72% da captação dos bancos financia a dívida pública
O investimento público federal foi de apenas R$ 11,4 bilhões nos cinco primeiros meses do ano, com uma queda real de 46% sobre os já modestos R$ 21,1 bilhões realizados em igual período do ano passado. Na área de transportes (rodovias, portos, ferrovias) a retração foi da ordem de 50%. Para uma economia que não cresce, e que sempre que tenta crescer enfrenta escassez de oferta de bens e serviços, essa é uma péssima notícia.
Uma olhada sobre as grandes despesas da União confirma a rigidez do Orçamento e deixa claro onde o governo concentra o corte do gasto para cumprir a meta fiscal.
O gasto total este ano até maio foi de R$ 498,84 bilhões. Deflacionado pelo IPCA isso significou queda real de 1,1% sobre o realizado nos cinco meses de 2016.
No bloco das grandes despesas, duas cresceram: aposentadorias e salários. O pagamento de benefícios previdenciários aos aposentados do INSS somou R$ 208,72 bilhões (excluídos os precatórios), com expansão real de 5,1% sobre o mesmo período do ano passado. A folha de pessoal de ativos e inativos do setor público federal foi de R$ 110,03 bilhões (sem precatório). Os reajustes salariais concedidos em 2016 pelos governos de Dilma Rousseff e Michel Temer aumentaram as despesas de pessoal em 7,6% reais no período. Previdência e folha de pagamento, portanto, consumiram 64% do gasto.
Os orçamentos da educação e saúde registraram queda real de 22,3% e 2,5%, respectivamente. A despesa da educação foi de R$ 11,27 bilhões em comparação com os R$ 14,5 bilhões em igual período do ano passado. Na saúde o gasto somou R$ 39,32 bilhões, abaixo dos R$ 40,32 bilhões do ano anterior.
A Constituição determina um investimento mínimo de 18% da receita líquida em educação e de 13,2% na saúde. Esse limite, porém, só é calculado no fim do exercício. No passado o governo ultrapassou os valores constitucionais para essas duas áreas. Este ano isso não deve ocorrer.
A Confederação Nacional da Indústria (CNI) dedicou o número 1 da nova publicação, intitulada "Fato Econômico", ao exame da execução orçamentária da União justamente para chamar a atenção para a situação dos gastos federais em geral e dos investimentos públicos em particular. E para alertar que, com a lei do teto do gasto, a expansão da despesa com seguridade social e com folha de salário do servidor significará redução dos recursos para as demais áreas do Orçamento. A vítima recorrente é o investimento, cuja anemia levará ao corte de outras despesas.
"O Brasil tem que botar na cabeça que há um Orçamento e isso significa fazer escolhas", comentou o economista Flávio Castelo Branco, da CNI. Como os investimentos são os principais alvos das restrições fiscais, eles "começam mas não acabam", levando a um brutal "desperdício de recursos", completou.
Tão importante quanto o tamanho do ajuste fiscal - e todo o esforço do governo é para manter o déficit primário em R$ 142 bilhões este ano - é a sua composição. Os gastos obrigatórios consomem 80% do Orçamento, sendo que 41% é destinado ao pagamento de benefícios previdenciários dos trabalhadores do setor privado e 21% vai para a folha de salários e inativos do setor público. O restante é para alocações carimbadas por normas legais.
As despesas discricionárias, que ficam com 20% do Orçamento, caíram 18% até maio, para R$ 91 bilhões. Mesmo as obrigatórias, além de Previdência e salários, tiveram contração real de 13,6%, para R$ 76,4 bilhões este ano, cita o texto da CNI. Os cortes foram de 21% no abono salarial, de 29% na compensação ao Regime Geral da Previdência Social (RGPS) pelas desonerações da folha de pagamento e de 26,3% nos subsídios.
Por todos os ângulos que se vê, a Previdência Social é a despesa pública mais pesada e a que mais cresce. A soma do regime geral do INSS com a previdência dos funcionários públicos federais corresponde a 50,4% do gasto previsto para este ano. Sem a reforma, em dez anos esse percentual chegará a 71%. Com a reforma sobe menos, para 61%, conforme previsão do Ministério da Fazenda. De pouco adianta restringir só os gastos do INSS. O problema mais grave e mais injusto está na previdência do servidor público.
Além dos desequilíbrios encontrados na avaliação das contas da União, uma visão macro da questão fiscal também conduz a conclusões graves. O corte dos gastos hoje e nos próximos anos é para frear o crescimento do déficit primário. Enquanto houver déficit, a dívida pública será crescente e os juros estruturais elevados.
A deterioração fiscal, que está na raiz da crise econômica dos últimos quatro anos, teve efeitos dramáticos sobre a poupança que deveria financiar a expansão do investimento. A taxa de poupança média de 18,2% do PIB entre 2010 e 2013 despencou para 13,9% do PIB no ano passado, segundo dados do Centro de Estudos do Mercado de Capitais (Cemec). Isso decorreu da despoupança do setor público (de 6% do PIB), que passou a gerar déficits e a agravar a trajetória da dívida como proporção do PIB. A poupança do setor privado, ao contrário, subiu de 17,47% para 19,9% do PIB. A dívida pública que representava 50,8% do PIB em 2013, hoje corresponde a 72% do PIB.
Cerca de 72% de todos os recursos captados pelo sistema bancário estão aplicados em títulos da dívida pública, segundo o Cemec. Ou seja, boa parte da poupança financeira está custeando o endividamento do setor público em detrimento do investimento privado.
O investimento público caiu de 2,7% do PIB em 2013 para 1,8% do PIB em 2016 e o privado diminuiu de 19% para 13,7% do PIB, levando a taxa de investimento para magros 15,4% do PIB.
Objetivamente, com o setor público drenando boa parte da poupança para cobrir seus "rombos" e frente à redução do déficit externo em conta corrente, os recursos para financiar a expansão dos investimentos são escassos. E é do aumento dos investimentos privados que se espera a retomada do crescimento. Enquanto o governo e o Congresso não solucionarem a crise política e o "rombo" fiscal, o crescimento será miragem.
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