Não cabem no ciclo mais extenso de estabilidade democrática da história do país atos como os contra o ex-presidente Lula e o ministro do Supremo Edson Fachin
Se a violência no Rio chega a requerer uma intervenção federal, ela avança também em outras regiões. Nada resta a não ser enfrentá-la por todos os meios legais e, tanto quanto isso, impedir que se alastre pelo tecido social.
Neste sentido, é preocupante e potencialmente muito perigosa a coincidência de ser este um momento também de paixões político-partidárias e ideológicas, quando se aproxima uma campanha eleitoral decisiva para o país e com enorme fragmentação de candidatos. Uma repetição, neste aspecto, do quadro eleitoral de 1989, quando houve a primeira eleição direta para presidente desde o fim da ditadura.
Os tiros disparados contra a caravana do expresidente Lula, no Sul, e ameaças à família do ministro do Supremo Edson Fachin, relator na Corte de processos da Lava-Jato, entre eles um em que o ex-presidente está condenado já em duas instâncias, são atos repulsivos, antidemocráticos. Protestar é parte do jogo democrático. Jogar pedras, um crime. Ameaçar, atirar, inaceitável. Precisam, por óbvio, de rápida e incisiva investigação.
As paixões políticas usuais em eleições têm sido amplificadas pela confluência da campanha com o andamento desse processo da Lava-Jato, em que o ex-presidente Lula está condenado a 12 anos e um mês de prisão, por corrupção e lavagem de dinheiro, no caso do tríplex do Guarujá. Pela jurisprudência em vigor no Supremo, a Justiça estaria emitindo mandado de prisão para Lula começar a cumprir a pena.
Pressões, manobras advocatícias, embates no Supremo, que concedeu salvaguarda ao ex-presidente até o dia 4, quando julgará pedido de habeas corpus em seu favor, tudo isso faz elevar a temperatura do caso. No qual também se joga a possibilidade de o ex-presidente poder lançar a candidatura para voltar ao Planalto, algo impossível se for aplicado o que está explícito na Lei da Ficha Limpa: condenado em segunda instância, por colegiado de magistrado, fica inelegível por oito anos.
O ministro Edson Fachin revelou as ameaças em entrevista a Roberto D’Avila, na GloboNews, sem revelar detalhes. Fachin tem sido rígido. Discordou, por exemplo, da admissibilidade do habeas corpus e do salvo-conduto a Lula. Mas não interessa. O importante é que nenhuma autoridade pode ser ameaçada.
O Brasil atravessou boa parcela de seu período republicano sob governos autoritários. Mas já completa 30 anos no estado democrático de direito, cuja pedra fundamental é a Constituição de 88. Estas três décadas são o mais extenso ciclo de equilíbrio institucional da democracia representativa no país. Tem-se passado por campanhas disputadas, mas dentro dos marcos legais. Nos desvios, as instituições atuam e restabelecem a legalidade. Também inaceitável será se houver algum acidente nesta trajetória, por descaso da sociedade e do próprio Estado.
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