Dilma tem ganas de poder. Pretende se reeleger e trabalha para isso. O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva sabe disso. Não pode correr o risco de encarnar o papel de Jasão e reeditar a mítica tragédia grega
- Correio Braziliense
A história de Medeia é um clássico da mitologia grega, consagrado na tragédia de Eurípedes, cuja primeira encenação ocorreu em 431 a.C., no começo da Guerra do Peloponeso. É um retrato dramático das forças antagônicas que governam a alma humana. Medeia, a personagem principal, luta com todas as forças e todas as armas contra adversidades da sua vida. Na obra de Eurípedes, Jasão e Medeia, como refugiados, vivem em Corinto com seus dois filhos. O rei Creonte convence Jasão a abandoná-la e se casar com sua filha; para tanto, expulsa Medeia e os dois filhos da cidade. Egeu, rei de Atenas, concede asilo a Medeia, mas a feiticeira decide se vingar de Jasão. Primeiro, através de um ardil, mata Creonte e a filha dele; a seguir, mata os próprios filhos e foge num carro alado, cedido pelo deus Hélio, seu avô.
O mito de Medeia apresenta o retrato psicológico de uma mulher simultaneamente tomada pelo amor e pelo ódio. Ela é a esposa abandonada, a estrangeira perseguida. Rebela-se contra o mundo que a rodeia e rejeita o conformismo tradicional. Tomada de fúria, assume a vingança como objetivo e exerce seu poder de persuasão, usa as palavras como armas terríveis. Uma das figuras femininas mais impressionantes da dramaturgia universal, Medeia narra o drama da mulher que deixa tudo — sua pátria, sua família e seus sonhos — para seguir ao lado de um grande amor. Foi capaz de qualquer atitude para atender os caprichos de Jasão, mas acaba abandonada.
Medeia de Eurípedes foi filmada pelo italiano Pier Paolo Pasolini e pelo dinamarquês Lars Von Trier. Inspira a feiticeira de Capitão Marvel, história em quadrinhos do genial roteirista Bill Parker e do desenhista CC Becker. Também é Joana, a personagem central do musical A gota d’água, de Chico Buarque e Paulo Pontes, escrita em 1975, a partir de um roteiro de Oduvaldo Viana Filho, que adaptara a peça para a televisão. Na obra, a tragédia se desenrola numa favela carioca.
Jasão
O mito de Medeia tem tudo a ver com os riscos do “Volta, Lula!”. A possibilidade de o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva substituir Dilma Rousseff como candidata do PT, a cada dia que passa, deixa de ser apenas um desejo de petistas e empresários, contrariados por terem sido excluídos da cozinha do Palácio do Planalto, para se tornar uma possibilidade real, diante da má avaliação do governo e da gradativa queda da presidente nas pesquisas. Cada vez que Lula intensifica sua agenda para fortalecer os petistas nos estados e mete a colher na campanha de reeleição de Dilma, mais forte se torna o desejo de que seja ele o candidato por parte de aliados e eleitores.
Dilma, porém, tem ganas de poder. Pretende mesmo se reeleger e trabalha intensamente para isso. Lula sabe disso. Não pode correr o risco de encarnar o papel de Jasão e reeditar a mítica tragédia grega, com Dilma no papel de Medeia, a mulher abandonada, disposta a se vingar da traição. É inimaginável uma disputa eleitoral com Lula candidato e Dilma contrariada na Presidência, com a caneta cheia de tinta e a alma tomada pela frustração e pelo ódio. As contradições que isso despertaria, entretanto, podem ser avaliadas a partir de episódios, como a compra da Refinaria de Pasadena, nos Estados Unidos, pela Petrobras, que opõem Dilma e a presidente da Petrobras, Maria das Graças Foster, de um lado, e Lula e o ex-presidente da empresa Sérgio Gabrielli, de outro; ou o caso de Rosemary Névoas Noronha, ex-chefe de gabinete da Presidência em São Paulo e assessora de confiança de Lula, defenestrada por Dilma logo no começo de seu mandato.
Têm razão, pois, os que trabalham para manter a candidatura de Dilma colada à imagem de Lula, na esperança de que essa unidade mantenha o favoritismo da presidente da República nas eleições deste ano. Por causa do desempenho do governo, é cada vez maior a possibilidade de a disputa contra o senador Aécio Neves (PSDB-MG) e o ex-governador de Pernambuco Eduardo Campos (PSB-PE) ir para o segundo turno. É aí que o “Volta, Lula!” pode despertar as forças poderosas do Monte Olimpo, mas só há uma hipótese de remover Dilma da disputa pela reeleição com sucesso — se ela própria matar sua candidatura.
Nenhum comentário:
Postar um comentário