Copiando o Código Penal de Rocco (1930, na ascensão do fascismo na Itália), os autores das leis de segurança nacional da ditadura militar ampliaram os tipos penais: a conspiração, que no direito brasileiro ganharia o nome de "formação de quadrilha ou bando", era o crime que se praticava contra o Estado, então reduzido a miserável ditadura. O que vem causando perplexidade e mal-estar é ver que tais conceitos fascistas estão, em parte, assimilados em pleno Estado de Direito, na vigência da mais avançada Constituição do mundo no que diz respeito aos direitos fundamentais. As "acusações" abusam do tipo penal "crime de quadrilha" para indiciar ou denunciar cidadãos quando não encontram para eles um efetivo tipo penal descrito nas leis.
O crime de quadrilha, abrigado no art. 288 do Código Penal na parte que trata dos "Crimes contra a paz pública", pune a associação "de mais de três pessoas, em quadrilha ou bando, para o fim de cometer crimes". Esse tipo penal é uma exceção à dogmática do Direito Penal se admite que um "ato preparatório" constitui-se em crime autônomo. Com tristeza, tenho verificado que, à falta de uma acusação específica, a polícia e o MP têm indiciado ou denunciado cidadãos que rigorosamente não praticaram concretamente qualquer delito punível. O trabalho dos advogados é tolhido pelo arbítrio da "justiça". Juízes decidem por induções e presunções e contaminam suas decisões por premissas "morais" e preconceituosas; a hipótese substitui os fatos e impede a ampla defesa.
Nesses dias, juiz de Direito decreta a prisão provisória por "eventos futuros que poderiam cometer cidadãos brasileiros" com base em "provas" sabidamente "fabricadas" pela polícia. A polícia que matou e escondeu o corpo do Amarildo e acaba de matar crianças, entre tantas e tantas barbaridades que sempre comete. Pois bem: desembargador anula o decreto de prisão provisória e o juiz volta, com as mesmas "provas" (desconsideradas pela instância superior), e decreta a prisão preventiva dos mesmos acusados, desafiando o Tribunal. Com isso, as "autoridades", para além de ferir direitos da cidadania, criam ambiente hostil ao governo do estado, ambiente que antes vitimou o então governador quando a polícia cruzou os braços incentivando a condenável violência de manifestantes mascarados, e agora atinge diretamente o postulante à reeleição, nominalmente chefe das polícias Civil e Militar, que talvez fujam ao seu controle.
Se este alerta que faço, no curso de uma cinquentenária militância na advocacia, objetiva defender princípios constitucionais que garantam todos os cidadãos, especialmente as vítimas da polícia, de promoções iníquas do Ministério Público estadual e decisões judiciais equivocadas, ele deverá alcançar o governador/candidato, ele também vítima dos reiterados desacertos e crimes da polícia que deveria comandar.
Marcello Cerqueira é advogado
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