Por Raymundo Costa | Valor Econômico
BRASÍLIA - Vencida a batalha do TSE, a guerra não acabou para o governo Michel Temer. Ao lado da frente judicial, a recomposição da base aliada passou a ser uma empreitada decisiva, pois é no Congresso que se dará o embate final, a votação do pedido de autorização da Câmara dos Deputados para o Supremo Tribunal Federal (STF) processar o presidente da República.
O Ministério Público Federal promete fazer a representação ao STF nos próximos dias e,em princípio, a batalha da Câmara não deveria representar maior dificuldade para Temer. A base aliada conta com 412 votos nominais na Câmara, sendo que 312 sempre votam com o governo. Temer precisa de apenas 171 votos para barrar o processo.
É o procurador-geral Rodrigo Janot que precisará reunir os 342 votos necessário à aprovação do pedido, mesmo quórum exigido para a abertura de processos de impeachment. À época do impedimento de Dilma, o PT reconhecia que o presidente que não consegue um terço da Câmara não teria mesmo condições de governar.
Temer e seus aliados diziam o mesmo. Agora precisam combater os primeiros sinais de erosão da base aliada. Após a defecção de pequenos partidos, entre os quais o PPS e o PSB, que têm ministros no governo, a ameaça mais séria é a deserção do PSDB, o aliado que tem mais a perder (se o governo der errado) ou a ganhar (se o governo der certo) com a manutenção de Temer.
O PSDB marcou para hoje mais uma reunião para tentar definir um rumo. No fim da semana passada, os tucanos pareciam decididos a sair. Mas eles têm seus próprios problemas para resolver, antes de botar o PMDB na parede: tanto quanto Temer, o ex-presidente do partido saiu queimado das delações dos executivos do grupo JBS.
Divididos, os tucanos mais uma vez podem adiar uma decisão ou tentar uma solução que ao mesmo tempo os deixe de bem com o governo e com a opinião pública. A aposta do Palácio do Planalto é que o PSDB fica, porque Temer seria a única alternativa para a aprovação das reformas trabalhista e previdenciária, uma agenda cara ao partido.
Ontem, o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, afirmou que o partido pode manter o apoio ao governo, mas sem cargos. "O nosso apoio não se discute, isto é unânime, ter ministro ou não é secundário", disse. Segundo Alckmin, "é importante proteger o Brasil". "O país estava começando a se recuperar e a curto prazo o que se precisa fazer é acelerar as reformas". Para o governador paulista, seria viável aprovar a reforma da previdência ainda este mês.
No trabalho de recomposição da base, o governo tenta também desfazer a ideia de que é possível fazer as reformas por meio de um "pacto congressual" ou "parlamentarismo branco" com um presidente fraco no Palácio do Planalto. "Não existe reforma da Previdência sem Temer", disse um auxiliar do presidente ao Valor.
O Planalto também procura desfazer a ideia de se limitar o alcance das reformas, como aprovar só a idade mínima para a Previdência. O PSDB encomendou até um estudo nesse sentido. É um argumento que enfraquece Temer no trabalho de recomposição, pois, se a reforma pode ser deixada para o próximo governo, seja ele qual for, não restaria muito por que brigar pelo presidente.
"Não é verdade que qualquer vitória na Previdência é resultado capaz de salvar o país", disse ao Valor o ministro Moreira Franco (Secretaria Geral da Previdência), um dos principais auxiliares do presidente. "A reforma do presidente não pode ser igual à que foi feita nos governos de Fernando Henrique Cardoso e Luiz Inácio Lula da Silva, passar a qualquer preço".
Segundo Moreira, "hoje a ameaça é o que ocorre no Rio de Janeiro e outros Estados [atrasos no pagamento dos servidores]. Por isso o governo está empenhado em manter uma negociação séria em torno do parecer do relator", disse.
O que deixa o governo mais tranquilo é que a média do apoio ao Planalto aumentou nas duas semanas seguintes à divulgação do áudio gravado de uma conversa de Temer com o empresário Joesley Batista. Na Câmara, segundo levantamento encomendado pelo site Poder360 a um centro da FGV Direito Rio, subiu de 72% para 73,5% o apoio ao governo entre os deputados.
No período, o Planalto conseguiu aprovar uma dezena de medidas provisórias que se encontravam paradas na Câmara, e fez andar no Senado a reforma trabalhista, aprovada na Comissão de Assuntos Econômicos.
No Palácio do Planalto há dúvidas se o procurador Rodrigo Janot apresentará a denúncia contra o presidente nesta ou na próxima semana, como indicam fontes do Ministério Público Federal.
Entre auxiliares próximos do presidente existe a convicção de que a Polícia Federal não conseguirá concluir a perícia técnica nos áudios de Joesley.
A expectativa do governo é que Janot não vai denunciar o presidente, sem ter em mãos o resultado da perícia da Polícia Federal. Poderia ser desmoralizado mais tarde por um resultado que eventualmente venha a apontar problemas de edição dos áudios. Seja qualquer for o movimento do procurador-geral, Temer pretende combater em todos os espaços jurídicos para retardar uma decisão.
Na avaliação feita no Palácio do Planalto o que está em jogo é um de três projetos de poder: o PT tira proveito eleitoral de "Fora Temer", combate a aprovação de medidas impopulares e fulaniza a disputa com a candidatura de Lula a presidente; Temer usa o "velho da política para fazer o novo na economia" e propõe que as leis resolvam os conflitos (não tenta acabar com a Lava-Jato, por exemplo); e o terceiro é o do Ministério Público que julga o sistema podre e quer jogar a política e os políticos na vala comum da corrupção.
Ontem, Temer se reuniu com Moreira Franco e o líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR). (colaboraram César Felício e Lucas Marchesini)
Nenhum comentário:
Postar um comentário