A melhor solução é com frequência a menos popular, e isso mais uma vez se confirma, neste momento, com a decisão do governo de cobrar mais imposto sobre combustíveis e congelar mais R$ 5,95 bilhões do Orçamento. Poderia ter escolhido um remédio mais palatável, aceitando um rombo maior que R$ 139 bilhões nas contas primárias – sem os juros – do poder central. Ficaria menos vulnerável a críticas oportunistas, mas enviaria um péssimo recado a investidores, operadores de mercado, empresários sérios, avaliadores de crédito e, é claro, consumidores informados e capazes de avaliar as perspectivas com algum realismo. Acabaria desperdiçando parte do ajuste realizado até agora e complicando a travessia dos próximos anos. A reativação econômica, apenas iniciada no primeiro semestre, estaria em risco.
Reafirmar o compromisso com a meta fiscal é ainda a melhor maneira de preservar a confiança na economia e de reforçar a expectativa de inflação em queda. O efeito inflacionário do maior tributo sobre combustíveis será muito limitado, se outras pressões continuarem contidas e se o consumidor resistir à especulação. Aumentos especulativos têm ocorrido em outras ocasiões, mas desaparecem quando rejeitados pelo público.
Preços da gasolina, do diesel e do álcool têm oscilado, desde a implantação da nova política na Petrobrás. Os aumentos pouco afetaram a evolução do conjunto de preços. Quem alardeia inevitáveis e catastróficos efeitos em cascata comete um atentado ao interesse público. Criar entre os consumidores a expectativa de uma sequência inevitável de repasses é irresponsabilidade e, em alguns casos, evidente má-fé.
Economistas de mercado admitiram uma revisão das projeções de inflação para este ano. Um deles mencionou uma elevação de 3,6% para 3,7%, mesma estimativa do governo. Se novas elevações de preços ocorrerem, comentou outro profissional citado pelo Estado, o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) ainda poderá ficar abaixo da meta oficial de 4,5%.
Mas a avaliação do efeito sobre o conjunto de preços é só uma parte do debate relevante sobre as novas medidas do governo. É preciso entender por que o presidente Michel Temer e a equipe econômica decidiram recorrer a uma tributação maior. A escolha do PIS-Cofins sobre combustíveis é explicável pela facilidade e pela rapidez do efeito, mas a questão central é outra. Aumentar o peso do tributo, uma solução evitada até esta semana, tornou-se inevitável pela conjugação de vários fatores. A arrecadação, embora tenha melhorado consideravelmente em junho, ainda reflete uma recuperação econômica apenas iniciada e insuficiente para recompor a receita fiscal. Ingressos adicionais têm sido frustrados ou tornaram-se incertos. A deformação do novo Refis na Comissão Mista do Congresso pôs em risco uma arrecadação prevista para este ano de R$ 13,3 bilhões. O governo ainda pode tentar reverter essa perda, mas seria arriscado adiar qualquer outra providência.
Segundo o novo relatório bimestral de receitas e despesas, divulgado ontem, a arrecadação primária de 2017 será R$ 5,79 bilhões menor que a estimada no bimestre anterior, com recuo de R$ 1,386 trilhão para R$ 1,38 trilhão. Ao mesmo tempo, no entanto, a projeção da despesa primária, isto é, sem juros, subiu de R$ 1,289 trilhão para R$ 1,294 trilhão, com aumento de R$ 4,61 bilhões. Sem o bloqueio adicional de R$ 5,95 bilhões nos gastos programados, o déficit primário estimado para o ano chegaria a R$ 144,95 bilhões. O novo corte poderá ser suspenso, se as finanças federais melhorarem, mas isso parece improvável neste momento.
O protesto de entidades empresariais contra o novo aumento de impostos – já haviam manobrado contra a reoneração da folha de vários setores – é tão irrealista quanto mal fundamentado. Os escandalosos benefícios fiscais distribuídos no período petista devastaram as finanças públicas e nunca favoreceram o desenvolvimento nem, portanto, a maior parte das empresas e dos trabalhadores. O déficit de seriedade pode ser mais assustador que o déficit fiscal.
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