Quando quase todos os governadores do país estavam no Congresso Nacional, reunidos com os presidentes do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), e da Câmara dos Deputados, Henrique Alves (PMDB-RN), para discutir o pacto federativo, Sérgio Cabral (PMDB) permanecia no Rio de Janeiro e Renato Casagrande (PSB), do Espírito Santo, estava em Brasília, mas em outros compromissos.
Governadores dos dois maiores Estados confrontantes com áreas petrolíferas (também chamados de produtores), Cabral e Casagrande combinaram não participar do encontro convocado por Renan e Alves. Foi em protesto à derrubada, pelo Congresso Nacional, do veto da presidente Dilma Rousseff à redistribuição da renda petrolífera - royalties mais participações especiais (PE) -, uma semana antes.
Os dois avaliam que, numa sessão comandada "com mãos de ferro" por Renan, deputados e senadores dos Estados não produtores atropelaram os direitos do Rio e do Espírito Santo e romperam o pacto federativo. Os dois Estados terão grandes perdas com a lei que entrará em vigor a partir da derrubada do veto.
Antecipação eleitoral dificulta acordos por royalty
Pelo menos no momento, a relação institucional entre os dois Estados e o Congresso ficou trincada. Cabral e Casagrande acham positiva a discussão em conjunto do pacto federativo, mas avaliam que, realizada neste momento, a reunião parece jogo de cena, para compensar a "truculência" praticada na semana anterior.
Os governos dos dois Estados, assim como o de São Paulo, aguardam a promulgação da lei - restabelecendo os dispositivos vetados - para apresentar ações diretas de inconstitucionalidade (Adin) independentes no Supremo Tribunal Federal (STF) contestando a constitucionalidade da mudança da distribuição dos recursos resultantes da exploração dos campos já licitados, portanto receita incluída nos seus orçamentos.
Nenhum dos lados, confrontantes e demais, tem segurança de vitória no STF. Há argumentos a favor e contra. Mas, qualquer que seja a decisão do tribunal, se a solução definitiva ficar mesmo com o Judiciário, será mais uma derrota da política. Está formado no país consenso em relação à necessidade de distribuir de forma mais equilibrada a renda do petróleo, até porque alguns dos maiores municípios beneficiados não mostram investimentos que justifiquem os ganhos. Mas há dúvidas quanto à redução dos percentuais atuais dos confrontantes, que já contam com os recursos para cumprir compromissos assumidos.
Para a Petrobras e o Ministério de Minas e Energia, a preocupação é outra: o receio com a criação de taxas de fiscalização pelos Estados confrontantes, cobradas de empresas pela exploração do petróleo, que poderia gerar insegurança jurídica e desestimular investimentos. O governo acompanha com preocupação a movimentação da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj) para aprovar projeto de lei instituindo taxa de R$ 9 sobre o barril de petróleo produzido no Estado. A Alerj retirou temporariamente da pauta, mas a ameaça permanece.
Na Assembleia do Espírito Santo também tramita um projeto para criar taxa de fiscalização ambiental de 2% do barril do petróleo a ser paga pelas empresas. Se for cobrada, renderá ao Estado cerca de R$ 504 milhões por ano (a perda com a mudança na regra dos royalties, no primeiro ano, será de R$ 350 milhões para o Estado e R$ 450 milhões para os municípios).
O governador capixaba diz que a criação da taxa não depende dele, mas alerta, com certa ironia: "Do mesmo jeito que o Congresso foi desequilibrado [na derrubada do veto], a Assembleia poderá também se desequilibrar. E pode acontecer de a Assembleia aprovar, eu vetar e a Assembleia derrubar o veto."
A iniciativa do governador de Pernambuco, Eduardo Campos (PE), presidente e presidenciável do PSB, de propor nova tentativa de acordo político em torno da distribuição da renda petrolífera esbarra em vários obstáculos, entre eles a resistência da presidente Dilma Rousseff, a quem no momento não interessa encher a bola de um dos seus potenciais adversários em 2014.
Para petistas, Campos está querendo fazer campanha eleitoral com dinheiro da Dilma. Ainda assim, a iniciativa demonstra uma coisa: o lado vencedor na derrubada dos vetos querendo negociar.. Qualquer caminho deve passar pela medida provisória editada por Dilma depois de vetar o projeto dos royalties.
A MP trata da distribuição da receita dos contratos de concessão a serem licitados depois da edição da medida (dezembro de 2012) e destina para a educação a receita reservada a Estados e municípios, arrecadada com esses contratos futuros. O relator, deputado Carlos Zarattini (PT-SP), está sendo procurado pelos dois lados e acredita em entendimento.
O maior obstáculo, apontado por governo federal, governadores de Estados não produtores e até parlamentares do Rio e do Espírito Santo é o comportamento "passional", "radical" e "intransigente" de Cabral.
Desde o início da discussão do marco regulatório da exploração do pré-sal, ele se negou a aceitar qualquer mudança no critério de distribuição do recurso que seria arrecadado no futuro, pelo modelo de partilha de produção (pré-sal e áreas consideradas estratégicas). Chorou em público, citou valores estratosféricos que o Rio perderia e acusou os demais Estados de roubar o Rio.
A reação foi tão forte que uniu ainda mais os não produtores, acirrou a cobiça sobre a arrecadação com contratos já licitados, agravou o conflito federativo e gerou má vontade no Congresso contra o Rio. "Para aparecer como herói, Cabral está levando o Estado para o buraco", avalia um aliado.
A antecipação eleitoral contamina o cenário político e move todos os protagonistas. O Congresso pode ter perdido o timing da discussão do pacto federativo.
Fonte: Valor Econômico
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