segunda-feira, 24 de outubro de 2011

Cristina obtém vitória histórica na Argentina

A presidente argentina, Cristina Kirchner, foi reeleita ontem por ampla maioria na mais expressiva votação já recebida por um líder político após a redemocratização do país, em 1983. Segundo pesquisas de boca de urna, ela teria 54% a 57% dos votos. O segundo colocado, o socialista Hermes Binner, teria apenas 14%. Cristina também deve obter maioria aliada na Câmara e no Senado. Especulações já começaram sobre como será o mandato, o terceiro consecutivo da família Kirchner, que consolida ainda a força do peronismo argentino. O vice que rompeu com ela, Julio Cobos, deixará o governo. Analistas preveem mais intervenção na economia e na mídia

O apogeu político de Cristina

Presidente argentina é reeleita com o maior índice de votos desde a redemocratização

Janaína Figueiredo

Num clima atípico para uma eleição presidencial - basicamente falta de entusiasmo e, sobretudo, certeza sobre qual seria o resultado -, os argentinos foram ontem às urnas sabendo que a partir de hoje o governo de Cristina Kirchner se preparará para encarar outros quatro anos de gestão. Foi uma votação sem grandes emoções. Para os seguidores do kirchnerismo, a expectativa era a de comemorar uma eleição histórica. Segundo dados oficiais, mais de 70% dos 28,9 milhões de eleitores votaram. As primeiras projeções de boca de urna, divulgadas por jornalistas e analistas políticos em redes sociais, indicavam que a presidente foi reeleita com entre 54% e 57%, o percentual mais alto desde o retorno da democracia, em 1983, o que torna Cristina a mais poderosa chefe de Estado desde então.

Os eleitores da oposição esperavam que os partidos anti-Kirchner preservassem um espaço importante no Congresso, onde foram renovadas 130 das 257 cadeiras da Câmara e 24 dos 72 senadores. Mas, segundo previsões de alguns canais de TV, o governo também conseguiu alcançar cadeiras suficientes para aprovar projetos de lei.

De acordo com um instituto de pesquisa vinculado ao governo e algumas redes de TV, Cristina obteve cerca de 55% dos votos. O segundo colocado, o governador da província de Santa Fe e candidato da Frente Ampla Progressista (FAP), Hermes Binner, teria alcançado 14%. O deputado e candidato da União para o Desenvolvimento Social (Udeso), Ricardo Alfonsín, teria ficado em terceiro, com 9%.

Em centros de votação da capital argentina, os eleitores de Cristina estavam tranquilos e satisfeitos com a continuidade de um governo que conseguiu baixar as taxas de pobreza e desemprego e implementou milionários programas sociais. Para o Executivo, entre 2001 e 2010, o índice de pobreza caiu de 50% a 9,9%, embora analistas privados calculem um percentual entre 22% e 30%. O desemprego, segundo o governo, recuou nos últimos dez anos de 20% para 7,5%.

Eleitores cobram combate à inflação

Os principais desafios para o terceiro governo da família presidencial, disseram alguns kirchneristas, serão combater a inflação que, segundo economistas privados, atingirá cerca de 30% este ano, três vezes mais do que projetou o questionado Indec (o IBGE argentino), e a insegurança nas ruas.

- Trabalho na construção. O crescimento do emprego é evidente - comentou o arquiteto José Muro, 36 anos, que vive no bairro de Belgrano.

Segundo ele, no entanto, "a inflação preocupa e deveria ser uma questão importante na agenda de Cristina a partir de 2012".

O engenheiro Alejandro Alonso, de 41, contou como conseguiu comprar sua casa própria este ano graças a um crédito do estatal Banco Ciudad.

- Não posso dizer que sou fã de Cristina. Confesso que pensei em votar em outro candidato, mas vou votar na presidente porque a realidade é que hoje estou passando um bom momento - disse o engenheiro, que, com sua mulher e dois filhos, acaba de se mudar para o bairro de Almagro.

Ele reconhece que ainda existem graves problemas no país, mas como muitos outros argentinos, não encontrou opção convincente entre os candidatos. Pensando neste perfil de eleitor, Cristina e seu companheiro de chapa, o ministro da Economia, Amado Boudou, afirmaram durante a campanha que ainda há muito a fazer. Ontem mesmo, Boudou reiterou o discurso após votar no bairro de Puerto Madero.

- Fizemos muito, mas ainda é muito mais o que resta a ser feito. Aprendemos muito neste período. Continuemos sonhando - declarou Boudou, ao lado de sua namorada, a jornalista Agustina Kampfer, 28 anos.

O ministro foi muito criticado pelos candidatos da oposição, que tentaram instalar o aumento da inflação como debate de campanha.

- Boudou deveria deixar de tocar guitarra e resolver o problema do aumento dos preços - atacou Alfonsín.

Mas a estratégia fracassou. O ministro continuou organizando shows com seu grupo favorito, La Mancha de Rolando, e mostrando suas habilidades musicais em programas de TV. Uma semana antes da eleição, o candidato da Udeso acusou Boudou de usar um avião da Presidência para viajar até o balneário de Necochea, na província de Buenos Aires, onde participou de um show.

Para eleitores da oposição, kirchnerismo é sinônimo de um governo autoritário, corrupto e que buscará, mais do que nunca, ampliar sua concentração de poder, além de destruir inimigos, entre eles, os meios de comunicação.

- A economia, que vai bem como em todos os demais países do continente, não é mérito de Cristina - argumentou a médica Geraldine González.

Alheia a todos os debates, Cristina votou em Rio Gallegos, capital da província de Santa Cruz. Emocionada, a presidente aceitou falar rapidamente com os jornalistas e, como faz há quase um ano, desde que Kirchner morreu, referiu-se a "ele" com lágrimas nos olhos.

- Sei que ele, onde estiver, deve estar muito satisfeito - disse Cristina, que continua de luto, mas vive, sem Kirchner, o melhor momento de sua carreira política.

FONTE: O GLOBO

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