A indefinição de Marina Silva apenas reforçou a imagem de pouca praticidade da senadora, já revelada na dificuldade de contabilizar assinaturas para criar a Rede Sustentabilidade. Ao manter um mistério por quase 48 horas sobre os rumos, a ex-ministra passou a sensação de vacilo, que em outros políticos poderia ser definido como barganha. Agora, por mais que Marina desista hoje da candidatura — algo improvável e descartado por todos os aliados — terá escancarado de qualquer forma a vontade de entrar na corrida presidencial por um partido ordinário, igual a todos os outros.
Mas, para a sorte de Marina, apenas o vacilo demonstrado ontem — e o próprio discurso enviesado — é que pode atrapalhá-la na corrida presidencial. Na prática, disputar por outro, e não pela Rede, deve fazer pouca ou nenhuma diferença ao eleitor brasileiro, mais atento aos personagens do que às próprias legendas. Isso não quer dizer que Marina tem garantido o capital de quase 20 milhões de votos conquistados na última eleição, mas definitivamente não será o nome do partido o que poderá atrapalhá-la. E, sim, ela mesma, com uma retórica entre a defesa do meio ambiente e o conservadorismo, que pode ficar mais evidente na campanha do próximo ano. Parte do eleitorado da ex-ministra se identifica com o discurso verde, mas defende a descriminalização da maconha ou a legalização do aborto nos primeiros meses de gestação, ou até mesmo o casamento igualitário — ou os três ao mesmo tempo.
No mais, Marina tem toda a legitimidade para disputar por uma legenda, independentemente da cor partidária ou ideológica. Aliás, ela joga dentro das regras, como quando tentou oficializar a Rede e perdeu. Explico. Acusar Marina de jogar no lixo toda uma história política por se candidatar a um partido que não a Rede é coisa de adversário receoso do estrago que a ex-ministra pode fazer na campanha, principalmente os petistas. Sem conseguir confirmar a legenda, Marina, dentro do prazo, regularmente, deverá confirmar a candidatura. E embolar uma campanha.
Lula e os médicos
Depois de uma semana da entrevista do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva a este Correio, um ponto ficou de fora do debate, talvez o mais representativo sobre políticas públicas: o financiamento da saúde. Ao falar do programa Mais Médicos, o petista disse: "É uma coisa fantástica, mas vai fazer com que o povo fique ainda mais exigente com a saúde", afirmou Lula. Aqui, a primeira observação. O ex-presidente elogia o programa, mas faz ressalvas — não pode ser comparado a um torcedor irracional. "O sujeito vai subir o primeiro degrau. Vai ter um médico que vai lhe pedir os primeiros exames, e a saúde vai ser problema outra vez." Lula puxa o mote para o que queria discutir de verdade, o fim da CPMF.
O assunto da saúde — ao contrário de outras e várias respostas do petista que foram comentadas por adversários e aliados — ficou restrito às páginas do Correio, como se o debate levantado por Lula não valesse ou mesmo fosse um assunto proibido. "Discutir saúde sem discutir dinheiro, não acredito. E não adianta dizer, como fazem os hipócritas, que o problema é só de gestão. Chamem os 10 melhores gestores do planeta e perguntem como oferecer tomografia, ressonância ou tratamento contra o câncer sem dinheiro", continuou Lula. "O hipócrita diz: "Eu pago caro por um plano de saúde, porque o SUS não me atende". Mas quando ele vai fazer a declaração de renda, desconta tudo do imposto a pagar. Então quem paga a alta complexidade para ele é o povo. E aí vem a Fiesp fazer campanha para acabar com a CPMF. Não foi para reduzir custos, mas para tirar do governo o instrumento de combate à sonegação."
De uma só tacada, o ex-presidente foi mais realista sobre o Mais Médicos — ao contrário do que prega a maioria dos governistas, que incensam a iniciativa como a grande marca de Dilma —, reclamou do fim da contribuição para a saúde, atacou "hipócritas" e foi para cima dos empresários. O tema, entretanto, foi ignorado por todos que resolveram repercutir a entrevista, do governo à oposição.
O Solidariedade
Estão mais do que claras as denúncias de irregularidades cometidas na formação do Solidariedade, o partido de Paulinho da Força, o homem dos incríveis 38.750 votos (0,63%) nas últimas eleições para a prefeitura de São Paulo. Depois dos servidores do Senado que descobriram os próprios nomes em listas que nunca assinaram, o repórter João Valadares, deste Correio, revelou que o partido tentou passar um morto, o ex-servidor José Washington Chaves, no rol de apoio para criação da legenda. A ficha foi registrada no cartório da Asa Norte, em Brasília. Falta algo mais para uma investigação minuciosa?
Fonte: Correio Braziliense
Nenhum comentário:
Postar um comentário