• Delcídio operou como uma espécie de “gerente de crise” a favor dos envolvidos na Lava-Jato. Movimentou-se com grande desenvoltura para tentar impedir a delação premiada de Cerveró
- Correio Braziliense
A seguinte piada circulava ontem nas redes sociais:
– Vossa Excelência está preso, por favor, me acompanhe.
– Eu tenho direito a um advogado.
– Sim, ele já está preso ali na viatura.
– Tenho direito a um telefonema, preciso falar com meu assessor.
– Nem precisa telefonar, senhor, ele também está preso na viatura da frente.
– E se eu precisar de dinheiro pra fiança?
– Ainda sem problemas, seu banqueiro está na viatura de trás. Vamos embora!
Parece um diálogo do antigo Casseta & Planeta, entre o falecido Bussunda e o também humorista Marcelo Madureira, porém, data vênia, é um resumo do fato político mais relevante de ontem: as prisões do senador Delcídio do Amaral (PT-MS), líder do governo no Senado; do advogado Edson Ribeiro, que defendeu o ex-diretor da área internacional da Petrobras Nestor Cerveró; do chefe de gabinete de Delcídio, Diogo Ferreira; e do banqueiro André Esteves, do banco BTG Pactual.
As prisões representam a chegada da Operação Lava-Jato ao vértice do esquema de corrupção montado na Petrobras e outras empresas estatais, envolvendo o líder do governo no Senado e o maior operador financeiro do cluster organizado para explorar o pré-sal, o banqueiro André Esteves. O fato de resultar da delação premiada do ex-diretor da área Internacional da Petrobras Nestor Cerveró e relatar fatos novos sobre a controvertida compra da refinaria de Pasadena, no Texas (EUA), faz com que o caso se reaproxime da presidente Dilma Rousseff, que presidia o Conselho de Administração da Petrobras na época da aquisição e já faz tudo o que pôde para se isentar de responsabilidade quanto a isso.
A discussão do caso no Senado foi como falar de corda em casa de enforcado. A prisão de Delcídio também pôs em xeque as lideranças do Senado, muitas das quais citadas em diversas delações premiadas, ou seja, sob investigação na Operação Lava Jato, como é o caso do senador Fernando Collor de Mello (PTB-AL). Foi a primeira vez que um senador foi preso em pleno exercício do mandato, numa Casa criada em 1824.
Pela Constituição, cabe ao Senado referendar ou revogar a prisão. Houve uma grande polêmica sobre a votação, pois o presidente da Casa, Renan Calheiros (PMDB-AL), optou pelo voto secreto, mas submeteu a decisão ao plenário. A maioria preferiu o voto aberto. Entre o espírito de corpo e a sintonia com a opinião pública, prevaleceu o que é de praxe nessas situações limites: a vontade das ruas. Também por isso, manteve a prisão de Delcídio.
O Palácio do Planalto operou para que a base do governo mantivesse a votação secreta e revogasse a prisão em flagrante de Delcídio, embora a retórica do PT fosse no sentido de estabelecer um cordão sanitário em relação ao caso, o que é uma missão impossível, uma vez que o petista é o líder do governo no Senado. A grande preocupação do Palácio do Planalto é com relação aos desdobramentos da prisão, caso o senador petista se sinta abandonado. Ele também ainda pode aderir à delação premiada.
Gravações
As gravações divulgadas pelo ministro do Supremo Tribunal Federal, Teori Zavascki, são estarrecedoras. Delcídio operou como uma espécie de “gerente de crise” a favor dos envolvidos na Lava-Jato. Movimentou-se com grande desenvoltura para tentar impedir a delação premiada de Cerveró, a ponto de cooptar o seu advogado, traçar uma rota de fuga para a Espanha caso o ex-diretor da Petrobras obtivesse um habeas corpus e mobilizar um banqueiro para comprar seu silêncio com uma mesada de R$ 50 mil.
O mais grave, porém, foi a revelação de que pretendia influenciar as decisões do Supremo Tribunal Federal (STF) para abafar o caso, o que causou estupor e grande irritação entre os membros da Corte. E deve ter provocado a decisão extrema de Teori, que decretou sua prisão cautelar. Disse Delcídio: “Agora, agora, Edson e Bernardo, é eu acho que nós temos que centrar fogo no STF agora, eu conversei com o Teori, conversei com o Toffoli, pedi pro Toffoli conversar com o Gilmar, o Michel conversou com o Gilmar também, porque o Michel tá muito preocupado com o Zelada, e eu vou conversar com o Gilmar também”.
Na mesma gravação, Delcídio anuncia que pretende procurar o ministro do STF Edson Fachin para pedir a concessão de habeas corpus para um dos réus da Lava-Jato. Os ministros negaram a existência das conversas e reagiram com indignação. Teori Zavascki, relator da Lava-Jato, pediu ao presidente 2ª Turma do STF, ministro Dias Toffoli, a convocação de uma reunião extraordinária para deliberar sobre o caso. A decisão foi tomada por unanimidade, com os votos também de Gilmar Mendes, Celso de Mello e Cármen Lúcia. E pôs um ponto final nas especulações entre políticos e advogados dos réus de que seria possível anular ou esvaziar a Operação Lava-Jato no STF.
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