Os comunistas brasileiros, desde 1964, têm exercido um importante papel na luta contra o regime autoritário então implantado em nosso país. Defendendo a mais ampla unidade das forças democráticas; combatendo frontalmente as tendências sectárias e militaristas existentes em seu meio e fora dele; pregando uma política de massas que respeitasse o pluralismo real da sociedade brasileira, os comunistas criaram um patrimônio de idéias que é hoje compartilhado por movimentos sociais e políticos de diferente extração.
O reconhecimento desse patrimônio, porém, não se deu sem dificuldades entre os próprios comunistas. Embora a questão democrática lhes tenha surgido com maior clareza no período do autoritarismo, a situação de clandestinidade e a repressão que sobre eles se abateu permitiram que o peso do passado stalinista – com todas as suas seqüelas golpistas e mandonistas – coexistisse com os elementos de renovação e inibisse seu pleno florescimento.
Essa contradição – que tardou a se tornar evidente para o conjunto dos comunistas – não pode ser mais ocultada, e muito menos abafada, no momento em que, com o avanço do processo de abertura, estabeleceu-se uma nova dinâmica na política do país. Em tal contexto, as velhas práticas burocráticas revelaram-se incapazes de dar curso tanto à renovação do pensamento comunista quanto às novas necessidades impostas pela crescente complexidade da sociedade capitalista brasileira. Os imperativos do aprofundamento da política democrática dos comunistas entraram em choque com uma concepção anacrônica de organização partidária.
A necessária renovação da sociedade brasileira – e, em particular, o pleno êxito do processo de transição democrática – não podem prescindir dos comunistas e de sua nova política; uma política que se apóia na compreensão da estreita ligação entre democracia e socialismo.
A eventual maioria do auto-intitulado “Coletivo Nacional dos Dirigentes Comunistas”, por se revelar incapaz de aplicar e implementar essa nova política, vem se constituindo num obstáculo ao cabal exercício do papel que os comunistas poderiam desempenhar como uma das forças representativas do movimento popular e democrático brasileiro.
A mais recente comprovação dessa incapacidade reside na tentativa de resolver através de métodos administrativos – de cristalino caráter autoritário – as divergências políticas surgidas entre aquele Coletivo e a maioria dos dirigentes comunistas do Estado de São Paulo, que se manifestaram na questão da concepção da frente democrática, da política sindical e da política cultural. Tal comportamento coloca sob ameaça iminente não só a nova política democrática dos comunistas brasileiros, mas até mesmo a possibilidade da presença eficaz e organizada deles na vida política de nosso país.
Diante dessa situação, que compromete os elementos vivos do patrimônio acumulado em mais de seis décadas, os comunistas não podem se omitir. O chamado Coletivo Nacional dos Dirigentes Comunistas tornou-se ilegítimo: aceita-lo significaria compactuar como o esclerosamento do movimento dos comunistas brasileiros. É necessário que acima das suas divergências, os comunistas criem um novo espaço organizativo, um espaço no qual, através de um livre e amplo debate, eles possam encontrar o caminho que os ponha em sintonia com as exigências atuais da sociedade brasileira e, em particular, com as aspirações da classe operária e das demais camadas trabalhadoras. Só dessa forma é que os comunistas podem contribuir para a conquista de uma sociedade democrática e socialista em nosso país.
Rio de Janeiro, 13 de setembro de 1983
Luiz Werneck Vianna, Carlos Nelson Coutinho, Ivan Ribeiro, Armênio Guedes, Leandro Konder, Aloísio Teixeira, Leo Lince, Maria Lucia Teixeira Werneck Vianna, Armando Ribeiro, Manuel Palácios, Gilvan Cavalcanti de Melo, Luis Sergio Henriques, Moises Vinhas e outros.
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