DEU EM O ESTADO DE S. PAULO
O discurso lido por Dilma Rousseff no dia de sua vitória foi escrito a dez mãos. Mas, sem dúvida, as mais pesadas eram as da própria presidente e as do ex-ministro Antonio Palocci. Controle da inflação, estabilidade econômica, melhoria da qualidade do gasto público, respeito aos contratos, autonomia das agências reguladoras são compromissos que Palocci, quando ministro da Fazenda, herdou da gestão FHC e por eles brigou com o PT e com a própria Dilma até deixar o ministério, em março de 2006. Hoje são compromissos também da futura presidente.
Nos próximos dias Dilma deve anunciar a composição de sua equipe econômica e, no xadrez em montagem, Palocci e Paulo Bernardo despontam como peças-chave, estrategicamente colocadas ao seu lado no Palácio do Planalto para funcionarem como conselheiros, intermediários com os demais ministros, anteparos de pressões políticas, cinturão de proteção a ela e também influentes produtores de ideias e projetos para o governo. Bem aceitos por empresários, pelo mercado financeiro e pela oposição, os dois atuaram em dobradinha no primeiro mandato de Lula.
Dilma ainda não tomou posse, mas eles já recuperaram a dobradinha e começaram a atuar em harmonia. Em entrevista à repórter deste jornal Raquel Landim, Paulo Bernardo avisou que a nova presidente retomará as reformas microeconômicas de Palocci na Fazenda, interrompidas pelo efeito furacão do mensalão no Congresso.
Arquitetadas pelo secretário de Política Econômica na época, Marcos Lisboa, a partir do documento Agenda Perdida, elaborado por um grupo de 17 economistas e cientistas sociais, algumas dessas reformas andaram, entre elas a Lei de Falências e o sistema de crédito popular. Outras paralisaram, como o crédito imobiliário e o encurtamento do trâmite burocrático de abertura de empresas. O conjunto tinha por objetivo "apoiar o crescimento de longo prazo, criar ambientes propícios a novos negócios, aumentar a eficiência do mercado, a produtividade, a renda, o consumo e induzir novos investimentos", como definiu Lisboa (hoje diretor do Itaú-Unibanco) ao Estado, em maio de 2004.
Dessas reformas, a desoneração da folha de salários é a mais importante, mas também a mais complexa e difícil. Hoje os tributos que oneram a folha somam 27,8% assim distribuídos: 20% de contribuição previdenciária; 2,5% destinados ao Sistema S (Sesi, Senai, Sesc, etc.); 2,5% de salário educação; 2% para acidentes e doenças do trabalho; 0,6% para o Sebrae; e 0,2% para o Incra.
Em fevereiro de 2008 o presidente Lula manifestou a intenção de reduzir de 20% para 14% a contribuição previdenciária ao longo de seis anos e eliminar os 2,5% do salário educação, caindo a tributação total para 19,3%. Os sindicatos foram contra. O Ministério da Fazenda vem trabalhando com esses parâmetros, mas até agora não concluiu seu projeto. O obstáculo maior a essa alternativa é que reduzir a alíquota da Previdência aumenta ainda mais o já elevado déficit do INSS.
Em 2004 a proposta de Palocci para desonerar a folha era diferente. A desoneração não era linear e geral, mas seletiva e aplicada só aos salários de baixa renda, justamente para incentivar a legalização de trabalhadores informais que vivem sem nenhum direito trabalhista e sem garantia de aposentadoria na velhice. Com isso a reforma de Palocci isentava as empresas do pagamento de 20% à Previdência até o limite de um salário mínimo e, acima disso, reduzia a alíquota de uma parcela até dois mínimos. Essa eventual perda de receita seria compensada com um tributo sobre valor agregado que seria introduzido gradativamente na economia com alíquotas mais elevadas para setores de capital intensivo que pouco utilizam mão de obra - siderurgia e petroquímica - e desonerados setores de mão de obra intensiva, como têxtil, construção civil e calçados. Tudo seria feito aos poucos e com cuidado, de forma a não aumentar a carga tributária, garantia Lisboa na época.
Há, portanto, duas alternativas em jogo - a de Mantega e a de Palocci. Qual delas irá prevalecer?
