- O Estado de S. Paulo
Não fossem epidemias, desastres ambientais e crise econômica, o governo comemoraria. No Congresso, neutralizou bombas fiscais armadas pelos deputados e vetadas por Dilma Rousseff.
Avançou para relaxar a meta fiscal, diminuindo o risco imediato de impeachment. Na Câmara, aprovou taxação de dinheiro brasileiro no exterior, cuja receita pode ajudar a equilibrar seu caixa. No fim, juntou mais de 200 deputados - talvez 250 - que, se não votam todos sempre a favor de Dilma, ao menos não votam contra.
É menos da metade da Câmara, mas, ainda assim, trata-se de um avanço para quem, até poucos meses atrás, mal tinha 171 votos para barrar o processo de impeachment. As últimas votações sugerem que, além de bloquear as tentativas da oposição para derrubá-la, a presidente também pode vir a conseguir governar. Ainda que governar signifique arrochar salários, diminuir gastos sociais, cortar investimentos e deixar o desemprego crescer.
Desde a reforma ministerial, a articulação política do governo melhorou. Em parte, porque rachou o PMDB e reconquistou partidos menores. Mas também porque Eduardo Cunha concentrou-se em não cair ao invés de empurrar Dilma. Ela escorou-se em Renan Calheiros no Senado e Leonardo Picciani na Câmara. Peemedebistas que querem fazer “uma ponte para o futuro” sem Dilma nem o PT viram suas obras embargadas. Pelo menos até o Carnaval, talvez até a Semana Santa. Vão esperar a crise desempregar mais gente.
A esperteza que aliados de Michel Temer fizeram chegar a banqueiros e empresários de que as contas de campanha do vice-presidente são diferentes das contas de campanha da titular não colou. O ministro Gilmar Mendes - que não pode ser acusado de dilmista - declarou que o Tribunal Superior Eleitoral nunca separou o presidente de seu vice em cassações de mandatos.
Para a tese prosperar na corte, necessitaria mais do que de um novo entendimento dos magistrados. Precisaria de clamor popular, de pressão externa: manifestações volumosas, com objetivo específico e persistentes. Não é algo que esteja sobrando em qualquer esquina - só nos canais de sempre das redes sociais.
Nas últimas semanas, Dilma também se safou do lado de fora dos palácios. O locaute de caminhões fracassou. Quase ninguém viu os protestos contra a presidente marcados para 15 de novembro. Quem viu não ligou o nome à pessoa. Bonecos gigantes murcharam: manifestantes da ala militar-policial foram presos praticando tiro ao alvo na Esplanada e podem ser obrigados a levantar acampamento. A cada trapalhada, retrocedem ao seu nicho.
Ao mesmo tempo, protestos contra outros políticos e políticas começaram a ganhar ruas e escolas. Não é refresco para Dilma, que continua mais impopular do que mineradora entre moradores do Vale do rio Doce, mas dilui a pressão. Se ela não chamar a atenção para si, 2016 pode ser mais parecido com 2013 do que com 2015. A insatisfação da opinião pública está se dividindo entre outros alvos em vez de se concentrar contra o governo federal.
Esse cenário, porém, é mais instável do que uma barragem de rejeitos de minério. A qualquer momento pode sangrar e levar de enxurrada a presidente e outros governantes. Especialmente porque, tudo indica, a perda de poder de compra das famílias tende a aumentar antes de, eventualmente, vir a arrefecer. A recessão acumula novas pressões atrás do dique de contenção.
De alguma forma essa pressão vai acabar liberada. Eleições têm esse poder, mas só quando entregam esperança. Não é algo que esteja no horizonte. Planos econômicos são válvulas de escape. Nada indica, porém, que Joaquim Levy vá dar um Real para Dilma. Por isso, articulações pró-Henrique Meirelles só tendem a crescer. Quando não se troca a presidente, troca-se o ministro. Fusível serve para isso.
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