Na semana passada, a Instituição Fiscal Independente (IFI) divulgou estudo mostrando que o Brasil terá que lidar com sete anos de problemas para cumprir a regra de ouro das contas públicas. As dificuldades para cumprir esse dispositivo constitucional, que define que o governo não pode aumentar a sua dívida para pagar gastos correntes, como Previdência e pessoal, já começaram a aparecer no ano passado.
Para este ano, o rombo verificado na regra de ouro, segundo cálculos mais recentes do Tesouro Nacional, é de R$ 203,4 bilhões, já considerando-se os R$ 30 bilhões pagos antecipadamente pelo BNDES ao Tesouro Nacional e R$ 14,7 bilhões relativos ao lucro do Banco Central no segundo semestre de 2017, que não estavam na primeira estimativa divulgada pela equipe da secretária Ana Paula Vescovi, que garantiu que o dispositivo será integralmente cumprido neste ano. E com uma folga em torno de R$ 20 bilhões.
Para tanto, o governo conta com retorno de mais R$ 100 bilhões do BNDES, cuja compromisso de devolução foi reafirmado pelo novo presidente do banco de fomento, Dyogo de Oliveira, que toma posse hoje. Além disso, outras iniciativas estão sendo estudadas para que o Tesouro Nacional acesse outros recursos, como do Fundo Soberano do Brasil (FSB), Fundo Nacional de Desenvolvimento (FND), além de disponibilidades da Conta Única.
Essas medidas estão sendo analisadas pelo Tribunal de Contas da União (TCU), que deve dar aval às duas primeiras, mas ainda não deixou claro o que pretende fazer nesse último caso. Se liberar a desvinculação dos superávits financeiros da conta única, a situação da regra de ouro ficará mais tranquila também para 2019, quando um buraco semelhante ao deste ano terá que ser coberto, mas com menor capacidade de devolução de dinheiro pelo BNDES. No entanto, esse jogo ainda não está resolvido.
Nas últimas semanas, a equipe econômica tem discutido internamente e com o TCU como proceder em relação ao envio da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e da proposta orçamentária de 2019, que tem que contemplar o cumprimento da regra de ouro.
A solução que deve ser utilizada, como indicou ao Valor o ainda ministro do Planejamento Dyogo de Oliveira, é que a LDO já contemple o comando para que despesas estejam vinculadas à autorização de crédito orçamentário pelo Congresso. Esse comando deve ser genérico no documento que será enviado ao Parlamento provavelmente nesta semana, deixando para o Orçamento o comando mais específico de que despesas estariam vinculadas ao crédito suplementar ou especial.
Todos esses caminhos, contudo, amenizam o problema, evitam que as autoridades do atual governo, incluindo o presidente da República, cometam crime de responsabilidade, mas não resolvem o problema de fundo que é a sequência de elevados déficits orçamentários, que já entrou em seu quinto ano e deve ter pelo menos mais dois, e a incapacidade de a regra garantir o equilíbrio fiscal ao mesmo tempo que preserva os investimentos.
A estratégia de ajuste fiscal gradualista definida pelo agora ex-ministro Henrique Meirelles teve a vantagem de impor menos custos para a economia no curto prazo, facilitando o processo de saída da recessão e a retomada econômica.
Por outro lado, as soluções estruturais para os problemas fiscais, que dependem de reformas do gasto do gasto público, especialmente a da Previdência, foram postergadas, por falta de apoio no Congresso. Para cumprir a regra de ouro, o governo usou soluções paliativas (como os pagamentos do BNDES e o lucro do Banco Central).
Seja quem for o próximo presidente, não há como se escapar de encarar a questão fiscal de forma mais estrutural, olhando-se o problema da rigidez de despesas (por conta do elevado peso de Previdência e pessoal), as regras fiscais existentes e seus conflitos e o lado das receitas, que depende do crescimento econômico (que está voltando), mas também de revisão de renúncias e distorções tributárias. Só assim, o país sairá dos repetidos ciclos de puxadinhos fiscais para uma solução definitiva que garanta equilíbrio fiscal e melhor qualidade do gasto público.
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