Plano de "ajuda" coloniza o país, o destroça e serve apenas para dar tempo para a elite europeia se arranjar
Faz algumas semanas, era piada dizer que a Grécia seria reduzida à condição de república bananeira, ocupada por estrangeiros que vinham cobrar dívidas, como os americanos faziam na América Central no início do século 20.
Agora é oficial: inspetores da União Europeia e/ou FMI vão ter uma cadeira no departamento de contas a pagar e a receber do governo grego, praticamente dizendo o que pode e o que não pode. Haverá ainda uma conta especial para canalizar o dinheiro dos credores (o que sobrar, fica com os gregos).
Se implementado, o "plano de socorro" reduz a Grécia à condição de colônia: sem moeda, sem autonomia orçamentária, sem crédito, sem nada.
Para completar o cenário, faltariam apenas canhoneiras ancoradas no Pireu (o porto perto de Atenas) e agentes estrangeiros recolhendo dinheiro na alfândega.
Em termos econômicos, o "plano de socorro" é uma mentira cínica que as lideranças europeias contam a fim de ganhar tempo.
Vazou para os jornalistas um documento oficial e confidencial sobre a possibilidade de sucesso do "plano de ajuste" grego. Na hipótese mais otimista, a Grécia ainda deverá uns 130% do PIB em 2020.
Mas a hipótese mais otimista é alucinada. Depende de um cronograma irrealista de redução de deficit, de privatizações e de expectativa de crescimento econômico.
Como o próprio documento observa, um atraso na aplicação inicial do plano explode as demais e seguintes projeções irrealistas de "progresso". Isto é, se a Grécia não cresce, se não faz superavit primário suficiente ou não privatiza no preço e na velocidade projetados, o plano irá rapidamente para o vinagre.
Esclareça-se aqui o que é "otimismo" (dívida caindo a 130% do PIB em 2020): recessão de 4,3% em 2012, estagnação em 2013, redução média de salários em torno de 25% (sim, um quarto) até 2014. Um colapso.
O PIB grego encolheu uns 13% desde 2007. Na perspectiva otimista, a economia não voltaria ao nível de produção ("tamanho") de 2007 até 2022: 15 anos de estagnação. A essa altura, a renda per capita teria caído uns 15%, pelo menos. Se tudo der certo, pois, os gregos estarão, em 2020, 15% mais pobres do que o eram em 2007.
Obviamente ninguém está dando a mínima para a Grécia, e menos ainda para os gregos comuns. O que a elite europeia pretende é ganhar tempo, como o faz desde 2009.
Evita-se o calote grego, talvez até 2013. Nesse ínterim, tomam-se medidas para acolchoar o ambiente e proteger bancos e governos europeus de um "acidente" na Grécia (como uma revolução).
Em dezembro, o Banco Central Europeu emprestou meio trilhão de euros à banca da eurozona, a taxas de juros negativos (deu dinheiro, pois). No dia 29, terça que vem, pode emprestar outro meio trilhão.
A dinheirama atenuou o temor de quebra de bancos europeus, vários deles zumbis, mortos-vivos, reavivou um pouco de crédito interbancário e até permitiu que se usasse parte desse dinheiro na compra de títulos da dívida da Itália e da Espanha. O plano, enfim, põe a "Europa do Sul" na linha dura -a tortura grega fica como uma ameaça para recalcitrantes.
FONTE: FOLHA DE S. PAULO
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