou que seu companheiro de luta guerrilheira José “Pepe” Mujica seria candidato da esquerdista Frente Ampla e grande favorito numa eleição presidencial.
O dia menos imaginado pelos tupamaros chegou. Hoje, 2,5 milhões de eleitores uruguaios irão às urnas e todas as pesquisas indicam que Mujica será eleito o sucessor de Tabaré Vázquez, o primeiro chefe de Estado de esquerda do país. Segundo analistas locais, o ex-guerrilheiro tupamaro alcançaria cerca de 50% dos votos e seu adversário, o expresidente Luis Alberto Lacalle (do Partido Blanco), até 45%.
Cobrança de sindicatos pode atrapalhar futuro governo A grande incógnita entre os uruguaios é saber como será Mujica como presidente. Um homem que passou quase 14 anos na prisão na última ditadura (1973-1985), foi torturado e ainda hoje justifica a violência armada de décadas passadas. Para seus companheiros de guerrilha, poucas coisas mudaram desde então. Os pensamentos fundamentais, assegurou Huidobro, continuam os mesmos.
— Ficou tudo igual, menos as armas — disse o senador eleito, que há dois anos fundou a Corrente de Ação e Pensamento, integrante da esquerdista Frente Ampla.
De acordo com Huidobro, os tupamaros continuam buscando “um país com menos pobreza e mais igualdade social”.
— Somos realistas e sabemos que as revoluções devem ser feitas com os pés no chão. Queremos que nosso país tenha uma burguesia que ganhe muito dinheiro e que participe de nosso projeto nacional — afirmou.
Para Huidobro, “o socialismo de (Hugo) Chávez não é o que buscamos. Porque é um socialismo que só cria burocracia”.
— Não acreditamos que o socialismo possa ser construído em base a uma sociedade com tanta pobreza — argumentou o ex-guerrilheiro.
Mas os esclarecimentos de Huidobro e do próprio Mujica não são suficientes para satisfazer as dúvidas de muitos. Para o escritor Antonio Mercado, autor do primeiro livro sobre os tupamaros, na década de 60, “Mujica é uma pessoa muito contraditória, ninguém sabe muito bem o que esperar de seu governo”. Segundo ele, um dos grandes problemas que deverá enfrentar é o crescente poder dos sindicatos.
— Mujica fechou acordos com os comunistas, que no Uruguai controlam os sindicatos.
Quando chegar ao poder, deverá atender suas demandas, mas também as dos empresários — explicou Mercado, para quem os sindicatos não querem saber de reforma do Estado, uma das principais questões pendentes.
— Nosso medo é que Mujica acabe refém dos sindicalistas.
Os tupamaros, lembrou Mercado, foram uma guerrilha urbana, formada por filhos da classe média, inspirada na Revolução Cubana e em outros movimentos latino-americanos. Para o escritor Adolfo Garcés, autor de “Onde houve fogo. O processo de adaptação do MNL-Tupamaros à legalidade e à concorrência eleitoral”, “a guerrilha uruguaia era essencialmente um movimento político, com armas”.
— Os tupamaros sempre foram políticos e Mujica é um político profissional — disse.
Para Garcés, “o movimento sempre teve ambição de poder, sempre quis fazer coisas, deixar sua marca registrada”.
— São impacientes, mas perseverantes.
Românticos, mas profundamente pragmáticos — analisou o escritor, professor do Instituto de Ciência Política da Universidade da República.
— Mujica significará continuidade em economia e algumas dúvidas em política.
— Mujica será mais aberto, buscará dialogar com todos os setores e deverá encontrar muitos consensos, já que negociou acordos com os comunistas, com Vázquez e os setores mais moderados da Frente Ampla
Para os uruguaios, dúvida não é quem vencerá eleição presidencial hoje, mas como ex-guerrilheiro José Mujica governará
Janaína Figueiredo Enviada especial
MONTEVIDÉU. O Movimento de Libertação Nacional Tupamaros não nasceu com o objetivo de governar o Uruguai. Sua meta, disse ao GLOBO o senador eleito Eleuterio Fernández Huidobro, fundador e um dos principais líderes da guerrilha uruguaia nas décadas de 60 e 70, era “ajudar grupos que na época estavam sendo atacados por gangues fascistas protegidas pelo governo (democrático), sobretudo sindicatos e movimentos estudantis”.
