• Fábio Medina Osório acumulou desentendimentos com o Planalto
Pedido de compartilhamento de informações da Lava-Jato desgastou ainda mais a relação
A primeira mulher no Ministério do presidente Michel Temer será Grace Mendonça, que assumirá o lugar de Fábio Medina Osório à frente da Advocacia Geral da União, onde ela fez carreira. Demitido por telefone por Temer, Medina Osório estava desgastado antes do processo de impeachment de Dilma e saiu pela série de desentendimentos que acumulou. Entre os motivos de irritação do Planalto estava a atuação autônoma dele, sem aval do governo, como um pedido de informações à Lava-Jato.
Com receio do ‘fogo amigo’
• Após demitir ministro da AGU, governo teme ser acusado por ele de tentar prejudicar Lava-Jato
Júnia Gama e Eduardo Barretto - O Globo
BRASÍLIA - O governo escolheu ontem uma mulher, a advogada Grace Mendonça, para ocupar o posto de advogada-geral da União depois que uma série de atritos internos levou à demissão de Fábio Medina Osório do cargo. A principal reclamação do Palácio do Planalto era que Medina Osório atuava de forma autônoma, sem autorização do governo, como no episódio em que solicitou ao ministro Teori Zavascki, do Supremo Tribunal Federal (STF), informações de inquéritos sobre a Operação Lava-Jato, um movimento que foi visto como tentativa de levar a operação para dentro do Planalto.
Segundo fontes do palácio, a saída de Medina Osório já estava programada para ocorrer após a conclusão do processo de impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff, por um conjunto de divergências. A forma como ele saiu, porém, provocou preocupação no governo. Tudo o que o presidente Michel Temer não queria, neste momento, era ter de lidar com “fogo amigo” vindo de um ex-integrante do Ministério. No Palácio do Planalto, auxiliares de Temer estavam preocupados com a informação de que Medina Osório vai atacar o governo pela imprensa. O temor é que, para justificar sua demissão, ele use a versão de que o governo quis coibir sua atuação para impedi-lo de reforçar a Lava-Jato.
O chefe da AGU havia solicitado acesso aos inquéritos da Lava-Jato com o objetivo de instruir futuras ações judiciais, o que poderia criar um problema com aliados políticos do governo que viessem a ser alvos das investigações.
Funcionária de carreira
Pelos últimos 13 anos, Grace Mendonça, funcionária de carreira da AGU, comandou a Secretaria-Geral de Contencioso, órgão responsável por representar judicialmente a União junto ao STF. Seu nome já estava, ao lado de outras duas técnicas que trabalham no órgão, entre as opções de Temer para substituir Medina Osório no cargo. Ministros do Supremo consultados pelo Planalto elogiaram a escolha de Grace.
Segundo fontes do governo, Medina Osório foi comunicado da demissão na noite de quinta-feira, pelo ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha, conforme antecipou o Blog do Moreno, no site do GLOBO. Medina Osório chegou a pedir que sua saída só fosse oficializada na semana seguinte, após a posse da ministra Cármen Lúcia como presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), marcada para segunda-feira. Mas a conversa esquentou e, exaltado, Medina disse a Padilha que não poderia ser demitido por outro ministro. — Quero ser demitido pelo presidente! — Mas eu estou falando em nome do presidente — respondeu Padilha.
Durante a conversa, o ministro da Casa Civil chegou a descer ao terceiro andar, onde fica o gabinete presidencial, para comunicar Temer da reação de Medina Osório. O presidente reafirmou que Padilha estava autorizado a demiti-lo e que poderia retornar para confirmar a exoneração. O acordo inicial era que a demissão somente fosse anunciada na próxima semana, mas, de acordo com auxiliares de Temer, o próprio Medina Osório se encarregou de vazar a informação, o que levou o Planalto a antecipar o anúncio. Ontem de manhã, Temer ligou para Osório e confirmou a exoneração. O presidente não teve agenda oficial ontem além dos despachos internos, e teve tempo para receber a nova advogada-geral da União no gabinete e bater o martelo sobre sua nomeação.
A demissão de Medina Osório começou a se desenhar desde suas primeiras semanas no cargo, por uma série de atos que contrariaram Temer e seus assessores. Logo após a aprovação do impeachment, na semana passada, Padilha se encarregou de chamar Medina Osório para avisar que ele teria de deixar o cargo. Na ocasião, o chefe da AGU pediu que se esperasse até o final do ano, pois desejava abrir escritório de advocacia em Brasília. Quando voltou da viagem à China, Temer conversou com Padilha e ficou decidido que o desgaste com Medina Osório atingira um nível em que não seria possível prolongar sua permanência no governo.
Pouco trânsito no STF
Um dos motivos de insatisfação com Medina Osório era seu pouco trânsito entre os ministros do Supremo. Havia ainda acusações de que Medina privilegiava internamente integrantes de uma associação à qual pertence, o que gerava atritos, e pouco circulava no Supremo, onde o governo é parte em causas que, juntas, somam quase R$ 500 bilhões. Um dos ministros da Corte se queixou a pessoas próximas a Temer de que o chefe da AGU não tinha habilidades políticas.
Diversos outros episódios foram se somando à ficha de Medina. Segundo relatos, desde as primeiras semanas ele passou a se “estranhar” com Padilha, seu padrinho político no cargo. Numa ocasião, Padilha chamou o colega para um despacho e Medina Osório teria dito que preferia despachar diretamente com Temer. Havia ainda falta de afinação com o Ministério da Transparência, Fiscalização e Controle, a antiga CGU, a respeito do processo de leniência. Outro desgaste foi provocado por sua insistência em ter um jato da FAB à sua disposição para retornar à casa nos finais de semana, quando isso já estava proibido na administração federal.
O litígio em torno do comando da Empresa Brasileira de Comunicação (EBC) também gerou insatisfação, pois a atuação de Medina Osório foi considerada lenta e equivocada pelo governo, o que acabou expondo Temer a ataques por parte da cúpula da empresa. Em outra ocasião criticada no Planalto, Medina tentou, sem combinar com o governo, mover uma ação contra José Eduardo Cardozo, seu antecessor no cargo, por suposto desvio de finalidade na defesa de Dilma Rousseff. À época, Cardozo afirmou que o governo tentava intimidá-lo. O então advogado-geral da União também entrou em atritos com o Ministério Público ao tomar parte em um contencioso entre o órgão e a Polícia Federal. Além disto, o Planalto acredita que ele “plantava” notas na imprensa para reforçar sua posição no governo, o que acabava expondo seus colegas e o próprio presidente.
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