- Valor Econômico
Simplória, a estética do Patriotas parece eficiente
O hino dos campos de futebol, "sou brasileiro com muito orgulho, com muito amor", que precisou ter carimbo da censura para divulgação nos anos 1970, virou pano de fundo para a campanha presidencial do deputado federal Jair Bolsonaro (PSC-RJ). O presidente do partido para onde o deputado está de mudança decidiu incorporá-lo ao programa que foi ao ar na noite de terça-feira porque é com ele que o pré-candidato é recebido nos aeroportos das cidades que visita.
Vereador de Barrinha, município de 30 mil habitantes da Região Metropolitana de Ribeirão Preto, Adilson Barreto, o presidente do novo Patriotas, está para se tornar o dono do passe do candidato. Bolsonaro já teria a carta de liberação de seu atual partido mas a adesão tarda porque o candidato teme que o ministério público lhe tome o mandato por infração à fidelidade partidária. Se o condenaram por ofensa a quem o chamou de estuprador, explica, podem tudo.
Aguardam ambos a janela partidária a ser aprovada na reforma política. Pela brecha, o presidente do Patriotas pretende arregimentar pelo menos mais dez para sua bancada de atuais três deputados federais. Se o Congresso vetar a migração agora, o estouro da boiada vai ter que passar pela janela de março. O adiamento não o impedirá de usar os dez minutos de propaganda partidária gratuita que ainda tem na televisão até o fim de dezembro para divulgar o seu candidato.
Simplória, a estética da largada ainda claudica na regência, mas parece eficiente. Dos cinco populares recrutados para falar de roubalheira, dificuldades para estudar e falta de remédio nos hospitais, quatro são negros. A trilogia é fé, amor e patriotismo. O futuro se revela assustador e o sonho se transforma em pesadelo. Por isso, chegou a hora de se posicionar. Sob a bandeira desfraldada, o locutor proclama: o país precisa de ordem para garantir seu progresso. Um Brasil limpo e patriota precisa dar voz a quem grita por ordem, segurança e justiça social. O programa de cinco minutos fecha com banner de delegacia: o Brasil acima de tudo, Deus acima de todos.
O candidato aparece percorrendo o país, sob a ovação de mito, mito, mito, mas permanece silente pela ausência de filiação ao Patriotas. Deve soltar a voz nas inserções que ainda terá este ano, dessas que aparecem na televisão quando ninguém espera. Até lá continuará a se valer das redes sociais que o ajudaram a cativar o quinto eleitoral conquistado.
O presidente do partido fala pelos dois. Mineiro, cortador de cana na juventude e evangélico da Assembleia de Deus Ministério do Campo de Ribeirão Preto, o vereador criou o PEN, hoje Patriotas, em 2012. Seis anos antes, tinha perdido a presidência estadual do PSC, partido pelo qual chegou a ser eleito para a Assembleia Legislativa de São Paulo. Garante que não teve uma única assinatura de crente. As listas deixadas nos templos misteriosamente findavam em branco no fim do dia. Pôs-se a peregrinar com a ajuda de antigos correligionários e conseguiu o quórum que, em 2014, derrotou o Rede de Marina Silva. Atribui o feito à ajuda de deus para quem cedo madruga.
O programa do partido não está disponível em sua página na internet. A aba destinada aos projeto da legenda está vazia. Indagado sobre as propostas do Patriotas para a Previdência, seu presidente se abstém. Diz que é Bolsonaro, ainda não filiado, quem vai conduzir as diretrizes do partido. Cabe ao deputado que tem o mandato, explica, saber como deve votar. O que seu candidato disser, será.
Conta ter resistido ao assédio de caciques partidários do Centrão, interessados no passe do presidenciável. Atribui a escolha pelo Patriotas por ser esta uma das duas legendas, entre as 28 representadas na Câmara dos Deputados, que não tem envolvidos na Lava-Jato, ainda que uma ação, ainda em nome do PEN, tenha sido patrocinada no Supremo para impedir a prisão em segunda instância.
Desde que o programa foi ao ar anteontem, seu telefone não para de tocar. Umas pessoas querem doar para o partido, outras buscam informações para se filiar. Não acha que as bravatas do general Mourão vão incentivar carreiras políticas da farda, mas tem, sim, recebido muitas consultas de policiais de todas as patentes.
Não se inquieta com a ausência de capilaridade da sigla nem com pedágios que venham a ser colocados pela reforma política. Do seu púlpito telefônico, tira a explicação de que onde deus abre a porta, homem nenhum fecha. Tampouco o preocupa a cláusula de barreira ou a ausência de recursos para a campanha porque, para encerrar a pregação, garante que deus proverá.
A pista de Congonhas
A licitação de um terreno no Aeroporto de Congonhas às vésperas do processo de concessão desgostou os interessados no investimento, mas abriu novas pistas à sucessão presidencial. A disputa pela área, equivalente a quatro campos de futebol, teve um único concorrente e foi vencida por um consórcio encabeçado pela Leroy Merlin, conglomerado francês que, no Brasil, é gerido pelo empresário Helio Seibel. Por R$ 40 milhões, o consórcio, formado ainda por uma incorporadora australiana, ganhou o direito de explorar a área por 25 anos, contrariando o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, que pretendia arrecadar R$ 6 bilhões com a concessão do aeroporto de porteira fechada. Carlos Roberto Siqueira Castro, sócio de escritório de advocacia que já assessorou a concessão de seis aeroportos brasileiros, não viu nenhum deles ser desprovido de ativo semelhante às vésperas da publicação de um edital. O Lide, empresa de eventos de João Doria, hoje comandada por seu filho, premiou a Leroy Merlin, por dois anos consecutivos, como a melhor empresa de varejo do país. O prefeito de São Paulo, que se orgulha de ter feito sua campanha quase que exclusivamente com seus próprios recursos, teve, em Seibel, seu maior doador, com uma módica contribuição de R$ 50 mil. A fatura do negócio apressado tem sido cobrada do PR, que hoje comanda tanto o Ministério dos Transportes quanto a Infraero, mas o partido de Valdemar Costa Neto ainda aguarda o desenrolar do leilão dos palanques de 2018. Oscila entre a Secretaria de Meio Ambiente da prefeitura e a pasta de Esportes do governo Geraldo Alckmin. Foi na pista, ora desimpedida, entre o Anhangabaú e a Praça dos Três Poderes, que o negócio decolou.
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