Marco Antonio Villa - Historiador e autor de A História das Constituições Brasileiras
Autor do livro A História das Constituições Brasileiras, Marco Antonio Villa mergulhou na confecção das leis para comprovar que o excesso de normas é uma tradição nacional.
– Esse detalhismo faz mal ao país – destaca o pesquisador, professor da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), em conversa com Zero Hora.
Zero Hora – O Congresso criou uma comissão para regulamentar dispositivos da Constituição de 1988. Por que, 25 anos depois, ainda há o que regulamentar?
Marco Villa – Você coloca no artigo uma vírgula indicando a regulamentação em outra lei, e acaba ficando em aberto aquele direito. A Constituição é extensa e inchada, o que, somado à morosidade do Congresso, não regulamenta muitos direitos. É uma prática bem brasileira.
ZH – Regulamentações pendentes não são exclusividade da atual Constituição?
Villa – A Constituição de 1946 tinha o direito de greve, que nunca foi regulamentado. Chegou 1964, e a Constituição de 1967 suprimiu esse direito, que nunca foi exercido.
ZH – Que problemas um texto tão longo apresenta?
Villa – Quando a Constituição é extensa e detalhista, ela fica conjuntural, se transforma num programa político partidário marcado pelo tempo. O mundo mudou depois da queda do Muro de Berlim, o que deixou uma série de disposições da Constituição sem serventia. O ideal é um texto mais enxuto e genérico, como o norte-americano.
ZH – E qual é o impacto desta tradição detalhista que marca o país?
Villa – Queremos legislar tudo no Brasil. Achamos que a forma de resolver o problema não é resolvê-lo, mas criar uma lei. Se o Congresso mal consegue legislar sobre o hoje, dificilmente vai conseguir regulamentar os dispositivos constitucionais que aguardam na fila. O Congresso vive de correr atrás das medidas provisórias.
ZH – É visível a demora na reforma dos códigos. O Código Civil, de 2002, tramitou por 27 anos no Congresso. Quando aprovados, estes códigos já não estão defasados?
Villa – É outra tradição brasileira. O Código Civil anterior, de 1916, era para ter sido aprovado em 1902, conforme os planos do presidente Campos Sales. Tudo é muito lento, estamos sempre em ritmo de tartaruga, não há seriedade no trato das questões legais.
ZH – O PSD defende a convocação de uma nova constituinte. O senhor concorda?
Villa – Não é prioridade e pode piorar a Constituição, inclusive sobre os direitos individuais e a liberdade de imprensa. Iria retirar direitos e dificilmente enxugaria o texto.
ZH – Qual seria a solução?
Villa – Fazer funcionar o texto de 1988. A autonomia do Ministério Público é fundamental, o pleno funcionamento dos poderes também. A Constituição tem defeitos, mas na parte das liberdades, em um país de tradição autoritária, é muito importante. Falar em revisão é fazer um serviço para os setores mais autoritários. É um perigo.
Fonte: Zero Hora (RS)
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