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- O Estado de S.Paulo
Perdeu-se a chance de tratar de problemas que dificultam o crescimento mais rápido da região
A VIII Cúpula das Américas transcorreu em Lima (Peru), na semana passada, em meio a crises que contribuíram para o seu esvaziamento. O temor de uma escalada militar no Oriente Médio após os ataques cirúrgicos dos Estados Unidos na Síria e a situação da Venezuela monopolizaram a atenção dos presidentes do Hemisfério.
Pela primeira vez desde que foi criada, em 1994, por iniciativa de Washington, o chefe de Estado norte-americano não esteve presente. E pela última vez Cuba foi representada por Raúl Castro, que logo em seguida passou o governo para seu sucessor, Miguel Díaz-Canel.
A maior parte dos governantes da região manifestou a sua preocupação pelo uso de armas químicas e alertou para o risco de uma escalada no Oriente Médio, após o bombardeio ordenado pelo presidente americano, Donald Trump, contra alvos específicos do regime de Bashar Assad, na Síria, naquele exato momento.
Os Estados Unidos, representados pelo vice-presidente Mike Pence, fizeram chamamento aos países do Hemisfério para que apoiassem o ataque bélico ao território da Síria. Os demais presidentes, incluído o do Brasil, preferiram lamentar o ataque, pedir uma investigação independente e maior diálogo para tentar resolver a questão
Ausente de Lima, desconvidado pelo governo do Peru, um dos protagonistas desta VIII Cúpula das Américas foi o presidente venezuelano, Nicolás Maduro. A falta de democracia na Venezuela foi objeto de condenação e preocupação de boa parte dos países participantes e houve clamor para que Maduro permita a entrada de ajuda alimentar e de remédios. Diante da impossibilidade de incluir na declaração final, como solicitado por vários países, menção à condenação do governo venezuelano pelas eleições antecipadas de maio, os 14 países do Grupo de Lima e os Estados Unidos emitiram ao fim da reunião de cúpula uma declaração em separado. Os países que assinaram a declaração exigiram “eleições presidenciais com as garantias necessárias para um processo livre, justo, transparente e democrático, sem presos políticos e que inclua a participação de todos os atores políticos venezuelanos”. Ratificaram que “eleições que não cumprirem essas condições carecerão de legitimidade e credibilidade”.
O documento final da cúpula foi consagrado a recomendações relacionadas com o combate à corrupção. Por ironia, com vários presidentes presos ou sendo processados, o compromisso de 57 pontos, que não tem poder vinculante, contém capítulos sobre fortalecimento da governabilidade; transparência, acesso à informação, proteção de denunciantes e direitos humanos, incluindo liberdade de expressão democrática; financiamento de organizações políticas e campanhas eleitorais; prevenção da corrupção em obras públicas, contratações e compras públicas; cooperação jurídica internacional; combate à propina, ao suborno internacional, ao crime organizado e à lavagem de ativos; recuperação de ativos; e fortalecimento dos mecanismos interamericanos anticorrupção.
O compromisso contempla, entre outros aspectos, “avançar na luta contra a corrupção, em particular a prevenção e o combate dos subornos a funcionários públicos nacionais e estrangeiros”, e “adotar um marco legal para responsabilizar as pessoas jurídicas (entidades, empresas) por atos de corrupção”. Também “promove a inclusão de cláusulas anticorrupção em todos os contratos do Estado (...) e estabelece registros de pessoas naturais e jurídicas vinculadas com atos de corrupção e lavagem de dinheiro para evitar sua contratação”. Propõe “medidas que promovam a transparência” nos gastos dos partidos políticos, “principalmente de suas campanhas eleitorais, garantindo a origem lícita das contribuições, assim como sanções pela recepção de aportes ilícitos”. Além de “impulsionar a adoção e/ou o fortalecimento das medidas legislativas necessárias para tipificar penalmente os atos de corrupção e outros relacionados”, em conformidade com a Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção, a Convenção das Nações Unidas contra a Criminalidade Organizada Transnacional e a Convenção Interamericana contra a Corrupção.
O vice-presidente Mike Pence teve uma agenda recheada de reuniões bilaterais com os presidentes do Peru, do Canadá, do México, da Colômbia, da Argentina, do Chile e uma reunião multilateral com os líderes do Caribe. O Brasil, mais uma vez, foi marginalizado pela administração norte-americana, embora tenha sido anunciada a visita de Pence ao País no final de abril. Em nível ministerial, contudo, houve reunião com o ministro do Comércio norte-americano para discutir as barreiras sobre o aço, havendo sido indicado que o Brasil deverá aceitar uma restrição voluntária a exportações para o mercado dos Estados Unidos.
À margem da cúpula, o ministro Aloysio Nunes Ferreira recebeu membros da oposição venezuelana e prometeu tomar medidas para punir refugiados que pratiquem atos ilegais, como movimentações financeiras clandestinas, no território brasileiro. O governo brasileiro descartou a hipótese de impor sanções unilaterais contra Caracas, solicitadas pela oposição venezuelana, mas indicou que poderá reabrir a matéria no âmbito da Organização dos Estados Americanos.
Durante a cúpula foram tratados informalmente assuntos como comércio, imigração e a crescente presença da China, mas os presidentes perderam uma oportunidade para tratar dos problemas que dificultam o crescimento mais rápido da região, como a deficiente infraestrutura, a violência, a crescente concentração de renda e o atraso da região nos avanços em inovação e tecnologia.
Barrado em Lima e diante da ausência de avanços concretos, num raro momento de lucidez o presidente venezuelano declarou que “cúpulas são uma grande perda de tempo”.
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* Rubens Barbosa é presidente do Instituto de Relações Internacionais e Comércio Exterior (IRICE)
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