Jornalista, é professora da PUC-RIO
O discurso lido por Dilma Rousseff no dia de sua vitória foi escrito a dez mãos. Mas, sem dúvida, as mais pesadas eram as da própria presidente e as do ex-ministro Antonio Palocci. Controle da inflação, estabilidade econômica, melhoria da qualidade do gasto público, respeito aos contratos, autonomia das agências reguladoras são compromissos que Palocci, quando ministro da Fazenda, herdou da gestão FHC e por eles brigou com o PT e com a própria Dilma até deixar o ministério, em março de 2006. Hoje são compromissos também da futura presidente.
Nos próximos dias Dilma deve anunciar a composição de sua equipe econômica e, no xadrez em montagem, Palocci e Paulo Bernardo despontam como peças-chave, estrategicamente colocadas ao seu lado no Palácio do Planalto para funcionarem como conselheiros, intermediários com os demais ministros, anteparos de pressões políticas, cinturão de proteção a ela e também influentes produtores de ideias e projetos para o governo. Bem aceitos por empresários, pelo mercado financeiro e pela oposição, os dois atuaram em dobradinha no primeiro mandato de Lula.
Dilma ainda não tomou posse, mas eles já recuperaram a dobradinha e começaram a atuar em harmonia. Em entrevista à repórter deste jornal Raquel Landim, Paulo Bernardo avisou que a nova presidente retomará as reformas microeconômicas de Palocci na Fazenda, interrompidas pelo efeito furacão do mensalão no Congresso.
Arquitetadas pelo secretário de Política Econômica na época, Marcos Lisboa, a partir do documento Agenda Perdida, elaborado por um grupo de 17 economistas e cientistas sociais, algumas dessas reformas andaram, entre elas a Lei de Falências e o sistema de crédito popular. Outras paralisaram, como o crédito imobiliário e o encurtamento do trâmite burocrático de abertura de empresas. O conjunto tinha por objetivo "apoiar o crescimento de longo prazo, criar ambientes propícios a novos negócios, aumentar a eficiência do mercado, a produtividade, a renda, o consumo e induzir novos investimentos", como definiu Lisboa (hoje diretor do Itaú-Unibanco) ao Estado, em maio de 2004.
Dessas reformas, a desoneração da folha de salários é a mais importante, mas também a mais complexa e difícil. Hoje os tributos que oneram a folha somam 27,8% assim distribuídos: 20% de contribuição previdenciária; 2,5% destinados ao Sistema S (Sesi, Senai, Sesc, etc.); 2,5% de salário educação; 2% para acidentes e doenças do trabalho; 0,6% para o Sebrae; e 0,2% para o Incra.
Em fevereiro de 2008 o presidente Lula manifestou a intenção de reduzir de 20% para 14% a contribuição previdenciária ao longo de seis anos e eliminar os 2,5% do salário educação, caindo a tributação total para 19,3%. Os sindicatos foram contra. O Ministério da Fazenda vem trabalhando com esses parâmetros, mas até agora não concluiu seu projeto. O obstáculo maior a essa alternativa é que reduzir a alíquota da Previdência aumenta ainda mais o já elevado déficit do INSS.
Em 2004 a proposta de Palocci para desonerar a folha era diferente. A desoneração não era linear e geral, mas seletiva e aplicada só aos salários de baixa renda, justamente para incentivar a legalização de trabalhadores informais que vivem sem nenhum direito trabalhista e sem garantia de aposentadoria na velhice. Com isso a reforma de Palocci isentava as empresas do pagamento de 20% à Previdência até o limite de um salário mínimo e, acima disso, reduzia a alíquota de uma parcela até dois mínimos. Essa eventual perda de receita seria compensada com um tributo sobre valor agregado que seria introduzido gradativamente na economia com alíquotas mais elevadas para setores de capital intensivo que pouco utilizam mão de obra - siderurgia e petroquímica - e desonerados setores de mão de obra intensiva, como têxtil, construção civil e calçados. Tudo seria feito aos poucos e com cuidado, de forma a não aumentar a carga tributária, garantia Lisboa na época.
Há, portanto, duas alternativas em jogo - a de Mantega e a de Palocci. Qual delas irá prevalecer?
Jornalista, é professora da PUC-RIO
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