- O Estado de S. Paulo
No curto prazo, a reforma ministerial ajudou o governo mais do que atrapalhou. Custoso e atabalhoado, o toma lá dá cá produziu muitas manchetes negativas e sacrificou raros ministros tecnicamente qualificados de Dilma Rousseff. Mas, passadas algumas semanas, constata-se que a reforma cumpriu seu objetivo mais urgente: conseguiu votos necessários para prorrogar a sobrevida da presidente no poder. Também permitiu evitar derrotas catastróficas no Congresso. Nada mais, por enquanto.
Desde que a presidente mergulhou no é dando que se recebe com a banda mansa do PMDB, aumentou cinco pontos o governismo médio na Câmara. A barganha trocou sete ministérios peemedebistas por algumas dezenas de votos e reverteu a tendência de autoimolação do governo. Mas foi insuficiente para criar a expectativa de aprovar qualquer coisa além do trivial. A ressurreição da CPMF, se vier a acontecer, implicará aditivo ao preço do contrato.
Em agosto, quando Michel Temer deixou a coordenação política do governo, a taxa de governismo dos deputados peemedebistas medida pelo Basômetro era 70%. O gesto teatral do vice-presidente foi vendido como o começo do impeachment de Dilma. Porém, a taxa de votos pró-governo no PMDB aumentou para 75% em setembro e chegou a 79% em outubro. Mágica? Não, fisiologismo mesmo.
Dilma se aproximou do líder peemedebista na Câmara, Leonardo Picciani (RJ), e negociou pessoalmente a redistribuição de cargos na Esplanada dos Ministérios. Ao mesmo tempo que Temer saiu de cena, Eduardo Cunha entrou no seu inferno astral.
O movimento de Dilma rachou a bancada do PMDB e implodiu o bloco parlamentar no qual Picciani dava as cartas. Foi uma represália executada por aliados de Cunha. Todavia, a reação enfraqueceu o PMDB e acabou favorecendo a presidente. Pela primeira vez nesta legislatura, o número de deputados que votam ao menos 90% das vezes seguindo orientação do governo ultrapassou o simbólico limite dos 171. Dilma mostrou que alcançara votos suficientes para barrar a abertura do processo de impeachment - por ora.
Nas 25 votações nominais na Câmara ocorridas de 17 de setembro para cá, 191 deputados votaram com o governo pelo menos 9 em cada 10 vezes. Está ainda muito longe da maioria absoluta de 257 votos, mas foi um grande avanço. Nas primeiras 25 votações após Eduardo Cunha assumir o comando da Casa, entre fevereiro e março deste ano, havia apenas 103 deputados com esse mesmo grau de fidelidade a Dilma. Desses, mais da metade era do PT e apenas um era do PMDB. Recentemente, o cenário se inverteu.
Nas 25 votações mais recentes, 53 deputados do PMDB votaram com o governo 90% das vezes. Não por coincidência, foi depois da reforma ministerial e da multiplicação de denúncias contra Cunha. Enquanto isso, a bancada do PT perdeu cadeiras na dança dos ministros e ficou menos fiel à presidente. Só 45 deputados permanecem no núcleo duro de apoio a Dilma. Uns deixaram o PT e, como Alessandro Molon, registram só 46% de governismo.
Hoje, o PMDB encena mais fidelidade à presidente do que o PT: além de entregar mais votos, não pede a cabeça do ministro da Fazenda, Joaquim Levy. A parte que foi atendida por cargos e emendas está cumprindo sua parte da barganha. E não é só no PMDB. No PDT, que ganhou o cobiçado Ministério das Comunicações, a taxa de governismo está em alta: 12 dos 19 deputados entraram para o núcleo com 90% de dureza pró-Dilma pós-reforma. O governismo é crescente também no PSD de Gilberto Kassab e no PR.
Se o fisiologismo não compensasse não seria a norma no Brasil há tantos governos. Além do alto custo, o toma lá dá cá tem outro porém. Voto não se vende, se empresta. O contrato é de aluguel. Tudo é transitório, e a fidelidade termina assim que aparece oferta mais lucrativa vinda de outro lado. É questão de preço.
Nenhum comentário:
Postar um comentário