DEU EM O GLOBO
A conferência da Academia da Latinidade em Córdoba foi preparatória da reunião da Aliança das Civilizações que se realizará em maio no Rio de Janeiro. Há três princípios fundamentais, segundo o secretário-geral Candido Mendes, que é também o representante brasileiro no organismo da ONU: é preciso desconstruir a ideia do diálogo, para que ele não seja apenas o resultado de um voluntarismo ingênuo; entender a necessidade de coexistência com a irracionalidade de um mundo que vai continuar dominado pela guerra das religiões a partir dos atentados de 11 de setembro nos Estados Unidos; e, por último, evitar os fundamentalismos dos dois lados, que o governo Bush encarnou.
Houve um consenso entre os palestrantes: é preciso compreender que estamos num momento em que a estrita razão ocidental não representa mais o império da civilização.
O trabalho de Lucien Sfez, professor emérito da Universidade Paris I Pantheon Sorbonne, mostra a necessidade de se chegar à multirracionalidade, de maneira a compreender que muitas vezes a razão como nós a entendemos é uma razão ocidental.
Esse mundo novo do diálogo das culturas vai enfrentar uma discussão muito grave, que é a de que nós não estamos lidando apenas com o diferente, mas com "o outro".
Foi o que procurou demonstrar o sinólogo François Julien, para quem a China não é apenas diferente, mas tem uma outra visão do mundo que repercute até mesmo na questão dos direitos humanos, que não é vigente lá.
Outro ponto importante debatido durante o seminário foi a questão do colonialismo, que, apesar de estar sendo vencido em todo o mundo, manteve sobrevivências de determinadas atitudes e posições, como defendeu o professor Walter Mignolo, diretor do Centro de Literatura para os estudos globais e de Humanidades da Duke University nos Estados Unidos.
A visão predominante de progresso ainda seria neocolonial desse ponto de vista, e é preciso chegar à noção de que não existem progressos simultâneos e que, sim, eles podem ser paralelos.
Não é possível que uma cultura enfrente o padrão de progresso da outra como num confronto. Uma questão ficou no ar: estamos realmente aceitando a premissa da alteridade em vez da premissa da diferença?
A Aliança das Civilizações, cujo alto representante é o ex-presidente de Portugal Jorge Sampaio, é um projeto das Nações Unidas que tem três países como líderes: Turquia, Espanha e Brasil, e o objetivo de encontrar saídas para que esse encontro internacional se dê.
Há problemas a serem enfrentados, como o fato de que a Turquia ainda não entrou realmente na Comunidade Europeia. E a necessidade de que exista um protagonismo que não esteja ainda com essa ideia fechada de hegemonia ocidental, para aceitar que, em casos como o do Irã, se permita que ele se explique à comunidade internacional, como estão negociando Brasil e Turquia.
Ao mesmo tempo, será preciso que o governo do Irã assuma compromissos com a comunidade internacional, tanto em relação ao seu programa nuclear, submetendo-o à inspeção dos organismos da ONU, quanto ao respeito aos direitos humanos.
O sociólogo francês Alain Touraine acha que a integração da Turquia à comunidade europeia servirá de reforço ao papel daquele país na negociação com o Irã como ponte entre o Ocidente e o Oriente.
O mundo atual, sem centros e periferias, tem novos protagonistas como os membros dos BRICs (Brasil, Rússia, Índia e China).
François Julien destacou a chamada "cultura da paz" cultivada historicamente pela China, que seria um obstáculo à tese das "guerras preventivas" que foi assumida pelos Estados Unidos durante o governo Bush.
Essa tradição da China, que não tem história de expansão colonialista, hoje impede que se tenha um maior consenso sobre as sanções ao Irã por seu programa nuclear fora de controle das agências internacionais.
O governo Obama está começando a sair desse clima de "guerras preventiva" e se aproximando de um acordo sobre as sanções com a China, que sempre foi um país centrado sobre si mesmo em sua imensidão.
Como desdobramentos possíveis, é preciso saber como é que, de fato, os direitos humanos podem ainda ser universalizados.
A tentativa da Aliança das Civilizações é chegar-se a uma plataforma básica de direitos humanos, e a ideia central seria definir o que são os crimes contra a humanidade para depois expandir esses conceitos.
Outra questão fundamental é a necessidade de preservar a democracia diante da identidade nacional, que, em muitos países, especialmente a China, tem prevalência.
Há também a necessidade de estabelecer mecanismos de auxílio internacional, sobretudo para a África e outras regiões mais pobres do planeta.
A China, muito por interesse próprio nas matérias-primas de que necessita, está atuando firmemente no auxílio aos países africanos.
O Brasil pode ter papel relevante nesse contexto de ajuda humanitária, com a ampliação de seu papel no mundo, seja tanto com os financiamentos do BNDES na América Latina quanto com as ações das forças de paz a serviço da ONU.
