Como pensar um cenário de estresse para o Brasil? Cada crise tem suas particularidades, então, o desenrolar de cada uma segue um caminho. Mas os pontos de contágio são praticamente os mesmos, especialmente se os episódios de crise são separados por pouco tempo.
Isso sugere olhar para a crise de 2008 como base para imaginar como a economia brasileira está reagindo à crise atual. É isso que o Banco Central (BC) tem feito, sustentando que sua postura monetária é consistente com a convergência da inflação para a meta em 2012, com um choque que tenha 25% da intensidade da crise de 2008.
A escolha do BC faz sentido. De fato, há duas dimensões para calibrar qualquer choque: seu tamanho e seu padrão intertemporal. Em termos de tamanho, o episódio de 2008 fornece uma referência. Para o padrão intertemporal, o choque de 2008 foi certamente em formato de "V", uma forte queda seguida por forte alta. Mas não é muito provável que a atual crise siga esse padrão, sendo mais provável um formato em "L", uma queda seguida por um período longo de estagnação.
Brasil cresceu devido à fatores exógenos; talvez não haja como reverter um choque externo de forma adequada
O que diferencia esses padrões? Em 2008 tivemos uma forte reação por parte das economias afetadas pela crise, e o que foi mais importante para o Brasil, uma fortíssima reação da China.
A expectativa que agora veremos um padrão em formato de "L" vem do fato que há pouco espaço, fiscal ou monetário, para as economias avançadas e a China reagir mais uma vez com a mesma agressividade. Mas certamente o espaço para reação do Brasil é bem maior: ainda temos, até depois dos recentes cortes, uma das taxas de juros mais altas do mundo; mais de US$ 350 bilhões em reservas; há por volta de R$ 400 bilhões em depósitos compulsórios; e a situação fiscal brasileira é bastante saudável.
Mas seria factível garantir o crescimento, especialmente dado um provável padrão intertemporal em "L"? Para tentar responder isso, adaptamos um modelo da economia brasileira recentemente publicado, utilizado pelo BC. A adaptação foi no sentido de introduzir explicitamente variáveis exógenas externas para poder captar os "pontos de entrada" da crise nos componentes do Produto Interno Bruto (PIB). Exemplo disso seria ter na equação de investimento, por exemplo, tanto o crescimento da economia chinesa como oscilações nos preços das commodities como variáveis independentes.
Formulando esse modelo, temos que adotar uma regra para a resposta da política econômica. Na formulação original, a política monetária segue uma regra de Taylor. Infelizmente essa regra estima uma Selic acima de 12%, portanto bastante longe do que está sendo praticado pelo BC. Decidimos em função disso calibrar a taxa Selic na nossa simulação para maximizar o crescimento econômico observando um limite de 6% para a inflação.
Contemplamos dois cenários, em padrão de "L", com tamanhos equivalentes a 25% e 100% ao que ocorreu em 2008, distribuídos igualmente durante dois anos. Nos resultados a questão do tamanho é muito importante: no caso de um choque de 25%, na nossa simulação a economia consegue crescer acima de 3% em 2012 e 2013 (especificamente 3,3% e 3%). Para chegar nesse resultado, a Selic cai, de forma contínua, até chegar a 6% ao ano, com a inflação oscilando entre 5,2% e 5,7% ao ano.
O que surpreende são os resultados do choque 100% igual a 2008. O crescimento cai para 1,9% em 2012 e 0,6% em 2013, apesar da Selic cair para 4% ao ano, sendo efetivamente negativa em termos reais. Nesse caso temos a inflação oscilando entre 5% e 5,7%.
O que está por trás de um resultado, no seu conjunto tão negativo, com pouco crescimento apesar de uma resposta muito agressiva da política monetária? Tendo em conta as limitações desse tipo de exercício estatístico, o que ele revela em nossa opinião é que, apesar da economia brasileira ser relativamente fechada, a contribuição das variáveis externas ao nosso crescimento é significativa. Um choque (como simulado aqui) no qual há uma queda contínua nos preços das commodities e outros fatores exógenos não tem como ser compensado de forma adequada. Nosso espaço para reagir é grande, mas não o suficiente frente uma crise em padrão "L".
Infelizmente, a nosso ver, o resultado concreto pode ser até pior do que apontado pela simulação. Há elementos institucionais, como a questão da poupança, que inibem uma queda tão agressiva da Selic. Além disso, nossas simulações pressupõem uma queda ordenada da taxa de câmbio, o que ajuda a balança comercial ficar em equilíbrio apesar da queda na demanda e preço das commodities. Seria fácil imaginar que, com um passivo externo calculado pelo BC de US$ 1,3 trilhão, uma piora do cenário como imaginada aqui levaria a uma queda ainda mais forte do real, limitando o espaço de resposta da política monetária.
Apesar dessas ressalvas, acreditamos que essas simulações servem de alerta de que o Brasil avançou principalmente por fatores externos, e não é crível acreditar que haverá como compensar uma reversão como imaginada aqui.
Tony Volpon é diretor do Nomura Securities International, Inc.
FONTE: VALOR ECONÔMICO
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