A presidente Dilma Rousseff voltou a projetar uma boa imagem nos segmentos melhor informados da sociedade com o rápido acolhimento das denúncias da imprensa sobre irregularidades no ministério dos Transportes, em especial no DNIT e na Valec. O que lhe rendeu, também, aplausos do ex-presidente FHC. E reanimou expectativas de alguns analistas de um progressivo distanciamento dela em relação ao ex-presidente Lula, por meio de decisões políticas e econômicas que desdobrem nesses campos essenciais as diferenças de estilo existentes entre os dois. Expectativas cuja confirmação seria sem dúvida positiva para o país. Mas que, realisticamente, não têm condições de configurar de fato o que constituiria mais uma, e relevante, reprodução de conflitos entre criador e criatura. Podendo, ao contrário, um ensaio efetivo desse distanciamento – que fosse mesmo além de uma operação de marketing político-eleitoral como a que tem sido promovida pelo Palácio do Planalto – reforçar a dependência da presidente ao antecessor, como alternativa à inviabilização do exercício de seu mandato.
Isso por causa de dois fatores básicos e vinculados. Porque ela não conta nem se propõe construir nenhum esquema próprio de sustentação política e parlamentar. E, sobretudo, porque sua visão da economia é basicamente a mesma do lulopetismo, centrada na perspectiva de um capitalismo de estado, tão próximo quanto possível do modelo chinês, e perseguida pelas peças chaves de sua equipe no ministério da Fazenda, Guido Mantega e Nelson Barbosa, bem como no BNDES, Luciano Coutinho. Perspectiva bem evidenciada numa das primeiras ações do novo governo – a emblemática intervenção praticada na Vale, sob suas ordens diretas, com a demissão do presidente Roger Agnelli.
Quanto à operação do marketing ético (afastamento de toda a cúpula do ministério dos Transportes), parou aí, contida por advertências de Lula sobre o risco de descontrole e desmonte da base parlamentar governista. As novas denúncias de irregularidades no ministério da Agricultura estão sendo abafadas porque, além do PTB, afetam o aliado decisivo no Congresso, o PMDB. Outro risco de complicações no relacionamento do governo com as Forças Armadas (com implicação no Congresso) explica a recomendação feita por Lula à presidente Dilma, para que desista da demissão do ministro da Justiça, Nelson Jobim. E as denúncias relativas ao ministério de Minas e Energia – por envolverem um ministro peemedebista e, juntos com ele, petistas ligados diretamente à presidente (indicados por ela quando chefiava a Casa Civil), os quais controlam as principais decisões da pasta e das estatais do setor elétrico – também serão desconsideradas.
4) Assim, tal operação é substituída agora por grande esforço do Planalto para impedir a apuração parlamentar das denúncias de corrupção em diversas áreas da máquina federal, a partir de uma CPI específica sobre a de Transportes, proposta pelas lideranças do PSDB, do DEM e do PPS. Apuração esta que se tornou mais preocupante para a presidente após o discurso feito ontem no Senado pelo ex-ministro Alfredo Nascimento. No qual ele responsabilizou o governo Lula pelo aumento irregular dos gastos do ministério dos Transportes, ocorrido durante a campanha eleitoral de 2010 e quando havia deixado o cargo de ministro para disputar o governo do Amazonas, ademais de atribuir seu pedido de demissão, no mês passado, a falta de apoio, prometido, da presidente. E ao qual se seguiu manifestação de outro senador do PR, Blairo Maggi, de que o partido deixará de integrar a base governista.
Quanto a outros dois ingredientes do marketing presidencial – a troca do palanquismo de Lula pelo estilo gerencial de Dilma Rousseff e os passos ainda tímidos de uma inflexão na política externa, em favor dos direitos humanos – embora não digam respeito a questões básicas do governo merecem apoio da opinião pública e da oposição. No caso dessa inflexão, por representar a revalorização de valores humanistas fundamentais de nossa sociedade, mas com a cobrança de novos passos no sentido da desideologização e do realismo das posturas do Itamaraty. Objetivos que estão ou estavam sendo deixados de lado pelo empenho diversionista da representação brasileira na ONU de contrapor-se a uma condenação do Conselho de Segurança às selvagens violências do ditador Bashar Assad contra os rebeldes sírios, já com o massacre de mias de 1.500 deles.
Jarbas de Holanda é jornalista
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