Pode haver algum excesso de emoção na afirmação feita ontem pelo comissário da União Europeia para Energia, Gunther Oettinger. Ele observou que "o acidente nuclear no Japão mudou o mundo". E advertiu que uma rigorosa revisão dos padrões de segurança dos reatores nucleares europeus poderá fechar certo número de usinas.
Pode afinal não ter mudado o mundo tanto quanto Oettinger pareceu afirmar, mas alguma consequência importante parece inevitável, mesmo levando-se em conta que é prematuro qualquer balanço dos estragos e de suas causas. Os dois últimos grandes acidentes nucleares (Three Mile Island, nos Estados Unidos, em 1979, e o de Chernobyl, na Ucrânia, em 1986) também paralisaram ou adiaram grande número de projetos de construção de usinas termonucleares.
Ontem, os governos da Alemanha e da Suíça suspenderam ou pospuseram seus programas de expansão nuclear. E na Inglaterra, onde se prevê a construção de 11 novas usinas, o governo pediu reestudo imediato ao seu chefe da Inspetoria Nuclear, Mike Weightman. Os Estados Unidos, também vulneráveis a terremotos e a tsunamis, na costa Oeste, ou a furacões, tão destruidores como o Katrina, na costa Leste, contam hoje com 104 usinas nucleares, muitas delas construídas sob os mesmos padrões de segurança que prevaleciam em Fukushima e que, agora, falharam deploravelmente.
Os engenheiros nucleares se orgulhavam da eficiência dos seus sistemas redundantes de segurança. Agora viram que foi necessário que esses não fossem nem o mais forte terremoto nem o mais sério tsunami ocorrido no mundo para derreter esse orgulho numa tarde.
A catástrofe nuclear de Fukushima só não foi mais séria porque aparentemente a fusão dos núcleos dos reatores foi contida a tempo e porque a população adjacente às usinas, muito bem treinada para enfrentar adversidades desse tipo, foi evacuada a tempo. Esse certamente será o argumento que as indústrias produtoras de equipamentos nucleares repetirão diante das autoridades para garantir o futuro do seu negócio.
Em todo caso, não há como contestar que os atuais padrões de segurança não são tão confiáveis como se imaginava e que alguns anos mais serão necessários para desenvolver blindagens contra riscos de catástrofes naturais e eventuais ataques terroristas. Apesar do forte aumento dos custos de construção de centrais nucleares, as autoridades do mundo inteiro serão levadas agora a reconsiderar procedimentos.
Enquanto não houver confiança, será inevitável o aumento da pressão tanto sobre fontes alternativas de energia como sobre as convencionais, especialmente sobre petróleo e gás natural.
Num primeiro momento, as cotações do petróleo deverão sofrer o impacto da relativa desorganização do sistema produtivo do Japão, que precisará agora de tempo para ser reativado. Enquanto isso, a demanda por energia será mais baixa. Mas parece inevitável o novo aumento da importância do petróleo e do gás natural na formação da matriz energética global (veja gráfico).
Em 2008, a produção mundial de petróleo foi de 86 milhões de barris (de 159 litros) diários, praticamente equivalente ao consumo. Em 2030, conforme cálculos de consultorias especializadas, a demanda saltará para a altura dos 106 milhões de barris diários. Aos atuais níveis de reposição de reservas, faltarão cerca de 75 milhões de barris para garantir o suprimento.
Esse déficit terá de ser coberto ou com novas descobertas de petróleo e gás e/ou com fontes alternativas de energia e/ou maior eficiência na produção e no consumo.
Os acontecimentos do Japão mostram agora que a principal dessas fontes alternativas de energia (a nuclear) acaba de receber um golpe poderoso, o que exigirá mais pesquisas, mais investimentos e sabe-se lá quanto tempo mais de maturação.
As condições privilegiadas em recursos hídricos, petróleo, gás natural, bioenergia e potencial eólico beneficiam o Brasil. Mas são de doer a fragilidade dos marcos regulatórios aqui vigentes, a incompetência das nossas autoridades - que nem causas de apagões são capazes de identificar - e o desperdício de recursos públicos em cada projeto de produção de energia.
