As medidas adicionais de estímulo à demanda anunciadas pelo ministro da Fazenda na semana passada coincidiram com a divulgação pelo Banco Central de uma nova redução da taxa Selic, desta vez acompanhada por uma mudança de tom em seu comunicado, sinalizando que provavelmente tenha chegado ao fim o ciclo atual de baixa de taxa básica de juros.
Por outro lado, a pesquisa Focus segue indicando que a expectativa média dos agentes econômicos é de não cumprimento da meta de inflação neste ano e também nos dois anos seguintes. Aliás, espera-se mesmo a aceleração da inflação no próximo ano, simultaneamente ao maior crescimento do PIB. Por causa disso, a maioria dos analistas já antevê a necessidade de subida das taxas de juros em 2012, com vistas a evitar que a inflação ultrapasse o teto de tolerância do regime de metas (6,5%).
Nesse contexto, os novos estímulos anunciados pelo ministro Mantega podem se revelar exagerados, levando a economia para um ritmo de crescimento insustentável em 2012, repetindo-se, assim, o mesmo equívoco acontecido em 2010. Vale recordar que naquele ano o PIB cresceu 7,5% em termos reais, numa recuperação cíclica que logo se mostraria não sustentável, tanto que exigiu medidas restritivas no ano seguinte, provocando uma parada súbita da atividade econômica no segundo semestre de 2011. O erro em 2010 foi a não retirada tempestiva dos estímulos adotados (a maioria deles corretamente) em resposta à crise que se seguiu à quebra da Lehman Brothers em setembro de 2008. Aparentemente, naquele momento, falaram mais alto os objetivos eleitorais do governo.
Como temos insistido, o crescimento econômico deve ser sustentável, com a menor volatilidade possível. Os ciclos econômicos são uma realidade da vida, mas cabe à política econômica suavizá-los e não acentuar seus vales e picos com ações do tipo "stop-and-go" que acabam prejudicando o desempenho da economia no longo prazo. Houvesse a economia brasileira crescido menos em 2010, provavelmente não teria sido necessária a parada súbita de 2011 e nem teria a inflação se acelerado para 6,5% naquele ano.
A sustentabilidade do crescimento econômico, por sua vez, exige políticas públicas que vão muito além das medidas de estímulo da demanda agregada. Ao contrário, o que importa mesmo é o crescimento da oferta agregada que depende basicamente do estoque de capital físico e humano, assim como da produtividade dos fatores de produção. Vale ressaltar que muito embora as decisões de investimento sejam influenciadas pelas expectativas em relação à demanda futura, esse canal somente funciona quando os empresários acreditam na sustentabilidade do crescimento, pouco adiantando medidas de estímulo de efeitos efêmeros.
A expansão da capacidade de oferta exige a presença de instituições favoráveis ao funcionamento de uma economia de mercado, entre as quais se destacam o bom ambiente regulatório e a segurança jurídica. Ademais, a estabilidade macroeconômica é fundamental, o que deveria afastar qualquer tipo de tolerância com a inflação, ainda que esta se situe em níveis moderados. Além disso, são necessárias medidas persistentes que elevem o crescimento da produtividade ao longo do tempo, notadamente políticas educacionais que melhorem a qualidade do ensino e aumentem o foco nas carreiras associadas ao conhecimento científico e tecnológico. Por sua vez, num país como o Brasil, que exibe uma baixa taxa de poupança e de investimento, torna-se indispensável aumentar a poupança do governo, por meio da redução da proporção entre as despesas correntes e o PIB, o que somente ocorrerá com políticas de longo prazo orientadas a este objetivo.
Dessa maneira, as desonerações tributárias temporárias, o aumento da oferta de crédito barato via BNDES e outros bancos públicos, a expansão dos gastos do governo, no contexto de um processo longo de afrouxamento monetário pelo Banco Central, são ações que elevam o crescimento do PIB no curtíssimo prazo, mas podem se mostrar contraproducentes quanto à elevação do PIB potencial do país, notadamente se delas decorrerem maiores incertezas dos agentes econômicos em relação ao ambiente macroeconômico futuro.
Mais positivas para as perspectivas de crescimento do Brasil foram as medidas anunciadas pelo governo na semana anterior, com relação a concessões e parcerias público-privadas no setor de transportes. O anúncio de outras iniciativas dessa natureza foi prometido, o que indica que o governo despertou para a necessidade de cuidar do crescimento do investimento nos próximos anos. Se tais medidas vingarem, o estímulo para o crescimento do PIB virá nos próximos anos, sem a necessidade de estímulos artificiais ao consumo.
Por tudo isso, o momento exige prudência e paciência do governo no que diz respeito à gestão da política econômica. As medidas já adotadas são mais do que suficientes para fazer o PIB voltar a crescer em linha com o seu potencial e quaisquer abusos podem ser contraproducentes, acelerando a inflação para patamares elevados e exigindo, em futuro muito próximo, a aplicação de freios monetários e creditícios semelhantes ao ocorrido no primeiro semestre do ano passado.
Gustavo Loyola, doutor em economia pela EPGE/FGV, foi presidente do Banco Central e é sócio-diretor da Tendências Consultoria Integrada, em São Paulo.
FONTE: VALOR ECONÔMICO
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