Pela primeira vez unidas, as oposições venezuelanas escolhem Henrique Capriles para enfrentar o coronel nas urnas com a proposta de reconduzir o país à normalidade política e econômica
Tatiana Gianini
CARACAS - No domingo 12, os venezuelanos elegeram o candidato que tentará impedir o quarto mandato consecutivo de Hugo Chávez no pleito presidencial de 7 de outubro. Para evitarem a pulverização do eleitorado insatisfeito com o governo chavista, os partidos de oposição submeteram à consulta popular cinco pré-candidatos. O escolhido foi o caraquenho Henrique Capriles Radonski, governador do estado de Miranda, onde se situa a capital, Caracas. Capriles obteve mais de 1,9 milhão de votos, 64% do total válido. O advogado solteiro de 39 anos é oriundo de uma família de empresários e filho de mãe judia, apesar de ter sido criado como católico. Ou seja, ele tem o perfil talhado para ser atacado por Chávez, cuja retórica costuma ser pontuada pelo antissemitismo e pelo preconceito contra a classe média alta. Na semana passada, Chávez disse que Capriles representa o "capitalismo ianque" e as velhas elites políticas do país.
Capriles começou a carreira em 1998 como deputado do tradicional Copei (Partido Social-Cristão), que muitos venezuelanos associam aos caóticos e corruptos governos anteriores ao de Chávez. Exatamente por isso, dois anos depois decidiu fundar o partido Primeiro Justiça, com a pretensão de fazer uma oposição jovem e livre de máculas do passado. Entre 2000 e 2008, Capriles foi prefeito de Baruta, um distrito de Caracas. Desde então é perseguido pelo chavismo. Em 2002, foi acusado de ter participado da invasão da Embaixada de Cuba – na verdade, ele foi até a sede diplomática para impedir que manifestantes depredassem o local. Ficou quatro meses preso. A boa gestão em Baruta lhe deu força para disputar o governo de Miranda, em 2008, derrotando o chavista Diosdado Cabello, atual presidente da Assembleia Nacional. Capriles foi punido pela vitória: o orçamento do estado foi cortado e o governo nacional tirou de sua administração todos os hospitais e postos de saúde.
A reação do governo às primárias da semana passada mostra que a competição pela Presidência será agressiva e repleta de difamações. Na véspera da votação, um canal estatal divulgou um suposto boletim de ocorrência policial de 2000 afirmando que Capriles foi preso em flagrante fazendo sexo com outro homem num carro. A equipe de marqueteiros do opositor, comandada por brasileiros, quer atrair os votos de venezuelanos que simpatizam com Chávez mas estão insatisfeitos com o seu governo, cujo legado ao país se resume a inflação, desabastecimento de produtos, blecautes e altas taxas de criminalidade. Por isso, a orientação é pegar leve com o presidente na campanha. Capriles vai virar saco de pancada de Chávez.
"Disputa será desigual"
Na terça-feira 14, após a cerimônia em que foi confirmado como candidato da oposição à Presidência da Venezuela, Henrique Capriles Radonski concedeu a seguinte entrevista a VEJA:
Como o senhor enfrentará Hugo Chávez nas urnas?
Depois da participação nas primárias de domingo, ganhar de Chávez no pleito de outubro será fácil. Se cada um dos venezuelanos que saíram de casa para escolher o candidato da oposição conseguir o apoio de outros dois eleitores, teremos 9 milhões de votos e chegaremos à Presidência.
A pressão e a intimidação do governo sobre os eleitores não serão um problema?
A disputa com o governo será desigual, mas até agora ganhei todas as eleições de que participei. Venci com muito esforço, com muito trabalho, com muito corpo a corpo com os eleitores. Não gosto de atos como o de hoje, em um salão fechado. Prefiro ir para a rua. Vou visitar cada canto da Venezuela, como não se faz desde 1998 (quando Chávez foi eleito).
Chávez aperfeiçoou-se no jogo sujo contra os adversários nas últimas eleições. Vai ser diferente desta vez?
As eleições são decididas nas urnas. Se não fiscalizarmos os locais de votação, perderemos. Temos de nos organizar para converter essa força demonstrada nas primárias em um esforço para supervisionar os votos em todas as seções eleitorais.
O senhor afirmou que o governo usa a renda do petróleo, ou seja, dinheiro público, para financiar a reeleição de Chávez. Como fazer frente a uma campanha com recursos tão ilimitados?
Não me preocupo com o poder financeiro do governo nacional. Quando fui candidato no estado de Miranda, estávamos em grande desvantagem. O outro candidato a governador distribuía geladeiras, lavadoras e televisores. Cheguei a pensar que perderia, mas acabei vencendo, porque eu tinha um projeto. Vou ganhar também agora. Quero garantir um bom governo à Venezuela.
Qual vai ser a prioridade de seu governo?
Educação. Minha experiência em Miranda mostrou que essa é a base do progresso.
O que o senhor pretende fazer com as empresas expropriadas por Chávez?
É preciso revisar caso a caso, mas em geral as expropriações são um fracasso competitivo que se converteu em um instrumento político.
O senhor diz ter Lula como modelo, mas o próprio ex-presidente brasileiro classificou Chávez como o melhor governante que a Venezuela já teve. Isso não é contraditório?
O Brasil é um país com democracia, com alternância de poder. O presidente não pode passar a vida toda governando. Eu acredito na necessidade de trocar o ocupante do cargo de tempos em tempos. O Brasil é um exemplo de progresso e de respeito a essa regra.
FONTE: REVISTA VEJA
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