- Valor Econômico
Vencida a denúncia, Temer quer reforma e arrumar sucessão
O Palácio do Planalto espera um resultado similar à votação da primeira denúncia, quando 263 deputados responderam não ao pedido de autorização do Supremo Tribunal Federal (STF) para investigar e processar o presidente Michel Temer. Especialista em votações na Câmara, o ministro Eliseu Padilha (Casa Civil) trabalha com uma variação de 10% para mais ou para menos, o que significaria cerca 237 votos no piso inferior e 289 na banda superior. Para Eliseu Padilha não será surpresa se der uma variação positiva.
Num caso ou noutro, o governo do presidente Temer sai da segunda votação acreditando que pode tocar a reforma da Previdência, a partir da próxima semana. "O clima tanto no plenário quanto na rua mudou muito", segundo o ministro da Casa Civil. Na opinião dele, o momento é agora. "Fica mais difícil quanto mais próximo da eleição". Os números são "terríveis" - a expressão é de Padilha - com um salto no déficit previdenciário de R$ 55 bilhões de 2017 para 2018. É o que está no Orçamento.
A expectativa no Palácio do Planalto é que o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), assuma a condução desse processo, tão logo seja votada a denúncia. Não será apenas um trabalho de "mobilização", no qual o governo Temer tem mostrado competência, mas também de "conscientização". Hoje parece mais claro a Padilha que a necessidade da reforma é bem mais compreendida do que à época em que o governo enviou o projeto. E uma reforma que terá de ser feita mais cedo (atual governo) ou mais tarde (o governo a ser eleito em 2018).
Pelo histórico, convém não duvidar do governo Temer, que em geral costuma entregar o que promete, quando o assunto envolve votação do Congresso. Mas também não há como negar que o mundo deu uma volta completa entre 17 de maio, quando foi divulgado o áudio da conversa do presidente com o empresário Joesley Batista, e a votação da segunda denúncia, marcada para amanhã em sessão da Câmara. O caso JBS, por exemplo, afastou de vez o senador Aécio Neves da sucessão e alguma veleidade que Temer tivesse de disputar a reeleição. Na véspera da divulgação do áudio, Temer tratava de conseguir apoio para ter margem de manobra na votação da reforma; no dia seguinte, tirou de pauta.
Temer assumiu o governo no lugar de Dilma Rousseff com algo em torno de 13% de aprovação e cerca de 30% de entrevistados que consideravam o governo razoável. À época o objetivo era conseguir 15% desses votos, chegar aos 30% e entrar como um grande eleitor na corrida sucessória. Hoje se aceita que o passivo do presidente é muito grande para pensar em reeleição. A aposta é na recuperação da economia. Já se fala no entorno do presidente num desemprego na faixa de um dígito, alguma coisa como 9% na eleição de outubro. É um legado no qual joga o governo não para reeleger Temer, mas para organizar uma candidatura forte de centro.
Hoje essa candidatura seria a do governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB). O prefeito João Doria correu muito rápido e cansou, mas não é carta fora do baralho. O apresentador Luciano Huck é uma possibilidade. O fato é que não há um quadro final de candidatos. O ex-presidente do STF Joaquim Barbosa tem declarado veemente, permanentemente e frequentemente que não é candidato. Mas conversa com Marina Silva. E o ex-presidente Lula trabalha com alternativas inviáveis para ser candidato (recurso em cima de recurso à Justiça). A possibilidade de Lula ser candidato é estimada em 30% pela empresa de consultoria LCA.
"Em termos da corrida presidencial, a principal mudança desde maio diz respeito à candidatura Lula e não tem conexão com o caso JBS", constata a LCA, numa análise sobre a corrida presidencial. "Hoje, após a primeira condenação em Curitiba, após ter se tornado réu em mais um processo (o sexto) e após os ataques de [Antonio] Palocci ['Lula tinha pacto de sangue com a Odebrecht' ], Lula parece mais distante da candidatura do que há cinco meses. Ele próprio parece acreditar que provavelmente não poderá ser candidato".
A configuração de uma eleição com Lula é uma e sem Lula é outra, muito diferente. Na primeira hipótese, o ex-presidente tem lugar praticamente assegurado no segundo turno, com chance de vitória. Já a eleição sem Lula aumenta o "estoque de incerteza acoplado à eleição presidencial de 2018". Em resumo, "se Lula for candidato, impõe-se com força a hipótese de que somente uma vaga para o segundo turno estará disponível. Em caso inverso, sem o ex-presidente, as duas vagas no segundo turno ficam, a princípio, mais abertas, assim como o próprio desfecho da eleição.
"A sucessão vai depender da normalidade ou da anormalidade da conjuntura eleitoral", avalia o ex-ministro e ex-deputado Roberto Brant. Ao governo Temer interessa entrar num processo de normalidade, a partir de quinta-feira, a fim de tocar a reforma que falta (Previdência) e as medidas fiscais prometidas em agosto e até agora não transformadas em projetos de lei ou medida provisória - assunto, aliás, que o Palácio do Planalto promete resolver até 31 de outubro. "A normalidade não interessa à oposição, mas deveria interessar ao menos ao PSDB", diz Brant.
Foge à compreensão do ex-ministro a radicalização de setores do PSDB, partido que poderia ser o maior beneficiário da normalidade. O acirramento desorganiza o centro político e pode levar a soluções heterodoxas como se viu em 1989, quando a centro-direta se dividiu e permitiu o segundo turno entre Luiz Inácio Lula da Silva e Fernando Collor de Mello. É até compreensível que a oposição aposte no caos. Pelo menos é uma aposta. Para gente como Brant e outros políticos empenhados na candidatura do centro para a direita incompreensível é o comportamento do PSDB.
Numa conjuntura de Lava-Jato, é difícil imaginar um cenário de normalidade política a partir de quinta, mas a rejeição da nova denúncia é a última chance do presidente.
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