O presidente do Supremo promete: apesar de ser uma “situação nova ” para o tribunal, dirá se efetivará a detenção dos condenados no processo do mensalão. Mas emitiu sinais controversos quanto a essa necessidade
A resposta de Barbosa
Presidente do STF decide hoje se acata o pedido da Procuradoria Geral da República de prender imediatamente os condenados no mensalão
Diego Abreu
Quatro dias depois de encerrado o maior julgamento da história do país, o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Joaquim Barbosa, decidirá hoje se manda para a cadeia imediatamente os condenados no processo do mensalão. Na véspera da esperada decisão, o comandante da Suprema Corte emitiu sinais controversos quanto à necessidade de se efetivar as detenções de forma antecipada. Ele afirmou que o pedido de prisão dos réus é uma “situação nova”, diferente de todos os que o STF já analisou.
Em entrevista coletiva concedida ontem, Barbosa negou que haja jurisprudência do Supremo no sentido de que as prisões só possam ser efetivadas após o trânsito em julgado do processo — ou seja, quando não houver mais possibilidade de recursos. O ministro observou que a situação é inédita, pois, segundo ele, os casos semelhantes já apreciados pelo STF se referiam a ações originárias de outros tribunais, diferentemente do mensalão, cuja origem é o próprio Supremo.
O presidente do STF, porém, deu sinais de que não há urgência para a prisão, ao enfatizar que, a partir do recolhimento dos passaportes, o risco de fuga dos réus diminuiu sensivelmente. Barbosa, no entanto, poderá decidir pela detenção dos réus com base no entendimento de que é possível antecipar a execução das penas. Ele lembrou ontem que, no início da instrução do processo, indeferiu um pedido de prisão dos denunciados, mas frisou que o momento agora é outro. As declarações não foram conclusivas para apontar o que o ministro decidirá hoje. Há um precedente, porém, que favorece os réus: os dois deputados condenados pelo STF a penas de prisão — Asdrubal Bentes (PMDB-PA) e Natan Donadon (PMDB-RO) — permanecem em liberdade.
Questionado sobre o pedido de prisão apresentado na noite de quarta-feira pelo procurador-geral da República, Roberto Gurgel, o presidente do Supremo preferiu não adiantar o teor da petição. Limitou-se a dizer que tomará uma decisão hoje. “Não vou antecipar nada. Amanhã (hoje), vocês terão conhecimento do teor da minha decisão que deve ser breve.”
A Procuradoria Geral da República e o STF não souberam informar se o pedido de Gurgel abrange apenas os 11 réus condenados ao regime fechado, como o ex-ministro da Casa Civil José Dirceu e o empresário Marcos Valério, ou se também se estende a outros 11 que cumprirão o semiaberto.
Críticas
Joaquim Barbosa respondeu às críticas do presidente da Câmara, Marco Maia (PT-SP), que classificou de “ingerência” do STF a decisão pela perda dos mandatos dos três deputados condenados no julgamento do mensalão. Ao comentar a declaração do petista de que se houver prisão imediata dos réus ele poderá abrir os portões da Câmara para impedir as detenções (leia matéria abaixo), Barbosa foi enfático. “A proposição de uma medida dessa natureza, acolher condenados pela Justiça no plenário de uma das casas do Congresso, é uma violação das mais graves à Constituição brasileira”, frisou.
Barbosa afirmou que falta compreensão aos congressistas sobre a Constituição. “É falta de compreensão do nosso sistema jurídico constitucional. É falta de leitura. De conhecimento do próprio país, da Constituição. É não compreender o funcionamento regular da instituição federal”, afirmou o presidente do STF.
“Condenar pessoas que tenham cometido crimes de corrupção ativa, corrupção passiva, peculato e lavagem de dinheiro, e tirar as consequências dessa condenação é ingerência no Poder Legislativo? As pessoas são eleitas para gozarem de privilégios que não são extensíveis ao cidadão comum?”, questionou o ministro, que disse acreditar que “Marco Maia não será a autoridade do Legislativo que terá a incumbência de dar cumprimento à decisão do Supremo”, pois o mandato do petista termina em fevereiro.
O ministro reiterou que é “dever” do Ministério Público investigar as declarações feitas por Marcos Valério, em depoimento prestado em setembro, no qual afirmou que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva recebeu dinheiro do mensalão para pagar despesas pessoais.
O presidente da Suprema Corte comentou diversos outros assuntos durante a entrevista (veja quadro). Ele disse ser contra a atuação de parentes de juiz como advogados de causas no tribunal onde trabalha o magistrado. “Filhos, esposas e sobrinhos de juízes são muito acionados pelos seus clientes pelo fato de serem parentes, não é pela qualidade técnica de seu trabalho”, disse. “O Brasil é o país dos privilégios. Nós todos sabemos (...) Parece um direito constitucional o privilégio”, completou.
Barbosa mostrou-se contra a promoção de juízes pelo critério do merecimento. “Juiz tem que ser livre. Em geral, são promovidos os mais espertos, os que fazem mais políticas, que socorrem às associações”, criticou. O ministro não quis comentar as críticas de condenados no mensalão sobre a sua atuação no julgamento. “Eu não discuto com réus meus.”
Ponto a ponto
Veja a opinião do presidente do STF, Joaquim Barbosa, sobre temas polêmicos tratados na entrevista de ontem
Prisão dos réus do mensalão
Joaquim Barbosa emitiu sinais contraditórios sobre se decretará ou não a prisão imediata dos réus. Ele observou que já negou pedido semelhante quando o processo chegou ao STF e que o risco de fuga diminuiu depois da apreensão dos passaportes. No entanto, afirmou que as decisões do Supremo que proibiram prisões antes do trânsito em julgado de ações tratavam de casos com origem em outros tribunais, e não no STF. O pedido apresentado pelo procurador-geral da República na quarta-feira, segundo ele, é uma “situação nova”.
Abrigo na Câmara
O ministro comentou que não há possibilidade, na eventualidade da prisão dos réus, de a Câmara dar abrigo aos três deputados federais condenados no julgamento do mensalão. Segundo ele, quem escolhe onde o preso será detido é o juiz, e não a autoridade política.
Promoção de juízes
Barbosa disse que os juízes têm que ser livres e independentes. Ele é contrário à promoção de juízes a cargo de desembargador pelo critério do merecimento. Segundo ele, em geral, há “politicagem” e acabam sendo promovidos os mais espertos e aqueles que fazem política nas associações de magistrados.
Parentes de juízes
O ministro frisou ser “visceralmente contra” a possibilidade de parentes de juiz advogarem em processos que tramitam no tribunal onde atua o magistrado. Ele avalia que esses advogados são contratados não por suas qualidades técnicas, mas por serem parentes. Ao comentar a questão, Barbosa disse que “o Brasil é o país dos privilégios”.
Pretensões políticas
O presidente do STF afirmou que jamais pensou em se candidatar ao cargo de presidente da República. Ele comentou a recente pesquisa Datafolha na qual apareceu com 9% das intenções de voto, e disse ter ficado “evidentemente lisonjeado”.
Fonte: Correio Braziliense
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