• Apesar da economia em marcha à ré e de uma presidente debilitada, governo brasileiro recupera credibilidade fiscal
The Economist
Quem vive em São Paulo diz que os restaurantes da cidade são o equivalente às praias do Rio de Janeiro: sua principal fonte de diversão e uma maneira de escapar do corre-corre da metrópole. Nos últimos tempos, porém, os restaurantes andam mais vazios do que de costume. E os paulistanos, quando comem em casa, agora trocam carne bovina por frango e legumes, que são mais baratos.
Essa mudança de hábitos alimentares foi causada pelo desalento econômico que desde o ano passado contamina o Brasil. A recessão paira no horizonte. A economia encolheu 0,2% nos primeiros três meses de 2015 e 1,6% na comparação com o mesmo período de 2014. O emprego e o salário real estão em queda; os juros e a inflação, em alta. O país parece sem comando: as dimensões do escândalo da Petrobrás e o desânimo com a economia enfraqueceram a presidente Dilma Rousseff.
Apesar disso, o governo tem feito progressos. Em especial, as autoridades brasileiras começam a recuperar a credibilidade que Dilma dilapidou em seu primeiro mandato. Desde o início do ano, a presidente vem dando forte apoio à política de ajuste fiscal conduzida pelo ministro da Fazenda, Joaquim Levy. E, desde as eleições de outubro, o Banco Central retomou com seriedade o combate à inflação. O turbulento Congresso brasileiro, atualmente dominado por governistas pouco confiáveis e oposicionistas inflexíveis, não conseguiu, até o momento, atrapalhar esses esforços. “É um Brasil sob nova direção”, diz Marcelo Carvalho, do banco de investimentos BNP Paribas.
A maior prioridade de Levy – reduzir o déficit fiscal a fim de manter o grau de investimento do país – ficou mais perto de ser alcançada na semana passada, quando o Congresso aprovou cortes nos gastos sociais do governo, em especial no que diz respeito ao seguro-desemprego e à concessão de pensões por morte. Isso deve representar uma economia de R$ 8 bilhões (US$ 2,6 bilhões) em 2015. Anteriormente, o governo já cortara R$ 70 bilhões em gastos discricionários previstos para 2015, o maior corte desse tipo na história do País, e elevara impostos, inclusive sobre a comercialização de combustíveis, que devem gerar uma receita de R$ 26 bilhões este ano.
Levy não conseguiu tudo o que queria. O projeto de lei que acaba com a dispendiosa desoneração tributária da folha de pagamentos enfrenta oposição no Congresso. Além disso, os parlamentares incluíram nas medidas que reduzem os gastos sociais uma emenda flexibilizando o chamado fator previdenciário, favorecendo o cálculo das pensões dos trabalhadores que se aposentam mais cedo. Se mantida, essa alteração dobrará os gastos do governo com a Previdência, fazendo com que em menos de uma década eles cheguem, pelas contas de Fabio Klein, da consultoria Tendências, a 15% do Produto Interno Bruto (PIB). A expectativa é que a presidente Dilma Rousseff vete a modificação.
Poucos analistas acreditam que Levy atingirá seus principais objetivos: um superávit primário (antes do pagamento de juros) de 1,2% este ano e de 2% em 2016. O superávit deste ano deve ficar pouco acima da metade do prometido, diz o especialista em contas públicas Mansueto Almeida. Mas isso talvez seja suficiente para satisfazer as agências de avaliação de crédito. As mudanças implementadas por Levy na condução da economia superaram as expectativas, diz Lisa Schineller, da Standard & Poor’s.
Os analistas financeiros estão igualmente bem impressionados com o presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, que não permitiu que a ameaça de recessão minasse o combate à inflação, atualmente acima de 8%. Em 3 de junho, o BC elevou a taxa de juros em 0,5 ponto porcentual, para 13,75%. A intenção de Tombini é fazer com que a inflação caia para 4,5%, no centro da meta fixada pela autoridade monetária, até o ano que vem. Isso pode exigir novas elevações nos juros.
No curto prazo, os esforços de Levy e Tombini farão com que os restaurantes de São Paulo fiquem mais vazios. A situação da economia é ainda pior do que parece à primeira vista. Os investimentos, já baixos para os padrões das economias emergentes, encolheram pelo sétimo trimestre consecutivo nos primeiros três meses de 2015. O consumo das famílias caiu pela primeira vez em ternos anuais desde que o PT chegou ao poder, em 2003. Sem uma redução nas importações, a desaceleração anualizada da economia teria sido ainda maior. As economias obtidas por Levy resultaram sobretudo de aumentos nos impostos, que devem afetar negativamente o desempenho atual da economia, e de cortes nos investimentos, que devem prejudicar seu desempenho futuro.
Restaurar a credibilidade não é o bastante. O Brasil também precisa se livrar dos “gargalos de oferta” mencionados por Christine Lagarde em maio, quando a diretora-gerente do Fundo Monetário Internacional (FMI) esteve no País. Esses gargalos incluem um sistema tributário que desestimula os investimentos privados, uma infraestrutura inadequada e uma legislação trabalhista arcaica. Os novos gerentes do Brasil mal começaram a lidar com essas questões.
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