• Uma das vantagens da democracia é que ela não espera meio século para descobrir o que aconteceu de bom e de ruim, doa a quem doer
- O Globo
Foi uma semana de catarse, isto é, de expiação de traumas e culpas, em que verdades desagradáveis vieram à tona — algumas de ontem, outras de hoje. Um dia depois que o insuspeito procurador-geral da República, Rodrigo Janot, declarou com todas as letras o que já se sabia, mas faltava admitir oficialmente — que a Petrobras fora assaltada e as denúncias de corrupção eram “um incêndio de grandes proporções” —, a Comissão Nacional da Verdade publicou seu relatório final revelando o que as Forças Armadas negaram durante quase 50 anos: que elas torturaram e mataram presos políticos no período da ditadura militar. Resultado de dois anos e sete meses de trabalho, o documento conclui citando o nome de 243 desaparecidos e 191 mortos, além de detalhar 30 formas de tortura usadas contra os prisioneiros. E mais: pela primeira vez, os cinco generais-ditadores que governaram o país de 1964 a 1985 foram formalmente acusados de graves violações dos direitos humanos: Castelo Branco, Garrastazu Médici, Costa e Silva, Ernesto Geisel e João Figueiredo.
Uma das vantagens da democracia é que ela não espera meio século para descobrir o que aconteceu de bom e de ruim, doa a quem doer. Agora, por exemplo, está doendo tanto que muitos, por um mecanismo psicológico de fuga, ou por simples cinismo, preferem negar. Já li pessoas dizendo que a “televisão é uma usina de escândalos”, como se eles fossem fabricados pela imprensa. Não adianta argumentar que os malfeitos da Petrobras foram revelados por executivos da própria estatal — a lama vazou de dentro para fora. Não foi um repórter, mas um poderoso ex-diretor que delatou os subornos e desvios que alimentaram os bilionários propinodutos da petroleira. O gerentinho que se dispôs a devolver quase R$ 100 milhões não confessou o seu roubo debaixo de tortura, como antigamente, mas de maneira espontânea.
Pior foi a conclusão da CPI mista da Petrobras. Quase ao mesmo tempo em que o Ministério Público terminava uma parte de sua devassa, denunciando 36 pessoas acusadas de desviarem cerca de R$ 1 bilhão, o relator da Comissão do Congresso concluía sua investigação sem pedir indiciamento e sem apontar envolvimento de políticos no que o procurador chamou de “aula de crime”. E, acredite, achou normal a Petrobras pagar US$ 1,25 bilhão pela Refinaria de Pasadena, que um ano antes fora vendida por US$ 42,5 milhões. Admitiu que possa ter havido pagamento de propina, mas achou que, apesar disso, não houve prejuízo na operação.
Negócio assim até eu. Vou tentar vender meu apartamento ao relator da CPI nas mesmas condições de valorização.
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