Algumas importantes vítimas da crise fiscal nem sempre ganham a devida visibilidade. Um desses casos é o do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) que desde o início da década passada vem enfrentando cortes de orçamento, esvaziamento do quadro de pessoal, pesquisas adiadas e, naturalmente, críticas e desconfianças do público que consome seus importantes levantamentos.
O problema mais recente foi a revisão dos dados da Pesquisa Mensal do Comércio (PMC) e da Pesquisa Mensal de Serviços (PMS), no início do ano, por conta de uma mudança de metodologia, que desorientou as análises econômicas e as previsões. Os especialistas questionaram as alterações com severidade e queixaram-se de que não foram fornecidos elementos que permitissem a comparação com dados de anos anteriores, prejudicando uma avaliação analítica da tendência e a elaboração de projeções para a economia. O problema foi atribuído a mais um deslize provocado pelos problemas econômicos do instituto.
Nos últimos anos, alguns questionamentos semelhantes ocorreram. O mais grave foi em 2014, quando a ex-ministra-chefe da Casa Civil do governo de Dilma Rousseff, Gleisi Hoffmann, reclamou da disparidade de números entre a recém-lançada Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua e a Pesquisa Mensal de Emprego (PME) a propósito das informações que subsidiam a divisão de recursos do Fundo de Participação dos Estados. A então presidente do IBGE, Wasmália Bivar, suspendeu a pesquisa sem consultar o corpo técnico, duas diretoras pediram demissão e funcionários ameaçaram entrar em greve.
A confusão foi amplificada pela oposição, que levantou suspeitas de uso político da pesquisa uma vez que mostrava aumento do desemprego e da inflação, questionando a imparcialidade do instituto, um dos seus mais valiosos ativos em seus 80 anos de existência. Alguns meses depois, a pesquisa foi retomada e sobreviveu, mas outras ficaram para trás por problemas de orçamento e falta de funcionários. Entre elas, a Contagem da População, importante para a divisão do Fundo de Participação dos Municípios (FPM); e a Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF), que ajuda na construção das ponderações dos indicadores de inflação, registrando os novos hábitos de consumo. O Censo Agropecuário, esperado desde 2012 e, depois previsto para 2016, também foi seguidamente adiado e deve ser feito neste ano - se tudo der certo. A última Contagem da População, que deveria ocorrer entre os censos, foi feita em 2007; e o Agropecuário, em 2006.
As justificativas recorrentes para o atraso das pesquisas são a redução do número de funcionários do IBGE e o corte de orçamento. Ao longo da década de 1990 praticamente não houve entrada de novos quadros. O quadro de servidores permanentes recuou de perto de 7 mil em 2010 para 5,6 mil no ano passado, enquanto o número de aposentados apresentou o quadro inverso e passou, no mesmo período, de 5,5 mil para 7 mil funcionários (Valor 11/5).
O orçamento chegou a recuar de R$ 2,8 bilhões em 2010 para cerca de R$ 1,5 bilhão em 2011 e 2012, foi se recuperando gradualmente. Neste ano, a verba prevista para o IBGE nas contas federais é de R$ 2,99 bilhões. A folha de pagamentos absorve quase dois terços desse total, que ainda inclui dotação extra de quase R$ 500 milhões para a realização do Censo Agropecuário. Além disso, o instituto deverá atender demanda extra do Supremo Tribunal Federal (STF) que quer uma atualização do censo carcerário.
O atual presidente do IBGE, Paulo Rabello de Castro, cuja indicação foi questionada pela Associação Nacional dos Servidores do IBGE (AssIBGE-SN) por sua origem no setor privado, tem uma visão diferente. Ele comemorou o crescimento do orçamento, os investimentos em equipamentos e veículos e está comprometido com a realização do Censo Agropecuário. Mas defende um foco maior na qualidade do que na quantidade. Sua intenção é ampliar a produtividade. "O IBGE e o serviço público terão de ser criativos, fazendo mais com menos", afirmou ao Valor. Pensa ainda em seguir o exemplo de institutos semelhantes de outros países, que obtêm receita com a oferta de serviços à iniciativa privada. Pode ser uma alternativa interessante. Outros órgãos fazem pesquisas para uso comercial por empresas. O mais importante, porém, seria construir uma estrutura de financiamento estável das atividades do instituto.
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