- Valor Econômico
• Judiciário não está confortável com teto para gastos
A PEC do teto de gastos deve ser aprovada no Senado, mas o governo vem tendo mais trabalho do que esperava com a votação. A expectativa da delação da Odebrecht, os sinais de que a Justiça Eleitoral pode efetivamente considerar a possibilidade de impugnação da chapa Dilma-Temer e o ativismo do Supremo Tribunal Federal (STF), tudo tem contribuído para deixar o governo mais vulnerável e inseguro. Ninguém duvida da capacidade de articulação política do presidente Michel Temer, o que não quer dizer muita coisa quando o comportamento das instituições - e das pessoas - fica imprevisível.
Semana passada, a maioria dos ministros do STF votou a favor da proibição de que réus façam parte da linha sucessória da Presidência da República. Uma decisão previsível. Inesperado foi o voto do ministro Celso de Mello, depois que seu colega Dias Toffoli havia pedido vistas ao processo. O normal seria a interrupção do julgamento, como é praxe na suprema corte, mas Celso de Mello resolveu antecipar seu voto e definir a maioria, desencadeando um efeito dominó que deve ter reflexo na eleição para as presidências da Câmara e do Senado.
O governo, evidentemente, torcia pela interrupção do julgamento quando Dias Toffoli pediu vista, o que deixaria em aberto a decisão. Isso ajudaria a acalmar o presidente do Senado, Renan Calheiros. O problema não é nem tanto Renan assumir ou não o lugar de Temer, na eventualidade de o presidente e o deputado Rodrigo Maia, presidente da Câmara, se ausentarem simultaneamente do país, visto que isso não está no horizonte próximo e o mandato de Renan acaba em fevereiro. O que entra em jogo é a sucessão no Senado, que Renan controla com o aval do Palácio do Planalto.
O voto de Celso de Mello pode tirar do eixo previsto a sucessão no Senado, no momento em que a Casa se prepara para votar a PEC do teto de gastos. A instabilidade deixa o ambiente propício a demandas até agora mantidas em silêncio, mas que começam a extravasar dos bastidores. Não é segredo para ninguém a imensa dificuldade que o Supremo tem para conviver com a ideia de perda de autonomia orçamentária. Qualquer mudança no texto, agora, leva a PEC de volta à Câmara - o caminho mais curto para o plano de ajuste fazer água.
Temer e o presidente do Senado, Renan Calheiros, acertaram um modo de convivência na viagem do presidente à China. "Estamos juntos", disse o presidente do Senado a Temer, antes de empossar definitivamente o vice de Dilma Rousseff. O presidente, no entanto, não tem como oferecer garantias a Renan, porque o comportamento de outros atores pode ser tão imprevisível como foi Celso de Mello na votação do STF. Renan tem uma dezena de ações aguardando o pronunciamento do Supremo. Já faz quase uma década que o tribunal segura um inquérito que pode transformar o senador em réu, mas que a nova presidente do tribunal, Cármen Lucia, já liberou à pauta.
Na alça de mira, a delação premiada da Odebrecht mantém o Congresso sob pressão e reduz a margem de manobra do governo. Não existe saída boa para o presidente da República. O Congresso quer a solidariedade de Temer à anistia para os crimes de caixa 2. Em tese bastaria a criminalização do caixa 2: como a lei não retroage para prejudicar, os crimes cometidos antes da promulgação não seriam considerados nos tribunais. Mas graças à imprevisibilidade do momento, os congressistas querem garantia escrita. Se Temer sancionar a lei, perde apoio da opinião pública; se vetar, perde apoio do Congresso.
Neste clima de incertezas, o julgamento do mensalão chega a provocar saudades em Brasília: à época havia um calendário a ser cumprido, um juiz (Joaquim Barbosa) à frente do inquérito e réus claramente identificados. Não será surpresa se os tribunais também forem questionados sobre a constitucionalidade da existência de uma "força-tarefa" como a que está encarregada da operação Lava-Jato, considerada a principal fonte de imprevisibilidade. O argumento é que ela fere a independência dos poderes, com a distinção de cada um: polícia investiga, o ministério público faz o inquérito e a Justiça julga.
O governo espera que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) separe as contas de campanha de Dilma Rousseff e de Michel Temer. Os sinais que recebeu do relator do processo de impugnação da chapa, ministro Herman Benjamin, no entanto, foram alarmantes. Em conversas privadas, Benjamin tem falado em "provas contundentes" de caixa 2 e dinheiro ilícito e que deve botar o processo para votar em fevereiro; em público, disse que é "o maior processo da história do TSE" e que sua decisão - consequentemente - será "histórica". Advogados que tiveram contato com o ministro dizem que ele acha difícil separar as contas de Dilma Rousseff e de seu vice. E que a impugnação é possível.
O desafio de Temer, no momento, é restaurar um nível de previsibilidade política que resgate a confiança no governo.
O candidato do peito
O Palácio do Planalto nega que esteja ou vá trabalhar pela candidatura de Rodrigo Maia (DEM-RJ) a presidente da Câmara, mas a reeleição do deputado carioca é a sua melhor aposta. São várias as razões apontadas. Maia, por exemplo, integra um partido pequeno, o Democratas, que será um ator secundário na sucessão presidencial de 2018. O PSDB, que reivindica o cargo, pelo contrário, será protagonista. A eleição de um tucano agora para presidir a Câmara seria a antecipação da disputa sucessória, o que o governo prefere evitar. O PSDB saiu mais dividido que nunca das eleições. Os tucanos disputam entre eles e com o PMDB, que agora também é protagonista. Além disso, o Rodrigo Maia, entre os candidatos disponíveis, é o que melhor conversa com a oposição. No segundo turno, seu nome foi apoiado pelo PT. A unidade do Centrão também não atende aos interesses do governo.
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