A conferência da Academia da Latinidade em Córdoba foi preparatória da reunião da Aliança das Civilizações que se realizará em maio no Rio de Janeiro. Há três princípios fundamentais, segundo o secretário-geral Candido Mendes, que é também o representante brasileiro no organismo da ONU: é preciso desconstruir a ideia do diálogo, para que ele não seja apenas o resultado de um voluntarismo ingênuo; entender a necessidade de coexistência com a irracionalidade de um mundo que vai continuar dominado pela guerra das religiões a partir dos atentados de 11 de setembro nos Estados Unidos; e, por último, evitar os fundamentalismos dos dois lados, que o governo Bush encarnou.
Houve um consenso entre os palestrantes: é preciso compreender que estamos num momento em que a estrita razão ocidental não representa mais o império da civilização.
O trabalho de Lucien Sfez, professor emérito da Universidade Paris I Pantheon Sorbonne, mostra a necessidade de se chegar à multirracionalidade, de maneira a compreender que muitas vezes a razão como nós a entendemos é uma razão ocidental.
Esse mundo novo do diálogo das culturas vai enfrentar uma discussão muito grave, que é a de que nós não estamos lidando apenas com o diferente, mas com "o outro".
Foi o que procurou demonstrar o sinólogo François Julien, para quem a China não é apenas diferente, mas tem uma outra visão do mundo que repercute até mesmo na questão dos direitos humanos, que não é vigente lá.
Outro ponto importante debatido durante o seminário foi a questão do colonialismo, que, apesar de estar sendo vencido em todo o mundo, manteve sobrevivências de determinadas atitudes e posições, como defendeu o professor Walter Mignolo, diretor do Centro de Literatura para os estudos globais e de Humanidades da Duke University nos Estados Unidos.
A visão predominante de progresso ainda seria neocolonial desse ponto de vista, e é preciso chegar à noção de que não existem progressos simultâneos e que, sim, eles podem ser paralelos.
Não é possível que uma cultura enfrente o padrão de progresso da outra como num confronto. Uma questão ficou no ar: estamos realmente aceitando a premissa da alteridade em vez da premissa da diferença?
A Aliança das Civilizações, cujo alto representante é o ex-presidente de Portugal Jorge Sampaio, é um projeto das Nações Unidas que tem três países como líderes: Turquia, Espanha e Brasil, e o objetivo de encontrar saídas para que esse encontro internacional se dê.
Há problemas a serem enfrentados, como o fato de que a Turquia ainda não entrou realmente na Comunidade Europeia. E a necessidade de que exista um protagonismo que não esteja ainda com essa ideia fechada de hegemonia ocidental, para aceitar que, em casos como o do Irã, se permita que ele se explique à comunidade internacional, como estão negociando Brasil e Turquia.
Ao mesmo tempo, será preciso que o governo do Irã assuma compromissos com a comunidade internacional, tanto em relação ao seu programa nuclear, submetendo-o à inspeção dos organismos da ONU, quanto ao respeito aos direitos humanos.
O sociólogo francês Alain Touraine acha que a integração da Turquia à comunidade europeia servirá de reforço ao papel daquele país na negociação com o Irã como ponte entre o Ocidente e o Oriente.
O mundo atual, sem centros e periferias, tem novos protagonistas como os membros dos BRICs (Brasil, Rússia, Índia e China).
François Julien destacou a chamada "cultura da paz" cultivada historicamente pela China, que seria um obstáculo à tese das "guerras preventivas" que foi assumida pelos Estados Unidos durante o governo Bush.
Essa tradição da China, que não tem história de expansão colonialista, hoje impede que se tenha um maior consenso sobre as sanções ao Irã por seu programa nuclear fora de controle das agências internacionais.
O governo Obama está começando a sair desse clima de "guerras preventiva" e se aproximando de um acordo sobre as sanções com a China, que sempre foi um país centrado sobre si mesmo em sua imensidão.
Como desdobramentos possíveis, é preciso saber como é que, de fato, os direitos humanos podem ainda ser universalizados.
A tentativa da Aliança das Civilizações é chegar-se a uma plataforma básica de direitos humanos, e a ideia central seria definir o que são os crimes contra a humanidade para depois expandir esses conceitos.
Outra questão fundamental é a necessidade de preservar a democracia diante da identidade nacional, que, em muitos países, especialmente a China, tem prevalência.
Há também a necessidade de estabelecer mecanismos de auxílio internacional, sobretudo para a África e outras regiões mais pobres do planeta.
A China, muito por interesse próprio nas matérias-primas de que necessita, está atuando firmemente no auxílio aos países africanos.
O Brasil pode ter papel relevante nesse contexto de ajuda humanitária, com a ampliação de seu papel no mundo, seja tanto com os financiamentos do BNDES na América Latina quanto com as ações das forças de paz a serviço da ONU.
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