- Valor Econômico
• A economia vai mal e a situação política vai de mal a pior
Está pior. Encerrado o primeiro semestre, a situação da economia se mostrou mais grave do que era imaginado no início do novo mandato de Dilma Rousseff. E o esgarçamento das condições políticas é, também, maior do seria razoável supor em janeiro.
A inflação esperada para 2015 pelo grupo de instituições que mais acerta nas pesquisas do Banco Central era de 6,4%. Hoje, a expectativa está na casa dos 9%. A elevação estimada da taxa Selic para o ano é de 14,25%, em comparação com 12,50%, conforme a expectativa no início de janeiro. A despeito de todo o aumento dos juros, "a alta da Selic de janeiro a junho ainda é inferior à surpresa inflacionária", apontou uma autoridade do governo.
As condições fiscais estavam mais deterioradas do que a equipe que assumiu o Ministério da Fazenda poderia cogitar. Nessa área, as informações foram chegando aos poucos e só após um par de meses é que se teve acesso ao quadro completo. A divulgação do déficit primário de 2014, de 0,64% do PIB, foi precedida do estabelecimento da metas de superávit para este ano, de 1,1% do PIB e para no mínimo 2% nos anos seguintes. A meta, porém, ficou ambiciosa diante da queda real das receitas em uma economia que afunda. Previa-se, no início do ano, uma contração de 0,5%. A recessão, porém, é mais acentuada e pode chegar a menos 2%.
A dívida bruta do setor público - principal indicador de solvência do país - prossegue em ascensão. Era de 58,9% do PIB no encerramento de 2014 e chegou a 62,5% do PIB em maio. O déficit nominal, que era de 6,29% do PIB no início do exercício, em maio subiu para 7,9% e o superávit primário originalmente concebido não se realiza.
O desemprego aumenta em ritmo acelerado, a renda média do trabalho está em queda, a oferta de crédito secou e o país está à beira de novo rebaixamento do rating concedido pelas agências internacionais. Se isso ocorrer, ficará a um passo de perder o grau de investimento, evento que geraria forte desvalorização cambial, reacenderia as pressões sobre a inflação e levaria a um redobrado aperto fiscal e monetário.
A confiança dos agentes econômicos, que precederia à expansão dos investimentos, não se recuperou e os investimentos seguem em queda pelo sétimo trimestre consecutivo.
Um atenuante no quadro de dificuldades é a expectativa de inflação para 2016 em diante que, por força da elevação dos juros, não foi contaminada pelo aumento da inflação deste ano. A taxa Selic deve aumentar mais 0,5 ponto percentual.
Do Congresso saíram nas últimas semanas decisões na direção exatamente oposta ao esforço de ajuste das contas públicas. A sequência de medidas começou com a mudança no fator previdenciário. Em seguida o parlamento aprovou a indexação dos benefícios acima de um salário mínimo ao reajuste legal que vai prevalecer para o mínimo. Esta semana adicionou uma fatura de R$ 25 bilhões na folha de salários da União, nos próximos quatro anos, ao aprovar o reajuste reivindicado pelo Judiciário. E, ao adiar a votação da revisão das desonerações, subtraiu mais R$ 1 bilhão do caixa do Tesouro Nacional.
Diante das frustrações de receitas, o governo deverá reduzir a meta de primário para este ano este e a oportunidade para fazer isso é quando o Ministério do Planejamento divulgar a avaliação bimestral de receitas e despesas, este mês.
"Estão fazendo piquenique na boca do vulcão", comentou uma alta fonte do governo, referindo-se à destreza do Congresso em aprovar novos gastos enquanto as contas públicas não fecham. "Não podemos flertar com a espiral negativa", advertiu um ministro, ao comentar a aprovação do insustentável reajuste médio de 58% para o Judiciário.
A área econômica argumenta que dispõe dos instrumentos necessários para tirar a economia brasileira do buraco em que se meteu por erros de políticas do passado recente, mas, para utilizar o amargo remédio na dosagem necessária, o Palácio do Planalto teria que ter respaldo político do Congresso. "É preciso um consenso político para a solução das dificuldades econômicas", disse o ministro.
Se a situação da economia é ruim, a da política é dramática. E ainda não chegou agosto - mês considerado aziago na história do Brasil. As conversas travadas com grande naturalidade nos partidos da base aliada indicam que o governo Dilma, cuja aprovação caiu para apenas 9% segundo pesquisa do Ibope, tem um prazo de validade. A data é outubro. Até lá os parlamentares pressupõem que vai estar claro para onde a economia está indo.
Se não houver indícios de recuperação da atividade e o desemprego continuar aumentando, haveria duas saídas concebidas por lideranças políticas: deixar Dilma na Presidência sob a tutela do PMDB, com anuência do ex-presidente Lula; ou uma solução mais extremada como o "impeachment", levando o vice-presidente Michel Temer à Presidência da República.
Essas articulações já chegaram ao Palácio do Jaburu, residência oficial do vice-presidente, e o grande problema para a eventualidade de um processo de "impeachment" seria a falta de um acordo entre Lula e Temer para a sucessão em 2018. Encontrar motivação jurídica para um processo dessa natureza não seria problema, asseguram interlocutores qualificados.
A tranquilidade com que se trata de assuntos dessa gravidade é um sinal preocupante da ansiedade com que se aguarda o "pós-ajuste", quando o ajuste em si está apenas no começo e cheio de tropeços. A visão prematura de passar logo do estágio de aperto para notícias positivas, como tem reivindicado o ex-presidente Lula, mostra que a condescendência política com o governo Dilma Rousseff é limitada e a compreensão dos processos de ajuste econômicos, também.
Uma das questões que aflige a área econômica é que todas as iniciativas que olham para o pós-ajuste, singelas ou ousadas, representam gasto de dinheiro inexistente no Tesouro Nacional. São incentivos para uns, isenções para outros ou financiamentos a juros subsidiados para terceiros, como se depois de um rápido esforço de contenção do déficit fosse possível voltar a ter farto acesso ao dinheiro público.
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