Para ministro do STF, instrumento pode resultar em ‘manipulação’
- O Globo
-BRASÍLIA- O ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF), defendeu ontem uma interpretação mais restritiva da regra do foro privilegiado. O instrumento dá tratamento diferenciado apenas a autoridades que cometeram crimes durante o mandato, no cargo específico ocupado. Atualmente, o foro especial é estendido para qualquer crime atribuído a autoridades, independentemente de quando foi cometido.
Em despacho, Barroso lembrou que, hoje, tramitam no STF cerca de 500 processos contra parlamentares, de acordo com as estatísticas da Corte. Para o ministro, a regra resulta em impunidade porque, quando uma autoridade deixa o cargo, o processo muda de instância, dificultando a conclusão das investigações. Para o ministro, a regra do foro se tornou uma “perversão da Justiça”.
“O foro por prerrogativa é causa frequente de impunidade, porque dele resulta maior demora na tramitação dos processos e permite a manipulação da jurisdição do tribunal”, escreveu o ministro.
A crítica foi feita no despacho no qual o ministro decidiu levar ao plenário do STF uma ação penal contra o atual prefeito de Cabo Frio, Marcos da Rocha Mendes (PMDB), por crime eleitoral. Ainda não está marcada data para o julgamento. Isso depende de decisão da presidente do tribunal, ministra Cármen Lúcia.
No despacho, Barroso afirma que o caso do prefeito é exemplo da “disfuncionalidade prática do regime de foro privilegiado”. O político é suspeito de ter dado dinheiro e distribuído carne a eleitores na campanha de 2008. A prática configuraria compra de votos. A Justiça Eleitoral do Rio de Janeiro abriu a ação penal. Quando terminou o mandato de Mendes, o caso foi transferido para a primeira instância da Justiça Eleitoral local.
Mendes era suplente de Eduardo Cunha (PMDB-RJ) e assumiu o mandato na Câmara dos Deputados no ano passado, depois que o titular da cadeira foi cassado. Com isso, o processo foi transferido para o Supremo Tribunal Federal.
“O sistema é feito para não funcionar. Mesmo quem defende a ideia de que o foro por prerrogativa de função não é um mal em si, na sua origem e inspiração, não tem como deixar de reconhecer que, entre nós, ele se tornou uma perversão da Justiça. No presente caso, por exemplo, as diversas declinações de competência estão prestes a gerar a prescrição pela pena provável, de modo a frustrar a realização da justiça, em caso de eventual condenação”, concluiu o ministro Luís Roberto Barroso.
Pela Constituição Federal, deputados, senadores, ministros de Estado e o presidente da República devem ser processados e julgados no Supremo. Governadores têm direito ao foro no Superior Tribunal de Justiça (STJ). Prefeitos, por sua vez, têm foro nos Tribunais de Justiça.
Para Barroso, o foro privilegiado “dá privilégio a alguns, sem um fundamento razoável”.
Ele explicou que, no caso do STF, os processos criminais consomem tempo exagerado de uma Corte que deveria se ocupar apenas com assuntos constitucionais. Segundo o ministro, o prazo médio para recebimento de uma denúncia pelo Supremo é de 565 dias.
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