No mês em que a Constituição brasileira completa 25 anos e alguns agentes políticos têm falado em uma revisão completa do texto, estudo do Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP) contesta a tese de que a reformulação do documento seja necessária. Ao revisitar todos os passos que levaram à elaboração da Carta Magna, o IDP constatou que o processo foi complexo o suficiente para torná-la adequada aos tempos atuais. A pesquisa, produzida por 70 alunos do instituto, analisou os bastidores da Assembleia Constituinte e o contexto histórico em que as mudanças estavam inseridas. Além de recuperar diálogos da época, o grupo também ouviu personagens que tiveram papel decisivo no processo, como os ex-presidentes da República José Sarney, hoje senador pelo PMDB-AP, que comandava o país no período, e Fernando Henrique Cardoso (PSDB), que integrou a assembleia.
Da mensagem de convocação da Assembleia Constituinte, em maio de 1985, até a data em que a sétima Constituição brasileira foi promulgada, em 5 de outubro de 1988, foram três anos e cinco meses de muita discussão, desacertos e embates entre pessoas com os mais distintos pensamentos e interesses. Na opinião dos pesquisadores, foi justamente por isso que a Carta Magna se tornou tão genuína. "Ela ganhou legitimidade pela quantidade de gente que se envolveu no processo, com intenções e entendimentos tão diferentes, pela participação popular, por haver uma multiplicidade de partidos bem representados e, por isso, conseguiu dar respostas a inúmeras crises. Hoje, está ainda mais forte", conclui o professor do IDP Rodrigo Mudrovitsch, que coordenou o grupo de pesquisa, ao lado do também professor Rodrigo Kaufmann e do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes.
Durante quase dois anos, os pesquisadores do instituto reviraram o baú de um Brasil recém-saído do regime militar e que precisava se afirmar como democracia. Ao observar os fatores históricos que levaram à redação da Constituição desde os anos 1960, quando os militares tomaram o poder, o grupo esbarrou em diversos questionamentos feitos já no início das tratativas sobre o novo arcabouço legal brasileiro. Na época, questionou-se, por exemplo, a forma como o grupo que redigiu a Carta Magna foi escolhido — deputados e senadores recém-eleitos acabaram ganhando a tarefa de refazer a lei maior brasileira sem terem sido escolhidos oficialmente para isso. Houve críticas também sobre a chamada comissão de notáveis, grupo que criou o texto básico que subsidiou a versão final, e sobre a pressão de empresas e entidades em trechos da lei.
Impasses
Para Rodrigo Mudrovitsch, esses impasses deram a complexidade necessária para a Constituição. "A própria sensação de liberdade que havia por se saber que ninguém poderia vetar o texto depois de pronto levou a certa prolixidade, mas, no fundo, todo mundo queria participar daquele momento. Todos os lados tiveram uma importância enorme no processo, conseguindo encontrar soluções intermediárias", comenta. "Por tudo isso, representa um produto plenamente capaz de atender às demandas atuais do nosso país."
O pesquisador do IDP ainda rebate críticas atuais à Constituição — que, ao longo de 25 anos, já foi modificada 80 vezes por 74 emendas aprovadas no Congresso. "Não é a Carta Magna que precisa ser revista, mas a forma de gestão no país, para que as leis sejam, de fato, cumpridas", argumenta. "Constituições duradouras revelam democracias estabelecidas." Após mergulhar na história da lei maior brasileira, Mudrovitsch lança um desafio para os próximos 25 anos: "Ganhar as novas gerações, que já nasceram com as regras instituídas e que precisam ter uma maior consciência do que é ser cidadão".
"Não é a Carta Magna que precisa ser revista, mas a forma de gestão no país, para que as leis sejam, de fato, cumpridas"
Rodrigo Mudrovitsch, professor do Instituto Brasiliense de Direito Público
80
Quantidade de modificações feitas na atual Constituição, em um total de 74 emendas
Fonte: Correio Braziliense
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