Salvação é que o governo é grande e a sociedade, desorganizada
O Tempo (MG)
Em fevereiro de 2013, escrevi um texto para a imprensa com o título “Fracasso assintomático” (“Brasil Econômico”, 26.2.2013). A tese central do artigo era a de que o governo fracassava, ainda que os sintomas, à época, não fossem sentidos de forma clara.
A prova era a imensa popularidade da presidente Dilma Rousseff (PT), que estava em alta. Em março daquele ano, ela chegou ao seu ponto mais alto, com 63% de avaliação ótimo/bom (pesquisa Ibope de março/2013). De lá para cá, começou a descer a ladeira.
No entanto, mesmo reconhecendo a situação, afirmei então que o “imenso favoritismo de Dilma Rousseff para 2014” se encontrava “em xeque”. Minha afirmação, que se revelou precisa à luz dos números de março deste ano, partia de uma cuidadosa avaliação de quatro dimensões relevantes: econômica, gerencial, social e política. E de como elas se relacionavam com a campanha de Dilma para a reeleição.
Dizia, ainda, que o maior adversário dela era “o seu próprio governo e estilo de gestão. E a incapacidade de transformar sucesso econômico e popularidade em poder político”. Pois bem, um ano depois, o vaticínio se mostra atualizado. E, pior para ela, o que era assintomático se transformou em uma pletora de sintomas. O sucesso econômico já não é reconhecido, e a sua popularidade está em baixa.
Naquele tempo, o ambiente econômico, apesar de o tomate ter causado estragos na inflação do ano passado, não contaminava as expectativas da população. Apenas o mercado (mais) e o empresariado (menos) estavam desencantados com o Planalto. Hoje, temos um majoritário sentimento de desapreço e desconfiança do mercado e do empresariado.
Em outro texto (“A crise de confiança que ameaça as relações com o setor privado”, O TEMPO, 27.3.2013), apontei a grave crise de credibilidade que se avizinhava. Dizia: “O governo vem enfrentando uma séria ameaça de crise de confiança junto ao setor privado. A ameaça está evidente no aumento das críticas feitas ao comportamento do governo em suas iniciativas, bem como na incapacidade de fazer a economia funcionar com mais vigor e, ainda, com a possibilidade de a inflação subir ainda mais. É tudo o que o governo não gostaria de enfrentar no início do processo eleitoral”.
Adiante, acrescentava que os “governos devem gerenciar as expectativas”. De lá para cá, o Executivo foi absolutamente ineficaz na gestão das expectativas. E, para piorar, parece não saber o que fazer. Está perdido e cada vez mais dependente do eleitorado, das políticas assistencialistas e do carisma de Lula. O que, no limite, é inacreditável em uma gestão que começou coberta de expectativas positivas.
Voltando ao texto de fevereiro de 2013, afirmei existir uma relação autoritária entre o governo e o Congresso que foi “mitigada nos governos FHC e Lula” e que tal fato tensionava “a relação com partidos” e prometia “emoções fortes em 2013 e 2014 na política”. Não precisava ser adivinho para prever que a inconsistência política do governo resultaria em confusões.
O atual governo fez, pelo menos, três “milagres”. Transformou Eduardo Cunha em um poderoso líder político, viabilizou a existência do Orçamento Impositivo e, ainda, despertou o Congresso da letargia em relação aos vetos presidenciais. Em breve, o Congresso vai mudar as regras de pagamento das dívidas dos Estados com a União. Outra proeza resultante do desgoverno político.
A salvação de Dilma é que o governo é muito grande e a sociedade, desorganizada. A oposição parece trabalhar “part time”. E a popularidade remanescente de Dilma ainda pode fazer a diferença a seu favor.
Cientista Político
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