Lava-Jato reúne documentos que reforçam ligação de ex-presidente com sítio de Atibaia
O Ministério Público e a defesa do ex-presidente da OAS Léo Pinheiro apresentaram documentos que tendem a dificultar a situação jurídica do ex-presidente Lula na reta final para seu julgamento em Curitiba. Papéis mostram como Lula, diferentemente do que disse em depoimento ao juiz Sergio Moro, se envolvia em decisões da Petrobras. Agendas indicam 27 encontros dele com diretores da estatal. Troca de mensagem anexada ao processo também mostra como a OAS participou das obras no sítio de Atibaia e no tríplex do Guarujá.
Novos elementos
Lava-Jato apresenta documentos que aproximam ainda mais Lula da OAS e da Petrobras
Cleide Carvalho e Dimitrius Dantas | O Globo
-SÃO PAULO- Finalizados os depoimentos no processo que investiga a ligação entre o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e um tríplex no Guarujá, a força-tarefa da Lava-Jato corre contra o tempo para incluir novas provas no processo antes das alegações finais. Ontem, o Ministério Público Federal e o ex-presidente da OAS Léo Pinheiro apresentaram documentos que podem dificultar a situação jurídica do petista.
A força-tarefa apresentou papéis que indicam pelo menos 27 encontros entre Lula e diretores da Petrobras, após ele negar ao juiz Sergio Moro que interferia nos negócios da estatal. Por sua vez, Pinheiro, em negociação de colaboração premiada, enviou mensagens que reforçariam o envolvimento de Lula na reforma do sítio em Atibaia. Embora não tenha relação com o apartamento, documentos estão sendo incluídos como contraprova ao que disse Lula na ação.
O ex-presidente da OAS apresentou à Justiça uma troca de mensagens com Paulo Gordilho, exdiretor da empreiteira, com comentários sobre obras de infraestrutura no lago do sítio: “Léo, amanhã vou pra o nosso tema esvaziar o lago para impermeabilizar. Eles, eu soube que vão estar lá para acompanhar a despesca. Mas não tenho certeza. Se desejar podemos combinar”. No dia seguinte, segundo dados do Portal da Transparência, seguranças da Presidência da República estiveram no sítio que teve reformas bancadas pela empreiteira.
A mensagem foi enviada em 6 de junho de 2014 por Paulo Gordilho, que é arquiteto e teria sido responsável pelas reformas no tríplex e no sítio em Atibaia. Quatro seguranças da Presidência que acompanham o ex-presidente Lula e sua família após o fim do mandato estavam em Atibaia no dia seguinte, de acordo com diárias pagas pela Presidência. Misael Melo da Silva, Rogério dos Santos Carlos, Edson Antonio Moura Pinto e Elias dos Reis estavam na cidade durante o período. Os dois primeiros foram para a cidade do interior ainda no dia 6 e os outros dois, no dia seguinte. A força-tarefa também apresentou fotos do arquivo pessoal de Gordilho que mostram Lula e Léo Pinheiro que, “ao que parece”, foi capturada no sítio em Atibaia, diz o documento da PF. Imagens também mostram Lula com Gordilho.
Em seu depoimento ao juiz Sergio Moro, Léo Pinheiro citou que, em uma conversa com o expresidente sobre a propriedade, Lula teria relatado problemas em relação a uma barragem e dois lagos. A mudança de estratégia do executivo ocorreu em meio à negociação de delação premiada com o Ministério Público Federal.
Enquanto a Odebrecht fez a ampliação da área habitável da propriedade, ampliando a construção em mais quatro suítes e uma adega, a OAS ficou responsável pela contenção do lago, que estava perdendo água e precisava de uma nova barragem. A empresa também instalou móveis planejados na cozinha do sítio, comprados da Kitchens, a mesma fornecedora dos móveis instalados no tríplex do Guarujá. Em nota, a defesa do ex-presidente Lula afirmou que os documentos nada provam, “seja pelo conteúdo, seja pela discutível idoneidade”. Os advogados reafirmaram que Lula não é dono do tríplex e não recebeu qualquer vantagem indevida.
“Os papéis — mesmo sem qualquer relevância para a ação — fazem parte da tentativa de Léo Pinheiro de agradar os procuradores em troca do destravamento de sua delação, para que ele possa obter benefícios”, afirmaram os advogados do ex-presidente Lula.
