terça-feira, 16 de agosto de 2011

Apoio necessário:: Merval Pereira


O movimento comandado pelo senador Pedro Simon, de apoio suprapartidário ao combate à corrupção no governo que a presidente Dilma vem realizando, é sintoma de uma situação política controversa de difícil solução. É inegável que a presidente tem encontrado na opinião pública uma receptividade grande a seus gestos, que parecem levar o governo para um confronto com a política fisiológica que dá sustentação à coalizão governamental.

Nem mesmo o fato de que ela foi beneficiária desse mesmo esquema para se eleger presidente da República parece afetar a credibilidade de sua ação.

Como se a população estivesse disposta a relevar seu conhecimento anterior da situação, e até mesmo sua convivência com esse mesmo esquema corrupto que ora parece rejeitar, desde que ela se disponha a acabar com ele.

Parece ser de entendimento público que a chefe da Casa Civil e depois candidata a presidente não poderia impedir que o ex-presidente Lula tratasse a pão de ló os mesmos políticos, mesmo que tenha sido eleita graças em boa medida à ação deles.

Ao mesmo tempo, e devido à percepção de que ela vem se comportando como uma traidora, a própria base aliada a vem pressionando para que retorne ao leito natural da política pragmática implementada por seu tutor, o ex-presidente Lula.

Foi por essa razão, aliás, que surgiu o movimento de apoio à presidente, para respaldá-la contra o que estaria se caracterizando como uma rebelião interna.

Mas esse apoio político, rejeitado pelo núcleo principal do PMDB e do PT, pode não ser de grande ajuda.

Na sessão de ontem, houve demonstrações das lideranças daqueles dois partidos de que o apoio ao combate à corrupção não é a prioridade deles, ao contrário do que parece ser para a sociedade.

Não é nada paradoxal que a presidente Dilma se fortaleça nas pesquisas de opinião com essa faxina ética, mas se enfraqueça dentro de sua própria base aliada.

Só demonstra a distância cada vez maior entre a sociedade e a classe política, diferença bem captada pelo marqueteiro João Santana, que parece ser o cérebro por trás dessa faxina ministerial.

Como não é uma política capaz de transformar em retórica de palanque essa força que a sociedade lhe dá, a presidente Dilma parece presa a uma armadilha que não tem saída fácil.

Embora tenha uma base política aliada que cobre cerca de 70% do Congresso, a presidente Dilma vem desagradando a seus apoiadores de tal maneira que hoje já não é possível saber a quantas anda sua base aliada real.

Por razões corretas, como a insatisfação com as grosserias presidenciais ou com sua maneira centralizadora de presidir a República, ou pelas piores razões, seus aliados estão hoje com o pé atrás em relação aos seus futuros políticos e não se entusiasmam muito com a perspectiva de ter Dilma como presidente em um segundo mandato.

Isso mal encerrada a metade do primeiro ano do primeiro mandato, o que é um péssimo sinal do que teremos pela frente.

Não chego a achar que ela virá a ter problemas para terminar seu mandato, como o ex-ministro José Dirceu andou comentando em rodas brasilienses - e depois desmentiu, como é próprio dos boquirrotos apanhados em indiscrições -, mas que terá dificuldades políticas no Congresso, isso terá.

Para a parte da base aliada que ainda faz política, a centralização das decisões não apenas retira poder de seus subordinados diretos, que não podem decidir com autonomia, como emperra a máquina pública.

Também a grosseria no trato pessoal ergue um muro que separa a presidente de seus assessores, tornando problemática a convivência no Palácio do Planalto.

Mas o mais grave, e nesse caso é preciso que a presidente tenha o apoio que ontem alguns senadores lhe ofereceram, é a reação contra a ação de limpeza que vem sendo feita, que fica assim limitada pelos interesses políticos que lhe tolhem os movimentos quando a faxina chega às portas do PMDB e do PT.

No caso do Ministério do Turismo, essa reação ganhou contornos de legalidade com a ação atrabiliária da Polícia Federal e, sobretudo, com o vazamento das fotos feitas pela Polícia Civil de Macapá.

Além de não haver razão para que os presos fossem fotografados sem camisa, as fotos foram tornadas públicas, numa ação de desmoralização que afronta os direitos individuais mesmo do maior ladrão.

Esses excessos só beneficiaram os presos, pois o foco da discussão passou a ser os abusos cometidos contra eles, e não os crimes de que são acusados.

Quando a presidente Dilma, com toda a razão, diz que a divulgação das fotos é "inaceitável", ela parece para setores mais radicais estar defendendo os acusados, quando na verdade está defendendo o estado de direito.

"Tenho o dever de afirmar que farei tudo que estiver ao meu alcance para coibir abusos, excessos e afrontas à dignidade de qualquer cidadão que venha a ser investigado. O meu governo quer uma Justiça eficaz, célere, mas sóbria e democrática, senhora da razão e incontestável nas suas atitudes e providências", ressaltou a presidente Dilma em uma declaração pública ontem que define bem sua posição.

Mas a inobservância desses princípios não pode ser pretexto para que as investigações não prossigam.

FONTE: O GLOBO

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