• Dilma diz que vai resistir, mas que luta será nos 180 dias de afastamento
Eduardo Barretto - O Globo
Apesar dos duros discursos contra o “golpe” até duas vezes por dia, a presidente Dilma Rousseff adotou um tom de despedida e resignação quanto a seu possível afastamento do Planalto na semana que vem. Dilma tem dito que vai “resistir, resistir e resistir”, mas que o fará no período em que ficar afastada, tentando evitar sua destituição. Ontem, em obra de transposição do Rio São Francisco em Cabrobó (PE), ela afirmou que ficará com o “coração partido” se não estiver na Presidência quando o projeto for concluído.
— Se tiver uma coisa que eu vou ficar muito triste na minha vida é não estar aqui no dia que a dona Maria ou o seu João abrirem a torneira e a água escorrer, e eu não estar aqui para comemorar com vocês — declarou Dilma no começo do discurso na zona rural de Cabrobó, e completou: — Quero dizer que meu coração vai ficar partido. Vai ficar partido porque é uma grande injustiça.
Na noite de quinta-feira, em entrevista à televisão venezuelana Telesur, Dilma disse pela primeira vez que a luta se dará nos 180 dias do afastamento temporário. A presidente foi entrevistada por Erde nesto Villegas, ex-ministro da Comunicação de Hugo Chávez e Nicolas Maduro.
— Acho que temos condição de reverter o processo. A luta está começando e não se esgota nesse primeiro momento. Vamos lutar durante os 180 dias para que o golpe não se concretize, período em que vão julgar o mérito. Vamos lutar para que não seja um golpe definitivo contra a democracia — disse.
Ontem, a presidente disse que não vai “para debaixo do tapete” e que é a “prova da injustiça”, dando a entender que, mesmo afastada, não iria parar enfrentar o impeachment :
— Se eu renunciar, eu iria pra debaixo do tapete. Eu vou ficar aqui brigando. Porque eu sou a prova da injustiça. Eles estão condenando nesse impeachment uma pessoa inocente. E não há nada mais grave do que condenar uma pessoa inocente.
Na atual maratona de cerimônias, Dilma tem recorrido ao expediente de citar feitos seus e do seu antecessor, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, e criticar o governo de Fernando Henrique Cardoso. Ela também vem afirmando que orgulha-se das escolhas que fez e que privilegiou programas sociais.
Em Pernambuco, estado de Lula, a presidente opôs sua gestão e a do petista ao eventual governo de Michel Temer, sem mencioná-lo diretamente. Nas polarizações que fez, Dilma concentrou-se na parte social. A presidente brincou com a plateia ao ilustrar que foi eleita pelo alinhamento com programas sociais.
— Ninguém votou em mim pelos meus belos olhos, apesar de eles serem muito belos.
— Acham que é um desperdício, um gasto desnecessário, o Bolsa Família para a quantidade de famílias que nós colocamos o Bolsa Família para elas — disse a presidente, falando novamente que o governo interino tirará 36 milhões do Bolsa Família, e que a filosofia para essas pessoas será “os 36 milhões que se virem”.
Mesmo atacando propostas da possível gestão Temer de escrutinar os atuais gastos sociais, Dilma acusou que essas mudanças serão disfarçadas por eufemismos.
— Resolveram que essa crise tem que ser enfrentada reduzindo só programa social. Reduzindo. Às vezes, eles mudam a palavra para “rever”, às vezes é “revisitar”, outras vezes é “focar”. Mas é isso que está em curso — declarou, e complementou: — É porque se forem para eleição direta, o povo não vota neles. É por isso.
Críticas a Temer
O afastamento de Eduardo Cunha (PMDB-RJ) do mandato e da presidência da Câmara foi considerado tardio em discursos de Dilma, mas desde então ela busca estabelecer conexões entre Temer e Cunha, que abriu o processo de impeachment na Câmara e o conduziu. Ontem, ela disse que o vice é “cúmplice” e “usurpador do poder”.
— Não vamos nos iludir. Todos aqueles que são beneficiários desse processo, como por exemplo os que estão usurpando o poder, infelizmente o vice-presidente da República, são cúmplices de um processo extremamente grave.
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