domingo, 24 de janeiro de 2010

Merval Pereira:: A nova classe

DEU EM O GLOBO

A forte participação do PT e de sindicalistas, especialmente os ligados à CUT, na máquina pública federal, analisada no livro “A elite dirigente do governo Lula”, da cientista política Maria Celina D’Araujo, com a colaboração de Camila Lameirão, não está limitada apenas aos cargos de confiança do serviço público, mas se espalha até a direção dos maiores fundos de pensão do país.

A análise da composição da diretoria executiva e do conselho fiscal dos três maiores fundos de pensão — Previ (Banco do Brasil), Petros (Petrobras) e Funcef (Caixa Econômica Federal) no segundo governo de Fernando Henrique Cardoso e nos dois de Lula — mostra uma presença constante e, praticamente na mesma intensidade, de petistas nos cargos de comando desses fundos.

O que confirma que o PT e os sindicatos passaram a lidar com o tema de forma mais profissional a partir dos anos 1990, para ocupar parte significativa desse campo de direção.

A Previ, o maior fundo de pensão do Brasil, tinha, em dezembro de 2008, 175.995 participantes, e seus investimentos eram da ordem de R$ 116,7 bilhões.

A Petros, o segundo maior fundo de pensão brasileiro, em novembro de 2008 tinha 128 mil participantes e patrimônio em torno de R$ 39,2 bilhões.

A Fundação dos Economiários Federais, a Funcef, no fim de 2008 tinha patrimônio ativo superior a R$ 34 bilhões, e o número de participantes chegava a mais de 100 mil.

Entre 1999-2008, o trabalho catalogou 39 dos 51 dirigentes da Previ, 23 de um total de 28 da Petros, e 24 para um conjunto de 34 da Funcef, num total de 86 dirigentes, sendo que apenas dez eram mulheres.

Analisando a presença de filiados a partidos entre os nomeados em cada um dos três governos, o estudo constatou que, no segundo mandato de Fernando Henrique, 20,6% (7 das 34 pessoas) eram filiados a partidos, enquanto nos dois governos de Lula os percentuais são de 24,3% (9 das 37 pessoas) e 20% (3 das 15 pessoas), respectivamente. Todos do PT.

O estudo mostra que a filiação a partidos, embora significativa, não é tão expressiva quanto a vinculação com sindicatos. Durante o segundo mandato de FHC, das 34 pessoas identificadas como ocupantes de cargos na diretoria executiva e no conselho fiscal dos três fundos, 14 eram sindicalizadas, ou seja, 41,2%.

No primeiro governo Lula temos 37 pessoas nomeadas, e o percentual sobe para 51,3%. No segundo há 15 pessoas indicadas e, delas, 66,6% são sindicalizadas. A presença sindical cresce expressivamente com a posse de Lula, e aumenta no seu segundo governo.

Através de diferentes fontes de informação, os pesquisadores conseguiram apurar dados sobre filiação partidária e sindical do grupo de 86 pessoas entre os 113 nomeados a partir de 1999.

Quanto a partidos, as taxas de filiação são semelhantes às encontradas entre os 505 ocupantes de DAS, cargos de confiança no serviço público. Para estes foi encontrado um índice de 24,7% de filiados, enquanto entre os 86 dirigentes de fundo de pensão chegouse a 22,1%.

O percentual de dirigentes filiados a partidos em cada um desses fundos varia de 17% a 21%, e todos são filiados ao PT. Entre eles, a maior parte (oito) cabe à Previ. Os dados sobre filiação a sindicatos mostram números um pouco superiores aos da amostra de 505 DAS dos dois governos Lula.

Nessa amostra, a filiação era de 40,8%, e entre os dirigentes dos fundos de pensão é maior que 50% nos casos da Previ e da Petros. A Funcef apresenta o menor índice de sindicalizados, ou seja, apenas dez das 24 pessoas ali identificadas, cerca de 40%.

Comparando-se a sindicalização e a filiação a partidos, a superposição não é tão marcante quanto a verificada na amostra de DAS, que é de 39,3%. Embora metade desses dirigentes tenha filiação sindical, apenas 15 pertencem ao mesmo tempo a um sindicato e ao PT, o que significa que, entre os 86 dirigentes em questão, cerca de 17,5% são sindicalizados e filiados ao PT.

O trabalho de Maria Celina D’Araujo, realizado quando ela era pesquisadora do Cpdoc da Fundação Getulio Vargas, no Rio, mostra que o PT e os sindicatos brasileiros, de início arredios em participar dessa atividade, caracterizada como engrenagem do “capitalismo financeiro global”, começaram a pregar a necessidade de uma mudança de postura.

O próprio Lula, no início do primeiro governo, afirmava que o movimento operário precisava compreender o papel dos fundos de pensão.

Segundo a cientista política Maria Aparecida Jardim, já em 1996, a Abrapp (Associação Brasileira das Entidades de Previdência Privada) aproximou-se de importantes lideranças do PT por meio dos sindicatos dos Metalúrgicos e dos Bancários de São Paulo.

O livro não trata disso, mas os sindicalistas que passaram a controlar esses fundos de pensão foram chamados de “a nova classe” pelo sociólogo Chico Oliveira, fundador do PT e hoje um dissidente.

Sob a teorização de que o controle dos fundos de pensão era necessário para criar “uma nova solidariedade” e o “capitalismo popular”, o que se vê é uma briga de foice entre grupos sindicalistas para controlar os grandes negócios em que os fundos estão metidos.

Entre os maiores, se destaca o Previ do Banco do Brasil, que tem participação em 70 empresas e direito a indicar nada menos que 285 conselheiros.

Quem o preside desde o início do governo Lula é o ex-trotskista Sérgio Rosa, oriundo da Confederação Nacional dos Bancários.

Membros do governo Lula oriundos do sindicalismo bancário e do movimento trotskista, como os ex-ministros Luiz Gushiken e Ricardo Berzoini, presidente do PT, têm grande influência.

Um exemplo dos grandes negócios dos fundos de pensão dominados pelos sindicalistas é a fusão das telefônicas Brasil Telecom e Telemar na nova Oi, que colocou em posições contrárias o então todo poderoso chefe da Casa Civil, José Dirceu, contra Luiz Gushiken, com o banqueiro Daniel Dantas no meio da disputa.

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