Texto escrito em parceria com: Luiz Fernando Miranda – Doutor em Ciência Política – UFF. Pós-doutorando em Ciência Política – PUC/RJ
Vítor Sandes | O Estado de S. Paulo
Nas últimas pesquisas eleitorais, tem aparecido uma série de pré-candidatos à presidência da República de diversos partidos políticos. Tudo leva a crer que a polarização PT-PSDB perderá força nestas eleições, abrindo espaço para candidatos que podem aproveitar a oportunidade criada pela crise política e institucional. Dentre eles, Joaquim Barbosa (PSB), ex-presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), tem aparecido em pesquisas recentes como um candidato com viabilidade à presidência da República. O pré-candidato foi um dos ícones do julgamento dos envolvidos no caso que ficou conhecido como “mensalão”. Em 2014, cogitou-se que ele sairia candidato, mas o fato não se concretizou. Em meio à crise política e à atual falta de confiança nos nomes vinculados ao sistema político, uma parte do eleitorado parece acreditar que a solução vem de fora do universo político. O argumento, que, em um primeiro momento parece bastante razoável, apresenta problemas.
O Judiciário é um poder que não responde diretamente ao eleitorado, pois seus agentes não são eleitos. É um Poder contra majoritário, ou seja, deve cumprir seu papel de proteção dos direitos e dar garantias às minorias. Se, em algum momento, a solução dos problemas políticos parece emergir dos agentes públicos que compõem o Judiciário, é porque o sistema político precisa ser aperfeiçoado para dar conta das demandas dos cidadãos. Nesse sentido, não cabe ao mesmo exercer a representação, subvertendo o poder do voto. Ainda que alguém do Judiciário se submeta à lógica eleitoral, este encarará os problemas que todos os atores políticos se deparam e que são resultado do arranjo institucional que eleva demasiadamente os custos da governabilidade.
O sistema de governo no Brasil é baseado no presidencialismo e possui um Legislativo bicameral. Adicionado a isso, o sistema de partidos é multipartidário e extremamente fragmentado, ou seja, existem diversos partidos com poder relativamente expressivo no país. Em miúdos, o presidente necessita obter o apoio legislativo necessário para governar, negociando com diversos partidos em duas casas: a Câmara dos Deputados e o Senado. Sem distribuir recursos de poder (cargos e políticas) para as lideranças partidárias e assim garantir a composição de uma coalizão majoritária e estável, o chefe do Executivo tem altos riscos de não conseguir implementar sua agenda de governo, e, em última instância, pode sofrer o processo de impeachment. Sem política, um presidente simplesmente não governa.
Além disso, o Judiciário não foge dos recentes problemas detectados nos poderes vinculados ao sistema representativo: conflito interno, falta de consenso e de clareza nos procedimentos. As diferentes interpretações sobre a Constituição ficam, a cada dia, mais evidentes. São transmitidas ao vivo e sem cortes. Magistrados e outros agentes públicos do Judiciário interpretam, se posicionam e manobram. Para ilustrar os problemas internos do Judiciário, recentemente, uma sessão do STF foi palco de um conflito deliberado entre dois ministros da Corte que extrapolava o assunto em discussão. A falta de consensos razoáveis e interpretações sólidas sobre determinadas questões, além do tratamento novelesco que, muitas vezes, é dado às querelas internas do Judiciário, colocam o Poder no meio do furacão político brasileiro. Ou seja, o Judiciário é um poder tão heterogêneo e conflituoso quanto o Executivo e o Legislativo.
A solução para a crise institucional barsileira passa, portanto, pela eleição de um político com expertise. Outsiders são uma perigosa incógnita para a política. Tampouco devemos crer que uma instituição feita para garantir os direitos constitucionais deva extrapolar suas funções conforme os ventos da opinião pública. Em suma, ao Judiciário, cabe interpretar a Constituição e fazer justiça. Aos Poderes representativos (Executivo e Legislativo), representar os cidadãos brasileiros.
Por fim, podemos dizer que um sistema que permite que outsiders entrem para o mundo político, sem a menor garantia de que seus projetos sejam ao menos razoáveis, precisam ser revistos. A democracia é um projeto a longo prazo. Precisa ser aperfeiçoada com mudanças institucionais e não adicionando mais imprevisibilidade em um sistema já tomado pela falta de compromisso dos agentes com o regime e com as instituições representativas.
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