Além de Léo Pinheiro, o Ministério Público Federal também adicionou novas informações ao processo. A força-tarefa anexou documentos que mostram pelo menos 27 encontros entre o petista e diretores da Petrobras entre 2003 e 2010. Em depoimento a Sergio Moro, Lula disse não se sentir responsável pela corrupção na Petrobras porque o governo não participaria, segundo ele, da administração da estatal.
Os temas discutidos foram de investimentos em refinarias a projetos incluídos no Programa de Aceleração do Crescimento. Os procuradores querem mostrar que Lula acompanhava de perto os projetos da estatal.
Ao juiz Sergio Moro, Lula disse que não tinha reuniões específicas com diretores e discutiu apenas o leilão do pré-sal e plano estratégico:
— A gente (os presidentes da República) não têm reunião com a diretoria da Petrobras. Eu fui em dois momentos: para decidir que não ia fazer leilão do pré-sal e para discutir plano estratégico. Você não tem reunião específica com diretor.
Também ao depor em Brasília, em março passado, Lula afirmou que não conheceu pessoalmente Nestor Cerveró, ex-diretor da área internacional. Nesse processo, que corre na Justiça Federal de Brasília, Lula é acusado de tentar obstruir investigações da Lava-Jato e comprar o silêncio de Cerveró.
Na agenda anexa ao processo de Curitiba, consta que o então diretor acompanhou José Sergio Gabrielli, ex-presidente da Petrobras, em fevereiro de 2008 numa viagem de Lula à Argentina, quando o presidente discutiu com a então colega argentina Cristina Kirchner e Evo Morales (Bolívia) a crise no fornecimento do gás boliviano. As reuniões entre Paulo Roberto Costa e Lula eram frequentes. O então diretor da Petrobras acompanhou Lula em uma viagem à Arábia Saudita e China, em maio de 2009. Na agenda de Costa aparecem jantares com Lula no dia 16 de maio, quando a comitiva estava em Riad, capital da Arábia Saudita, e em Pequim, a capital chinesa.
A agenda revela ainda um almoço de Lula com Renato Duque, então diretor de Serviços da Petrobras no dia 8 de novembro de 2007, na sede da empresa. Nessa data, o presidente Lula participou de uma reunião do Conselho Nacional de Política Energética (CNPE), na sede da Petrobras, no Rio, antes de ir para o Chile.
A proximidade da diretoria da Petrobras com o governo é revelada também com as menções na agenda ao ex-ministro José Dirceu. Renato Duque, por exemplo, organizou o encontro de José Eduardo Dutra, que presidiu a Petrobras, com o dono de uma empresa de comunicação com a anotação “amigo de José Dirceu”.
AGENDA DEVE SER AFERIDA, DIZ DEFESA DE LULA
No processo, os advogados de Lula buscam apresentar documentos da OAS. A empreiteira utilizou o apartamento 164-A na lista de suas propriedades como garantia em empréstimos tomados pela empresa. Segundo a defesa, a OAS sempre exerceu todos os atributos inerentes à propriedade do imóvel, inclusive fazendo uso do tríplex em operações financeiras, conforme mostram as demonstrações financeiras e relatórios de auditoria correspondentes.
Em relação à agenda, Cristiano Zanin Martins e Valeska Teixeira Martins, advogados de Lula, afirmaram em nota que não há nos autos qualquer “agenda”, mas papel intitulado agenda e cuja idoneidade deverá ser “aferida pelas vias próprias”. Segundo eles, não é competência do juízo de Curitiba qualquer apreciação de políticas públicas discutidas pela Presidência da República, inclusive na área de petróleo.
“Lula, no exercício do cargo de Presidente da República, sempre respeitou a Constituição e as leis. A prova colhida no processo, por meio do depoimento de 73 testemunhas ouvidas com a obrigação de dizer a verdade, mostra de forma clara a inocência do ex-presidente Lula".
A defesa lembrou que Paulo Roberto Costa, uma das testemunhas, afirmou que nunca teve intimidade com Lula e que sempre teve reuniões com a participação do presidente da Petrobras ou da diretoria da estatal.
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