- O Globo
Arminio Fraga acha que a dívida pública brasileira pode chegar a 90% do PIB. Mesmo assim, ele sente alívio no atual momento porque a crise poderia ter sido muito mais profunda. Admite que o Brasil “é uma aberração no quadro global” em termos de taxas de juros, mas defende que não existe caminho fácil, não doloroso, para se derrubar os juros para patamares dos países desenvolvidos.
A recuperação desta vez será lenta porque a economia está endividada e há muita incerteza, principalmente política, disse Arminio. Eu o entrevistei na Globonews sobre esse momento da economia e o debate travado com André Lara Resende sobre o nível de taxas de juros. O debate tem aspectos muito técnicos, mas, resumindo, André alertou em dois artigos já publicados no “Valor” que a nova teoria macroeconômica sustenta que juros altos demais, por tempo prolongado, podem ser a causa de inflação resistente e não seu remédio. Vários economistas discordaram, e ele esteve esta semana no Rio para um debate acadêmico sobre o assunto. Arminio se posicionou contra a tese de André neste momento e para o Brasil:
— Existe uma literatura que estuda as relações entre a política fiscal e a política monetária e que sugere que em certos casos muito extremos a política monetária pode ter resultado inverso ao usual.
Arminio lembra que o governo Dilma “escorregou feio” na área fiscal, e que agora se começa a corrigir o rumo através da reforma. Não há, diz, caminho mais fácil, não doloroso para enfrentar a crise brasileira.
Na visão de Arminio, a crise está cedendo devagar, apesar de ser, ao contrário do fim de outras recessões, um processo que vai ser muito demorado:
— Para mim é um momento de alívio, porque, há um ano, nós estávamos indo para uma crise bem mais profunda do que esta, que já é colossal. Agora a economia está dando sinais de que bateu no fundo do poço e que, em tese, poderia já projetar crescimento.
A visão de Arminio é que o avanço de reformas pode consolidar esse início de recuperação. A grande questão é como um governo vulnerável às investigações anticorrupção pode tocar uma pauta tão exigente, como a das reformas:
— Arriscaria dizer que isso tem a ver com o grau de consciência do tamanho do problema que estamos enfrentando. Há consciência de que o populismo deu errado e deixou sequelas gravíssimas e que isso requer providências mais profundas. Agora vem a reforma da previdência e a imprensa já fala em reforma tributária. Seria um salto de qualidade para a nossa economia.
Ele admite que do ponto de vista fiscal os indicadores vão continuar piorando. O teto de gastos demorará a fazer efeitos, as outras reformas em pauta não foram aprovadas, o déficit permanece alto demais e isso alimenta a dívida. Ela está atualmente em 70% do PIB, estava em 52% no começo do governo Dilma e deve continuar subindo. Arminio disse que há quem considere que pode chegar até a 100% do PIB. Ele acredita que deve ficar em 90%:
— O ideal talvez seria tomar providências e fazer um ajuste rápido. Inclusive porque isso daria mais espaço para os juros caírem. Esse sonho de o país voltar a ter uma taxa de juros mais normal estaria mais próximo de se realizar se o governo fizesse o ajuste.
O Brasil está em recessão há dois anos, o desemprego está muito alto e as taxas de juros, após dois cortes, estão em 13%. Perguntei se isso não é anormal:
— O Brasil é anormal e não é de hoje. Quando cheguei à presidência do BC, em 1999, a taxa de juros real era de 20%. Depois que a taxa de inflação, que tinha ido a 12%, se estabilizou, os juros reais caíram para 10%. Nós acreditávamos que ela cairia para 5%, real, taxa um pouco acima das do Chile e México, mas caiu para um nível abaixo desse. Para ter taxas mais baixas é preciso ter um governo arrumado e não há discordância entre ninguém sobre isso.
Esse é um dos vários dilemas atuais. Até que ponto os juros podem cair sem que o Brasil reviva o episódio recente de alta da inflação? Mas, neste momento em que o IPCA caiu rapidamente, a taxa de juros está, na verdade, subindo em termos reais. Arminio acha que é bom constatar a melhora, mas é preciso fazer um alerta: “nós temos muita dívida, essa dívida continua crescendo muito rápido e temos ainda muita incerteza. Não é hora de relaxar”.
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