Serra fala do risco do real forte, diz que debate econômico está "reprimido ideologicamente", mas não esclarece suas ideias
Presidentes de três dos maiores bancos privados no Brasil acreditam que o real valorizado é, sim, um problema. "Os economistas dizem, inclusive aqui no banco, que o mercado acerta o nível do câmbio. Não aceito essa posição", diz um deles. "Essa preocupação é muito válida", diz outro. O real forte tenderia a ser um empecilho para a criação de empregos suficientes, dados os prejuízos para a indústria. Nenhum critica o IOF sobre aplicações de não residentes em ações e títulos, tido como "um remendo", porém.
Acham que mais medidas do gênero elevariam o custo do capital e podem não servir nem de paliativo. Os economistas desses bancos, no centro do debate econômico mais cotidiano, não pensam assim, é claro.
Para os mais extremados, nada se deve fazer a respeito do câmbio. Os mais moderados acreditam que, a tomar alguma providência, nenhuma deve afetar o sistema de metas de inflação, isto é, não se deve utilizar a taxa básica de juros a fim de influenciar o câmbio. Quando instados pelos banqueiros a oferecer opções para o câmbio, no geral sugerem reduzir gastos públicos de modo a haver sobras para aumentar a compra de reservas (e cortar juros).
A sugestão não difere muito de ideias de economistas tucanos "paulistas" e mais experientes (que não tiveram voz sob FHC). Dito às claras o que afirmam de forma mais cheia de dedos, a política econômica não teria a princípio apelo popular.
Desvalorizar o real de modo a não causar inflação implica reduzir o consumo privado e o do governo por algum tempo. Ou seja, cortar gastos do governo: manutenção da máquina, salários e benefícios sociais, que não poderiam ter aumento; contenção dos reajustes do salário mínimo etc.
Há medidas auxiliares, que não cabem aqui: mudar a rolagem da dívida pública, concluir a desindexação da economia etc. Mas essa vertente tucana paulista também rejeita a "excessiva" autonomia do Banco Central. Não explicitam o que querem nem defendem intervenção direta, mas, parece, seria adequado que houvesse uma direção do BC "compreensiva" em relação a esforços fiscais do governo e que derrubasse os juros com mais rapidez.
Essa pincelada sumaríssima do problema vem a propósito de declarações recentes de José Serra sobre câmbio. Serra diz que não quer falar desses e de outros assuntos delicados. Se o fizesse, acredita, explicitaria um programa e uma candidatura a presidente que não assumiu. Mas Serra voltou a falar, de modo sumário, sobre câmbio, desenvolvimento etc. em entrevista no livro comemorativo dos 40 anos do Cebrap ("Retrato de Grupo", Cosac Naify).
Diz lá que o Brasil tem "um problema de curto prazo muito sério", "uma armadilha": juros altíssimos, moeda forte demais, gastos públicos demais. Tais problemas, o câmbio em particular, podem fazer o país "caminhar", a longo prazo, para uma economia primário-exportadora (vendedora de recursos naturais, desindustrializada), incapaz de criar empregos bastantes. O que fazer?
Serra diz no livro que é preciso "um bom debate", que "não existe" no Brasil debate "interditado" e "até reprimido ideologicamente". Mas a oposição, da qual Serra é um líder, é que interdita avenidas maiores do debate. Quando não o avacalha.
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