Aos 67 anos, Huidobro, autor de vários livros sobre a história tupamara, assegurou que “quando o movimento foi criado era impensável que um de nossos membros chegasse à Presidência”.
Huidobro nunca imaginou que seu companheiro de luta guerrilheira José “Pepe” Mujica seria candidato da esquerdista Frente Ampla e grande favorito numa eleição presidencial.
O dia menos imaginado pelos tupamaros chegou. Hoje, 2,5 milhões de eleitores uruguaios irão às urnas e todas as pesquisas indicam que Mujica será eleito o sucessor de Tabaré Vázquez, o primeiro chefe de Estado de esquerda do país. Segundo analistas locais, o ex-guerrilheiro tupamaro alcançaria cerca de 50% dos votos e seu adversário, o expresidente Luis Alberto Lacalle (do Partido Blanco), até 45%.
Cobrança de sindicatos pode atrapalhar futuro governo A grande incógnita entre os uruguaios é saber como será Mujica como presidente. Um homem que passou quase 14 anos na prisão na última ditadura (1973-1985), foi torturado e ainda hoje justifica a violência armada de décadas passadas. Para seus companheiros de guerrilha, poucas coisas mudaram desde então. Os pensamentos fundamentais, assegurou Huidobro, continuam os mesmos.
— Ficou tudo igual, menos as armas — disse o senador eleito, que há dois anos fundou a Corrente de Ação e Pensamento, integrante da esquerdista Frente Ampla.
De acordo com Huidobro, os tupamaros continuam buscando “um país com menos pobreza e mais igualdade social”.
— Somos realistas e sabemos que as revoluções devem ser feitas com os pés no chão. Queremos que nosso país tenha uma burguesia que ganhe muito dinheiro e que participe de nosso projeto nacional — afirmou.
Para Huidobro, “o socialismo de (Hugo) Chávez não é o que buscamos. Porque é um socialismo que só cria burocracia”.
— Não acreditamos que o socialismo possa ser construído em base a uma sociedade com tanta pobreza — argumentou o ex-guerrilheiro.
Mas os esclarecimentos de Huidobro e do próprio Mujica não são suficientes para satisfazer as dúvidas de muitos. Para o escritor Antonio Mercado, autor do primeiro livro sobre os tupamaros, na década de 60, “Mujica é uma pessoa muito contraditória, ninguém sabe muito bem o que esperar de seu governo”. Segundo ele, um dos grandes problemas que deverá enfrentar é o crescente poder dos sindicatos.
— Mujica fechou acordos com os comunistas, que no Uruguai controlam os sindicatos.
Quando chegar ao poder, deverá atender suas demandas, mas também as dos empresários — explicou Mercado, para quem os sindicatos não querem saber de reforma do Estado, uma das principais questões pendentes.
— Nosso medo é que Mujica acabe refém dos sindicalistas.
Os tupamaros, lembrou Mercado, foram uma guerrilha urbana, formada por filhos da classe média, inspirada na Revolução Cubana e em outros movimentos latino-americanos. Para o escritor Adolfo Garcés, autor de “Onde houve fogo. O processo de adaptação do MNL-Tupamaros à legalidade e à concorrência eleitoral”, “a guerrilha uruguaia era essencialmente um movimento político, com armas”.
— Os tupamaros sempre foram políticos e Mujica é um político profissional — disse.
Para Garcés, “o movimento sempre teve ambição de poder, sempre quis fazer coisas, deixar sua marca registrada”.
— São impacientes, mas perseverantes.
Românticos, mas profundamente pragmáticos — analisou o escritor, professor do Instituto de Ciência Política da Universidade da República.
— Mujica significará continuidade em economia e algumas dúvidas em política.
— Mujica será mais aberto, buscará dialogar com todos os setores e deverá encontrar muitos consensos, já que negociou acordos com os comunistas, com Vázquez e os setores mais moderados da Frente Ampla
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