A possibilidade de a Câmara dar abrigo a deputados condenados no mensalão para evitar prisões foi classificada ontem como “uma violação das mais graves à Constituição” pelo presidente do STF e relator do processo, Joaquim Barbosa. Mais cedo, o presidente da Câmara, Marco Maia (PT-RS), não descartou a hipótese de acolher os deputados condenados - como a Polícia Federal, que executa as prisões, não tem autorização para entrar no Parlamento, eles estariam “a salvo” da cadeia no fim de ano. Barbosa fez ainda outras críticas ao Legislativo, onde, para ele, há uma “tirania inconsequente, ignorante, sem noção, como se diz por aí”. Hoje Barbosa decidirá sobre o pedido do procurador-geral da República, Roberto Gurgel, para a prisão imediata dos condenados. Ele emitiu sinais contraditórios sobre qual posição vai adotar
Barbosa diz que abrigar condenados na Câmara é violação da Constituição
Choque de poderes. Presidente do Supremo reage a declarações de Marco Maia, que é contra cassarão de mandatos parlamentares pela Corte, e critica sistemas políticos que privilegiam o Legislativo ao afirmar que "não há tirania maior do que a do grande número"
Eduardo Bresciani
BRASÍLIA - A possibilidade de a Câmara dos Deputados dar abrigo a parlamentares condenados no processo do mensalão para evitar prisões foi classificada ontem como "uma violação das mais graves à Constituição" pelo presidente do Supremo Tribunal Federal e relator da ação, Joaquim Barbosa. A declaração foi dada após o presidente da Câmara, Marco Maia (PT-RS), dizer que não descarta a hipótese de acolher os deputados condenados, para protegê-los (leia abaixo).
Barbosa fez outras críticas ao Legislativo, no qual haveria a "tirania do grande número", uma "tirania inconsequente, ignorante, sem noção, como se diz por aí". O ministro afirmou que os ataques feitos às decisões do Supremo decorrem de falta de com-preensão do sistema jurídico e de "falta de leitura".
O presidente do STF afirmou que não cabe a uma "autoridade política" decidir sobre prisão. "A proposição de uma medida dessa natureza, de acolher condenados pela Justiça no plenário de uma das Casas do Congresso, é uma violação das mais graves à Constituição brasileira."
Desde que o Supremo decidiu pela perda de mandato dos deputados condenados no processo, Judiciário e Legislativo trocam rusgas pela imprensa. As divergências se agravaram após liminar do ministro Luiz Fux impedir a derrubada do veto presidencial na lei dos royalties do petróleo antes de outros 3 mil vetos serem apreciados pelo Congresso.
Para rebater outra declaração de Maia - a de que é o Congresso quem nomeia e cassa ministros do STF -, Barbosa classificou-a como fruto de "desconhecimento puro das instituições". Disse que jamais poderia se cogitar cri¬me de responsabilidade - hipótese em que o mandato pode ser retirado - quando um ministro do STF cumpre sua função.
Barbosa observou que a República brasileira é constituída pela separação de poderes e defendeu o sistema como melhor do que um modelo que privilegiasse o Legislativo. "Não há tirania maior do que a do grande número, e essa tirania do grande número, em geral, se estabelece no Par- " lamento, uma tirania inconsequente, ignorante, sem noção, como se diz por aí."
Prerrogativas» O ministro refutou acusações de que o STF tenha tomado prerrogativas do Legislativo. "As pessoas são eleitas para gozarem de privilégios que não são extensivos ao cidadão comum? Inclusive privilégios de natureza penal, privilégios consistentes em atacar o patrimônio público e violar de maneira grave todo sistema de normas do país. Será que a Constituição confere esse tipo de privilégio?", questionou. "Isso é falta de compreensão do nosso sistema jurídico constitucional, falta de leitura, de conhecimento do próprio País, da Constituição do País."
Barbosa confirmou que vai ser o responsável pela execução penal do processo do mensalão, definindo onde os condenados pa¬garão suas penas.
O presidente do STF afirmou que cada ministro tem de estar preparado para a repercussão das decisões que toma e disse estar "lisonjeado" com pesquisas de intenção devoto para a Presidência da República que apontam até 10% para seu nome. "Mas isso, evidentemente, não muda em nada aquilo que sempre fui, um ser absolutamente alheio a partidos políticos", disse. Questionado sobre as críticas de condenados a sua atuação, foi irônico: "Não discuto com réus meus", afirmou, encerrando a entrevista.
Fonte: O Estado de S. Paulo
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