O Federal Reserve americano está preparado para elevar de novo os juros nos Estados Unidos em junho, indicam as atas da mais recente reunião do banco. Poderá agir com mais tranquilidade e seguir a rota planejada (mais duas altas em 2017) depois que "declinou o otimismo dos investidores sobre a perspectiva de políticas fiscais expansionistas", isto é, um avanço rápido da reforma tributária do presidente Donald Trump. O aumento das taxas dos "fed funds" só não virá se dois eventos improváveis ocorrerem: a economia continuar fraca como no primeiro trimestre (avanço de 0,7% do PIB) ou a inflação fraquejar.
Os indicadores mais recentes apontam que o sazonalmente fraco primeiro trimestre já ficou para trás. Estimativas mais recentes calculam que a velocidade de crescimento está agora na casa dos 2,5%, enquanto que, para o segundo trimestre fechado, há projeções na casa de 4%. O próprio Fed considerou o esmorecimento do PIB no início do ano como transitório e acredita, segundo a ata, que ele crescerá "moderadamente mais rápido que o PIB potencial até 2019".
Uma das consequências disso é que a taxa de desemprego, que já é baixa, de 4,5%, continuará por um bom tempo menor que a da tendência de longo prazo, e as duas coisas juntas tendem a elevar gradualmente a inflação, se não ocorrerem sobressaltos no caminho. Isso vem acontecendo, dentro do esperado. O salário por hora do trabalhador americano evoluiu 2,75% nos doze meses encerrados em março, um ritmo ligeiramente maior que o dos doze meses encerrados em março de 2016.
O índice de preços ao consumidor (CPI) cheio atingiu 2,2% em abril, enquanto que o índice de despesas de consumo pessoal, o termômetro favorito do Fed, foi de 1,8% em março. Mas os núcleos estão comportados - 1,56% e 1,6% respectivamente. Se nada ocorrer de diferente, o Fed prevê inflação na meta de 2% só em 2019.
As demais peças da economia estão em seu lugar. O consumo, que também esmorecera nos primeiros três meses do ano, voltou a exibir força e encerrou os doze meses findos em abril em 4,5%. Os investimentos das empresas, tímidos e relutantes nos últimos dois anos, se "firmaram" no primeiro trimestre. Os riscos do cenário externo, por seu lado, diminuíram. A derrota da direita xenófoba francesa de Marine Le Pen contribuiu para isso, mas alguns membros do Fed ainda vêem ameaças de tumultos geopolíticos e problemas nos países emergentes decorrentes da própria normalização monetária nos Estados Unidos.
As expectativas do mercado voltaram-se nervosamente para o Fed depois que Trump começou a formatar, ainda que de forma amadora, sua política fiscal de corte de impostos para os mais ricos, aumento dos gastos de defesa e um programa de US$ 1 trilhão de investimentos em infraestrutura. As dificuldades de Trump no Congresso, com sua derrota na primeira tentativa de derrubar o Obamacare - ele foi bem sucedido na segunda - convenceram os investidores de que os estímulos fiscais não viriam tão rapidamente. Agora, com o polêmico orçamento apresentado, e com o ranger de dentes da ala ortodoxa republicana, afigura-se uma batalha que acabará por conter os elevados rombos nas finanças públicas que as propostas de Trump trariam, se aprovadas integralmente. Até membros do partido de Trump acham que o orçamento não para em pé, depois de Trump ter encontrado a pedra filosofal da reforma tributária - o de que os cortes de impostos pagam-se por si sós e não têm custos.
Que alguma coisa sairá do baú orçamentário de Trump não há dúvida, tanto que o Fed conta em suas projeções com a perspectiva de que "as políticas fiscais se tornarão mais expansionistas nos próximos anos". Isso pressionará de alguma forma ainda não mensurável a política monetária, pois "tanto seu tamanho, composição e timing permanecem altamente incertos", segundo a ata.
Uma gradual e tranquila normalização da política monetária dos Estados Unidos é um dos fatores chaves para que o Banco Central brasileiro possa continuar empurrando para baixo os juros, agora diante de um cenário de pesadelo político e risco de aborto da recuperação econômica. O fim precipitado do "interregno benigno" externo seria um terrível fardo a carregar quando já há suficiente tumultos políticos e econômicos domésticos. Uma aceleração do cronograma dos juros do Fed poderia deixar ainda mais ressabiados os investidores em relação às perspectivas brasileiras.
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