FONTE: O ESTADO DE S. PAULO
Pode afinal não ter mudado o mundo tanto quanto Oettinger pareceu afirmar, mas alguma consequência importante parece inevitável, mesmo levando-se em conta que é prematuro qualquer balanço dos estragos e de suas causas. Os dois últimos grandes acidentes nucleares (Three Mile Island, nos Estados Unidos, em 1979, e o de Chernobyl, na Ucrânia, em 1986) também paralisaram ou adiaram grande número de projetos de construção de usinas termonucleares.
Ontem, os governos da Alemanha e da Suíça suspenderam ou pospuseram seus programas de expansão nuclear. E na Inglaterra, onde se prevê a construção de 11 novas usinas, o governo pediu reestudo imediato ao seu chefe da Inspetoria Nuclear, Mike Weightman. Os Estados Unidos, também vulneráveis a terremotos e a tsunamis, na costa Oeste, ou a furacões, tão destruidores como o Katrina, na costa Leste, contam hoje com 104 usinas nucleares, muitas delas construídas sob os mesmos padrões de segurança que prevaleciam em Fukushima e que, agora, falharam deploravelmente.
Os engenheiros nucleares se orgulhavam da eficiência dos seus sistemas redundantes de segurança. Agora viram que foi necessário que esses não fossem nem o mais forte terremoto nem o mais sério tsunami ocorrido no mundo para derreter esse orgulho numa tarde.
A catástrofe nuclear de Fukushima só não foi mais séria porque aparentemente a fusão dos núcleos dos reatores foi contida a tempo e porque a população adjacente às usinas, muito bem treinada para enfrentar adversidades desse tipo, foi evacuada a tempo. Esse certamente será o argumento que as indústrias produtoras de equipamentos nucleares repetirão diante das autoridades para garantir o futuro do seu negócio.
Em todo caso, não há como contestar que os atuais padrões de segurança não são tão confiáveis como se imaginava e que alguns anos mais serão necessários para desenvolver blindagens contra riscos de catástrofes naturais e eventuais ataques terroristas. Apesar do forte aumento dos custos de construção de centrais nucleares, as autoridades do mundo inteiro serão levadas agora a reconsiderar procedimentos.
Enquanto não houver confiança, será inevitável o aumento da pressão tanto sobre fontes alternativas de energia como sobre as convencionais, especialmente sobre petróleo e gás natural.
Num primeiro momento, as cotações do petróleo deverão sofrer o impacto da relativa desorganização do sistema produtivo do Japão, que precisará agora de tempo para ser reativado. Enquanto isso, a demanda por energia será mais baixa. Mas parece inevitável o novo aumento da importância do petróleo e do gás natural na formação da matriz energética global (veja gráfico).
Em 2008, a produção mundial de petróleo foi de 86 milhões de barris (de 159 litros) diários, praticamente equivalente ao consumo. Em 2030, conforme cálculos de consultorias especializadas, a demanda saltará para a altura dos 106 milhões de barris diários. Aos atuais níveis de reposição de reservas, faltarão cerca de 75 milhões de barris para garantir o suprimento.
Esse déficit terá de ser coberto ou com novas descobertas de petróleo e gás e/ou com fontes alternativas de energia e/ou maior eficiência na produção e no consumo.
Os acontecimentos do Japão mostram agora que a principal dessas fontes alternativas de energia (a nuclear) acaba de receber um golpe poderoso, o que exigirá mais pesquisas, mais investimentos e sabe-se lá quanto tempo mais de maturação.
As condições privilegiadas em recursos hídricos, petróleo, gás natural, bioenergia e potencial eólico beneficiam o Brasil. Mas são de doer a fragilidade dos marcos regulatórios aqui vigentes, a incompetência das nossas autoridades - que nem causas de apagões são capazes de identificar - e o desperdício de recursos públicos em cada projeto de produção de energia.
FONTE: O ESTADO DE S. PAULO
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